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Desde a popularização da internet, no final dos anos 90, e a invasão das redes sociais, nos anos 2000, a escrita passou a ser ainda mais essencial na comunicação entre as pessoas. Com ela, revelamos “o que estamos pensando” no Facebook, conversamos pelo WhatsApp, fazemos negócios via e-mail, publicamos anúncios, comentamos notícias em portais, além de uma série de outras atividades virtuais. Há um ditado que diz que, conversando, todo mundo se entende. Analisando o uso da “inculta e bela flor do Lácio” - maneira como o escritor Olavo Bilac se referia à língua portuguesa - nas redes sociais e as confusões causadas por abreviações, erros gramaticais graves e problemas de interpretação, talvez dê para reformular a frase e afirmar que “escrevendo... ninguém se entende”.

“A internet forçou as pessoas a escreverem bastante. Hoje há a possibilidade de mensagens de áudio, de videochamadas, mas no início era só texto, e grande parte da comunicação ainda permanece assim. E a necessidade de escrever acabou escancarando algumas deficiências que já existiam”, analisa a professora de Literatura e Língua Portuguesa, Jussara Alves. “As redes são espaços informais, e, por isso, as pessoas não tomam o cuidado necessário na hora de escrever, seja por falta de atenção, desconhecimento ou até mesmo pressa”, complementa.

A falta de cuidado é geral e nem o ministro da Educação, Abraham Weintraub, escapou. Recentemente, no Twitter, ele escreveu “impressionante” utilizando a letra “c” no lugar do “ss” (“imprecionante”). E não foi o primeiro deslize. Ele já escreveu “suspenção” no lugar de “suspensão” e “paralização” em vez de “paralisação”. “Erros acontecem", justificou o ministro.

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“Fica muito feio cometer esse tipo de erro, ainda mais um ministro, e da Educação! Por isso a atenção na hora de escrever é fundamental. Antes de publicar qualquer texto, releia o que foi escrito. E o hábito da leitura ajuda muito a quem busca escrever corretamente”, recomenda Jussara.

As abreviações também passaram a ser parte do cotidiano. É o chamado “internetês”. “Vc”, “tb”, “sdds”, “pq”, entre outras, entraram de vez em nossa escrita. “Surgiram novas formas de expressões rápidas e funcionais, para poupar tempo na hora de escrever, principalmente se estiver utilizando um smartphone. Ninguém quer passar muito tempo escrevendo uma frase enorme se, com algumas siglas e palavras, é possível ser mais objetivo e rápido”, avalia o professor Carlos Souza, mestre em Língua Portuguesa. “No entanto, é preciso saber o que escrever e para quem escrever. Uma mensagem informal para colegas e amigos pode, sem problemas, ter o uso de abreviações, mas se for endereçada ao chefe ou superior, ela talvez precisará ser menos coloquial”, pondera Carlos, relembrando que o pronome “você” já é uma abreviação de “vossa mercê”, utilizado no século XIX. “Talvez estejamos presenciando mais uma evolução, quem sabe?”, provoca, ressaltando ainda um ponto positivo. “É inegável que as redes sociais têm tido um papel de comunicação e formação interessante com pessoas que antes não tinham o hábito de ler e escrever diariamente. E isso é bom, porque a excelência é consequência da prática”, argumenta Carlos.

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Outro problema comum é a interpretação e a redação de textos. “Há muito texto com graves problemas de coerência e coesão. Em muitos casos, um simples comentário não consegue dizer claramente o que pretende por estar mal escrito, com ideias mal elaboradas. E é triste, porque, em certos casos, são pessoas levantando pontos relevantes, mas com textos tão mal concatenados que a causa já perde credibilidade logo no início”, lamenta a professora Jussara, que faz um alerta. “Os perfis nas redes sociais são os novos cartões de visita. Hoje, muitos recrutadores utilizam as redes para uma avaliação de candidatos a um emprego, portanto esses deslizes cometidos por lá podem até resultar em oportunidades profissionais perdidas”, adverte.

