Preconceitos são difusos. Como exames acríticos da realidade, eles surgem de maneira autoritária, egoísta, travestindo-se de verdade inquestionável. Acredita neles quem observa o mundo de forma distraída, indiferente, apressada e sedenta por respostas rápidas e incisivas. Via de regra, portanto, o preconceito atinge a todos, indiscriminadamente.

Imagem ilustrativa da imagem O preconceito é coisa nossa
| Foto: iStock

Em tempos de grande aceleração histórica, todos temos muita pressa. O que nos sobra é disposição para dedicarmo-nos a uma ou duas coisas. O restante é bobagem, papo de gente que não tem o que fazer, Nesse sentido, as coisas são como são – e ponto final. É no interior desse espírito pragmático e desafeito ao debate que os preconceitos nascem, crescem e se tornam sentimentos maduros, donos de si, arrogantes até o último fio de cabelo.

Agimos preconceituosamente sem perceber. A fobia – essa aversão que não requer explicação – está em nossos gestos, palavras, olhares, escritos, heranças corpóreas e simbólicas. Somos, de fato, uma imensa e bastante complexa sociedade preconceituosa, cujos sinais de ódio se esparramam pela política, pela vida nas cidades, pelos bancos escolares, pelos locais de trabalho, pela distribuição da riqueza material, pelos meios de comunicação, pelas artes e, por incrível que pareça, pelos exercícios de fé.

Recentemente, li uma entrevista do escritor Jeferson Tenório, autor do indispensável romance “O avesso da pele”. Ele refletia sobre o modo matreiro como o preconceito se dissemina socialmente, atravessando gerações e não poupando nem mesmo gente “esclarecida”. O escritor indagava sobre a quantidade de pensadores negros que estão presentes nos programas de ensino nas universidades. “Quantos autores negros seu professor trabalha em sala de aula?” – questionava Tenório.

Posso responder somente por mim, embora eu tenha uma boa ideia do quadro geral. Notei quanto eu sou marcado pelos cânones europeus, brancos, masculinos. É verdade que abro espaço para mulheres, negros, indígenas, comunidade LGBTQIA+, latino-americanos etc. É um espaço pequeno, contudo. Desde que li a entrevista concedida por Tenório, passei a reformular meus planos de ensino, minhas listas bibliográficas e, consequentemente, reservar muito mais lugar a autores que o preconceito difuso mantém longe de nós, mergulhados num esquecimento burro e criminoso, graças ao qual reproduzimos as mesmas histórias, recolonizando mentes, perpetuando o implacável e injusto mundo que habitamos.

É claro que ninguém se assume preconceituoso. O problema é sempre dos outros, daqueles que estão do outro lado da rua. Mesmo quando fazemos piadas sem graça, destilamos intolerância ou fazemos juízo apressado da condição alheia, não admitimos agir preconceituosamente. Dizemos que é só uma piada, só uma opinião que não muda nada. A questão é que o preconceito precisa ser posto a nu, diante de todos e de nós mesmos. Com humildade e ciência de que estamos indo muito mal, podemos superá-lo. Espero que meus programas de ensino, agora escancarados à diversidade, possam ajudar um pouco.

...

A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a da Folha de Londrina.

...

Receba nossas notícias direto no seu celular, envie, também, suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link