Imagem ilustrativa da imagem Pesquisa mostra os excessos da juventude
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Dois em cada três jovens cometem excessos. Consumo de alimentos não saudáveis (42%), compras por impulso (29%), trabalho (27%), exercício físico (18%) e consumo de bebidas alcoólicas (12%) estão entre os exageros mais cometidos por jovens de 18 a 24 anos entrevistados para a pesquisa Excessos dos Brasileiros, elaborada pela Plataforma Sem Excesso. De acordo com o levantamento, os excessos que mais preocupam são o consumo de alimentos considerados não saudáveis, com 25%, seguido do trabalho (23%) e a prática da compra desmedida (21%). De acordo com o hebiatra Maurício de Souza Lima, doutor em medicina pela USP (Universidade de São Paulo), o excesso em qualquer campo é muito ruim. "O excesso de exercícios físicos, por exemplo, não é positivo. Apesar de ser muito bom para a saúde, quando feito em excesso, pode trazer consequências. Então, o que precisamos ter na vida é o equilíbrio. Entre jovens deve-se conversar, mudar hábitos", aponta o especialista, que atua em São Paulo.

Quando o assunto é ingerir refeições ruins para a saúde todos os dias, a quantidade é de uma mulher a cada quatro, a partir de dados do estudo. Cerca de 60% do público em geral optam pela alimentação inadequada por causa do sabor e da acessibilidade. "Qualquer consumo de comidas não saudáveis traz risco para a saúde. Quando falamos em excesso de consumo isso se torna muito perigoso. Os riscos são diversos e dependem também do tipo de alimento não saudável. Entre eles estão doenças cardiovasculares, metabólicas, ósseas, e doenças e sintomas gastrointestinais", elenca a hebiatra Giovana Ribeiro, do Hospital do Coração de Londrina.

Em relação ao excesso de trabalho, a profissional alerta que pode desencadear problemas físicos, como lesões osteomusculares, e psicológicos, gerando estresse, ansiedade e síndrome do Burnout. "Por diversos motivos vemos os jovens brasileiros permanecendo em jornadas extensas de trabalho, seja por alcance de metas, por melhor remuneração, por falta de legislação adequada e rigorosa, por abuso de poder", pontua. Na pesquisa, 37% das mulheres entrevistadas disseram sentir que excedem na jornada de trabalho, enquanto homens foram 25%.

BEBIDA ALCOÓLICA
O estudo ainda relatou que 70% dos entrevistados que consomem bebidas alcoólicas admitem cometer excesso e que 15% dos ouvidos começaram a beber entre os 11 e 14 anos. Lima destaca que começar a beber muito novo pode trazer danos à saúde. "O córtex pré-frontal é muito sensível a qualquer droga psicoativa. As bebidas alcoólicas, consumidas em excesso, em uma fase anterior à consolidação destes neurônios, podem trazer problemas de saúde. Pesquisas mostram que esse jovem tem mais chance de ter problemas de memória, no sistema imunológico e relacionados à concentração", adverte. Uma lei determina que a bebida alcoólica só pode ser vendida para indivíduos partir de 18 anos.

Família e amigos acabam exercendo papel de destaque, positivo ou negativo, para evitar este e outros excessos. "Os pais e amigos influenciam o consumo de bebidas. Por parte dos amigos, muitos deles integram um grupo e o jovem, para não ser excluído, se sente na obrigação de seguir o comportamento geral. Sobre os pais, muitos preferem que os jovens bebam em casa para que 'aprendam a beber'. Esse jovem acredita que beber para ele não é uma transgressão", considera. "É fundamental que exista uma reflexão no comportamento desta família", acrescenta.

TECNOLOGIA
Apesar de não aparecer no estudo, a tecnologia é apontada por Giovana Ribeiro como uma ferramenta que tem levado os jovens a se excederem no uso. O Brasil é o terceiro país que passa mais tempo online, tendo uma média de nove horas e 14 minutos. "A quantidade de tempo gasto na internet e seus diversos usos é alarmante e traz inúmeros problemas aos jovens, como má qualidade e quantidade de sono, afastamento social, diminuição no interesse em atividades físicas, piora no desempenho escolar ou no trabalho, irritabilidade, depressão, transtornos de humor."

A pesquisa Excessos dos Brasileiros foi realizada com mil pessoas de 18 a 24 anos em todas as regiões do País. "Os pais devem incentivar práticas saudáveis e colocar limite nos filhos desde cedo, para que eles possam aprender sobre os malefícios dos excessos. Procurar ter uma alimentação mais saudável, estabelecer horários para finalizar o trabalho, reservar momentos diários e semanais para o lazer ou para a realização de algo prazerosos, praticar atividades físicas (de forma saudável), evitar e diminuir o consumo de bebidas alcoólicas", sugere a hebiatra que atua em Londrina.