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A confusão também se estende ao comércio, que passou a atender os clientes por meio de plataformas virtuais. Dono de uma lanchonete, o empresário Rodrigo Cardoso recebe, há dois anos, pedidos pelo WhatsApp. “É rápido e prático, mas às vezes é uma luta para entender”, brinca. Na extensa lista estão, por exemplo, “xisegue”, “pisa”, “pitiça” e “molho barbicul”. “Sempre chega algum pedido maluco. E aí você pergunta algo e a pessoa entende outra coisa, só piora. Nesses casos peço para mandar áudio ou ligar para esclarecer, que é melhor que entregar algo errado”, revela.

E qual seria a solução? Os dois educadores são unânimes. “Muita leitura, bastante atenção e prática”, resume Carlos. “O brasileiro lê muito pouco, 30% nunca compraram um livro. Precisamos estimular a leitura. É a partir dela que habilidades como a escrita e a interpretação de texto se desenvolvem. Além disso, prestar atenção na hora de escrever, revisar antes de publicar, pesquisar se houver dúvida. Um pouco menos de pressa pode fazer a diferença”, recomenda Jussara.

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A explicação dos professores para alguns erros comuns nas redes sociais

A fim X afim:

“Afim” é um adjetivo e significa igual, semelhante, parecido (“Suas ideias são afins”). Já "a fim" faz parte da locução "a fim de", que significa para, com o propósito, com o intuito e indica finalidade (“Estou a fim de sair”).

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Meia X meio:

“Meia” é uma palavra que só pode ser usada como fração, ou metade, de um substantivo feminino (“A sessão dura meia hora”) ou como substantivo comum, que se refere ao objeto de vestir os pés (“Estava frio, então coloquei a meia”). Quando a intenção é indicar algo brando ou “mais ou menos”, a expressão correta é “meio” (Eu estava meio enjoada).

Nada haver/nada a ver:

Quando um assunto não tem relação com outro, usa-se “nada a ver” (Feijão não tem nada a ver com pizza). “Haver” é um verbo usado no sentido de existir e não pode ser usado para determinar a incoerência entre dois objetos (Há muitas nuvens no céu).

Agente X a gente:

“Agente” é um substantivo comum para alguém que faz algo, como agente secreto ou agente de câmbio. “A gente”, entretanto, é uma locução correspondente ao pronome pessoal reto “nós”. (A gente vai ao parque).

Mais X mas:

Um dos erros de português mais comuns nas redes sociais. Uma conjunção de adversidade, “mas” serve para indicar uma contraposição de ideias na frase (“Gosto de pudim, mas não sempre”). Já “mais” é um advérbio de intensidade que funciona como o contrário de “menos” (Dirija mais devagar).

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Com certeza/concerteza:

“Concerteza” não existe na língua portuguesa. A grafia correta do termo é “com certeza”, que significa evidentemente ou certamente (Com certeza, Luciana).

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Menos/menas:

A expressão “menas” não existe. Em todos os casos, mesmo quando acompanhado de substantivos femininos, o termo correto para o advérbio é “menos” (Vou levar menos coisas desta vez).

Mal X mau:

“Mal” é o contrário de “bem”, enquanto “bom” é o contrário de “mau”. O termo “mal” pode ser usado como advérbio (“O plano está mal feito”), substantivo (“O mal sempre é vencido”) ou conjunção temporal (“Você mal chegou e já pretende partir”). Entretanto, “mau” é sempre um adjetivo (“Há muitos homens maus pelo mundo”).

Houveram/houve:

Na língua portuguesa, o plural “houveram” não existe. Isso porque o verbo “houve”, no sentido de existir ou de tempo decorrido, é impessoal, ou seja, não tem sujeito nem concorda com o plural de outras palavras (“Já houve dias melhores no país”).

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Onde X aonde:

A expressão “onde”, como advérbio ou pronome, indica localização. A diferença entre “onde” e “aonde” é que a primeira é sempre sobre algo estático, ou seja, situações que não mudam de lugar (“Onde você nasceu?)”. Enquanto isso, “aonde” indica movimento (“Aonde você vai?”).