A separação entre teoria e prática é uma performance arriscada. Na prática, a teoria se faz e se reinventa. Na teoria, a prática se põe à prova e confronta a realidade. O caráter indivisível da tensa e sempre complexa relação entre a teoria e a prática, em rigor, se completa na história. Os elos entre passado, presente e futuro são inquebráveis: pensar o hoje exige um olhar atento para o ontem e um desejo orientado para o amanhã. Em termos clássicos, isso seria sinônimo de pensar e agir historicamente.

Imagem ilustrativa da imagem À luz da teoria
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Não é nada fácil, no entanto, pensar historicamente. Antes de tudo, porque reflexões tendem a se prender a fatos urgentes, no calor de seus desdobramentos. Além disso, um conhecimento prudente e consequente precisa combater o nada amistoso culto ao presente, que atrofia a sensibilidade histórica e, no limite, ao valorizar o pragmatismo e o utilitarismo, encoraja a velha e nociva tese de "fim da história".

No mundo contemporâneo, a ênfase dada à dimensão prática dos fenômenos da vida é evidente. Ocorre uma exteriorização da existência, ou seja, uma generalizada convicção de que as coisas são como são e nada pode deter o curso do tempo. A corrida infinita dos dias, entretanto, não é sinal de que a história permanece saudável e disposta. Ao contrário: representa a ideia de que os seres humanos – os únicos capazes de inventar e produzir o tempo histórico – encontram-se paralisados e confusos. Diante desse cenário de apatia e resignação, o poder da teoria se desgasta e se perde. Teorizar passa a ser perda de tempo.

A época atual é a dos colecionadores de informação. É comum ler e ouvir que informação dá poder e abre caminho para a ascensão social. A informação, então, serve à ação e se constitui como uma espécie de "manual prático da existência". Na verdade, o que ronda o mundo é o espectro do desapreço pela reflexividade, pelo saber crítico, pela autonomia dos indivíduos. Em toda parte, vende-se tudo pronto, inclusive fórmulas de como a vida deve ser para que haja sucesso, felicidade, prosperidade, etc.

É de espantar que a arte seja combatida como manifestação maligna; que escolas sejam monitoradas e professores, censurados; que defensores do autoritarismo ocupem espaços democráticos para disseminar polêmicas ocas e maldizeres fascistas; que questões coletivas sejam colocadas diante de exclusivismos e mesquinharias; que a ética majoritária seja a da hipercompetitividade preconceituosa e excludente; que o debate público dê vez e voz a quem só tem descasos pessoais para contar e sentimentos metafísicos para compartilhar. A prática, nesses termos, é muito pobre de teoria.

Em sua origem, a teoria significa também "eu vejo" e serve de bússola aos sujeitos. É interessante observar o "ori" no centro da palavra, que remete a "oriente", lugar onde nasce o sol e surge a luz. Na teoria está também o "ori" de "origem". Desprezar a teoria, acreditando que tudo se reduz à prática, é rejeitar o início, aquilo que se é, aquele que, pela "práxis" (a teoria e a prática em intercâmbio permanente), se pode ser.

Marco A. Rossi é sociólogo e professor da UEL - [email protected]