'Sinto que atrapalha bastante na concentração'




Vitor Trigueiros: excesso de exercícios físicos causou lesão
Vitor Trigueiros: excesso de exercícios físicos causou lesão | Foto: Ricardo Chicarelli



Aos 18 anos, o estudante de engenharia civil Vitor Trigueiros teve que ser submetido a uma cirurgia no joelho. Ele se excedeu nos exercícios físicos. "No começo deste ano, eu treinava mais pesado no futsal e acabei tendo problema no menisco", explica o estudante, que treinava durante 1h30 todos os dias no horário do almoço. Os horários apertados começaram a afetar tanto a qualidade dos exercícios como a alimentação. "Era comum eu ficar sem almoçar depois do treino, só comia alguma fruta porque tinha que voltar para as aulas na universidade. E tive problemas também porque na correria eu acabava não fazendo os alongamentos como deveria". Além disso, algumas vezes ele viajava com o time para jogar em outras cidade, durante o fim de semana, o que atrapalhava também seus horários de estudo e descanso.

Após um mês com dores, a cirurgia foi marcada para coincidir com o período de férias da faculdade. "E depois decidi nem voltar a treinar da forma como estava fazendo", afirmou. O curso de Trigueiros é integral, o que exige uma dedicação mais constante nas aulas e trabalhos. Apesar de praticar o futsal desde os 9 anos e desde 2012 treinar com mais afinco e até atuar no time da cidade, ele percebeu que não seria mais possível continuar no mesmo ritmo. "Eu já imaginava que seria bastante puxado conciliar os dois compromissos, então quando percebi que precisaria de cirurgia foi o ponto final." Agora, sua rotina de exercícios inclui o treino na atlética do curso de engenharia, que ocupa apenas dois dias da semana.

REDES SOCIAIS
Uma estudante de 17 anos conta que sua dificuldade está em ficar menos tempo no celular. "Fico desde a hora que acordo até quase a hora de dormir. E sinto que me atrapalha bastante na concentração das minhas tarefas do dia", observa. Ela reconhece que perde muito tempo apenas passando pelas redes sociais e o efeito está em procrastinar suas obrigações, ficando mais dispersa. "Um pouco eu considero normal esse apego da minha geração, eu mesma sempre estive acostumada a lidar com o aparelho, uso celular desde os 13 anos, mas percebo agora que está atrapalhando minha organização do dia a dia".

Como solução, a estudante de biologia decidiu desligar o smartphone quando precisa estudar. "Agora que tenho que me dedicar mais nos estudos da faculdade, optei por desligar e assim me dedicar melhor. Já consegui atingir três horas com o aparelho desligado, achei que foi bastante tempo. E foi realmente bom para cumprir o objetivo de me concentrar." A jovem ressalta que depende de cada um dominar os impulsos para lidar com a situação.



Psicanalista adverte sobre atitudes para evitar uma vida de excessos
O psicanalista londrinense Sylvio do Amaral Schreiner destaca que os excessos fazem parte da juventude, pois é um período em que a pessoa vai se construindo internamente, principalmente a questão do equilíbrio. "Isso não é um problema. Vira problema quando não se aprende e vai buscando cada vez mais excessos, com uma busca de prazer sem fim. Tem que ter cuidado, pois acaba se tornando um modo de vida e não serve mais como aprendizado", adverte.

Caso não aprenda a se controlar e conviver com os excessos da vida, o indivíduo pode acentuar estes exageros quando adulto. "Se não aprendeu jovem vai piorar adulto. Pode se transformar em um alcoolismo, obesidade", exemplifica. A frustração também entra neste contexto. "Está havendo pouca tolerância à frustração quando se é mais novo e ao chegar a fase adulta encontra problemas no trabalho, pois vai trabalhar com outras pessoas. Também não terá 'jogo de cintura', podendo brigar, enfrentando problemas no relacionamento", completa.

O especialista frisa que a correção dos excessos independe da idade, pois deve acontecer no momento que está vivendo o problema, que é quando precisa ser criada a consciência. "Lógico que o jovem desperdiça menos tempo da vida dele se corrigir os excesso do que os mais velhos, pois estes já viveram mais", cita. Em um universo conectado, as redes sociais surgem como facilitador de "criar" pessoas que não se escutam, o que dificulta o aprendizado.

Uma das maneiras de evitar o excesso, de acordo com Schreiner, é reconhecer que nem tudo se pode, pois existem limites. "Têm palavras e ações que não podem voltar atrás. É aprender a se responsabilizar pela própria vida, pelo que fazemos com o outro e consigo mesmo." (Colaborou Ana Elisa Frings
Estagiária)