Imagem ilustrativa da imagem Almoço de graça
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Alguém pergunta por que eu fecho os olhos e rezo antes das refeições. A resposta é muito simples: agradeço porque, durante todos esses anos, Deus não permitiu que me faltasse o pão um só dia. Nunca passei fome. Minto: curiosamente, houve um dia em 1990, quando invadimos a Reitoria da UEL e na minha vez de almoçar só tinha arroz e chuchu. Mas naquela época eu não rezava.

Rara vez pensamos nisto, mas um prato de comida não é um dado natural. Ele resulta de uma série de encadeamentos e coincidências que eu só posso chamar de milagre. Pense em quantas pessoas se esforçaram para que o arroz que está no prato fosse 1) plantado; 2) colhido; 3) beneficiado; 4) empacotado; 5) transportado; 6) comercializado; 7) preparado; e 8) servido. A cada um desses itens, está relacionada uma numerosa e complexa cadeia de personagens, empresários e trabalhadores que na maioria não se conhecem, mas sem saber colaboram para que o seu prato esteja cheio no dia de hoje. Se estendermos as conexões de um simples almoço no tempo e no espaço, acabaremos por abarcar toda a história da humanidade. Não existe almoço de graça; o almoço é a própria graça.

Nenhum grupo de burocratas ou políticos no mundo seria capaz de planejar com sucesso a imensa rede de intercâmbios necessários para garantir o seu almoço de sexta-feira. Sempre que alguns iluminados se julgaram capazes de introduzir a lógica da luta de classes nesse maravilhoso processo, o resultado foi escassez, fome, opressão e morte. Estude história, não para passar no Enem, mas para saber a verdade — e você verá.

Não cultuo o mercado, e não acho que ele resolva tudo. O mercado não é deus, mas a economia de mercado certamente é um presente de Deus. Através dela, os nossos esforços individuais se inserem em um gigantesco mecanismo de cooperação extensivo a todo o planeta. Não costumamos parar e pensar na beleza desse milagre diário, resultado dos esforços mútuos de bilhões de seres humanos. Eles talvez até brigassem uns com outros se um dia se conhecessem, mas falam o mesmo idioma universal do trabalho humano.

Se, como já disse, o mercado é fundamental, mas não soluciona todos os males, como fazer para reduzir a dor humana? Como aliviar o sofrimento daqueles que sentem fome? O cristianismo tem uma resposta: o amor ao próximo. Uma sociedade economicista, que só se preocupa com a rentabilidade e o consumo, não é digna de ser chamada civilização. A compaixão e a caridade devem não apenas nortear as políticas de Estado, mas estar no centro de nossas vidas individuais e familiares.

Termino de rezar, olho para o lado e quem eu vejo? O Dr. Antônio Amarante Neto, médico oncologista que tantas vidas salvou em nossa cidade. Ele mereceria almoçar todos os dias no restaurante mais luxuoso de São Paulo ou Nova York, e ainda assim seria pouco. Contenta-se, porém, com uma comida caseira, boa e honesta. Eis mais um milagre. Fecho os olhos e rezo outra vez.

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