Um dos meus rituais cotidianos é passear com o Cisco de manhã, antes de começar a escrever. Por conta desse hábito, já fui até apelidado de “o homem do cachorrinho”, título que alguns podem considerar desabonador, mas do qual me honro. Pelo caminho, vou rezando o terço e observando as belezas simples do Guanabara. Assim como a Vila Brasil, a Vila Casoni (eu prefiro dizer “Gasoni”), o Jardim Higienópolis, o Calçadão da UEL, o Colégio Mãe de Deus e o Centro Histórico, o velho Guanabara é um dos cenários da Londrina do meu coração, e sempre será. Costumo dizer que esses lugares compõem a Vila do Eterno Retorno, uma espécie de Londrina que guardo para uso próprio nos meus sonhos, recordações e crônicas.

Imagem ilustrativa da imagem Um gatinho para D. Helena
| Foto: iStock

Atraem minha atenção no Guanabara as casas de madeira, muitas delas conservadas com esmero; o concerto matutino dos pássaros e dos cachorros vigilantes; as pracinhas solitárias; as ruas eventualmente coloridas por pétalas de flores no asfalto; os vizinhos trabalhadores a quem dou bom-dia; os miolos de quarteirão, com seus quintais, edículas e churrasqueiras; as janelas que se abrem para a linha do horizonte londrinense; os jardins bem cuidados, e os mal cuidados também; os caminhantes matinais que descem para o Lago Igapó; as conversas animadas dos operários e diaristas que descem do ônibus no ponto da Madre Leônia; a moça da loja de embalagens; o rapaz do açougue; o vendedor de abacaxis; a velhinha que vai à venda; os fiéis que vão o santuário; as crianças que vão à escola; um senhor no meio da quadra de basquete; e uma árvore que nasceu no tronco de uma antiga árvore. Vou rezando e olhando, contemplando e orando: — Nossa Senhora, rogai por todos eles.

Eu e Cisco sempre passamos sempre pela Toca do Bode, meu endereço preferido das noites de sexta-feira. E todos os dias lá eu vejo D. Helena, 82 anos, a batchan da Toca. Ela chega cedinho ao bar para começar o preparo dos salgadinhos e porções que serão servidos à noite. Mas, nos últimos dias, D. Helena parece um pouco triste. Acho que eu sei o motivo...

Há algumas semanas, o gatinho da Toca do Bode morreu atropelado ao tentar atravessar a avenida. Agora, a batchan está sozinha em suas manhãs. Por isso, ando à procura de um gato. Tem que ser um gato vira-lata, desses que sabem viver na rua e não se incomodem com frequentadores de boteco. Tem que ser um gato bonzinho e que aceite, como o gato anterior, sentar-se no colo de uma senhorinha simpática. Mas, antes de qualquer coisa, será preciso falar com a batchan, porque eu ainda não a consultei sobre o assunto. Aproveito esta crônica para perguntar:

— D. Helena, a sra. quer um novo gatinho?

Se ela não quiser, esqueçam o que eu disse. E até amanhã, na Toca.