Serviço em Londrina já foi considerado modelo e referência nacional em razão da organização do trabalho dos catadores e volume coletado
Serviço em Londrina já foi considerado modelo e referência nacional em razão da organização do trabalho dos catadores e volume coletado | Foto: Saulo Ohara



Londrina foi uma das cidades pioneiras no Brasil a implementar o sistema de coleta seletiva, em 1996. O serviço já foi considerado modelo e referência nacional em razão da organização do trabalho dos catadores e volume coletado. Hoje, a coleta seletiva no município enfrenta problemas que vão desde a redução no montante de materiais reciclados até dificuldades na estruturação econômica e organizacional das cooperativas. Dos cerca de 28% de resíduos que a cidade chegou a reciclar no início dos anos 2000, atualmente apenas 6% são reaproveitados. O restante vai para o aterro sanitário, reduzindo sua vida útil e aumentando os custos da coleta de lixo para o município.

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Esse e outros dados fazem parte de um estudo sobre resíduos sólidos domésticos desenvolvido pelo grupo de pesquisa Gestão de Resíduos Sólidos Recicláveis de Londrina, composto por nove alunos e 11 docentes dos departamentos de Administração, Biologia e Comunicação da UEL (Universidade Estadual de Londrina). Nesse período, foram feitas visitas às cooperativas e ao aterro, análises gravimétricas, observadas diversas variáveis e o resultado é um relatório que será apresentado durante o 2º Simpósio Sobre Gestão de Resíduos Recicláveis na Cidade de Londrina, que acontece nesta sexta-feira (14), no Cesa (Centro de Estudos Sociais Aplicados), na UEL, a partir das 8h30. O levantamento também deverá ser encaminhado à gestão municipal e poderá colaborar na definição de estratégias de ação.

O estudo teve como foco a gestão dos resíduos sólidos domésticos no município e o objetivo era entender o contexto local da coleta seletiva. Para os pesquisadores, é evidente que a população não contribui adequadamente para o sistema. Dados da CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização) mostram que, em 2018, a quantidade mensal de resíduos encaminhada às cooperativas é de 2,8 quilos por domicílio. Para o aterro, cada domicílio encaminha pouco mais de 46 quilos. "Noventa e quatro por cento dos resíduos gerados hoje em Londrina estão indo parar no aterro. Já foi muito menor. Londrina já chegou a quase 11% de coleta seletiva. Faltam campanhas educativas para orientar a população", destacou a professora do Departamento de Administração e coordenadora do estudo, Lilian Aligleri. "Londrina é um grande polo de coleta seletiva, embora vejamos muitos resíduos ainda nas ruas e a zona rural não seja contemplada", destacou a professora de biologia geral, Patrícia de Oliveira Rosa da Silva.

SEM DESTINO
Além da colaboração inadequada dos cidadãos, o sistema de coleta em Londrina esbarra na falta de compradores para materiais específicos. As garrafas pet coloridas e o BOPP, material utilizado em embalagens de doces e salgadinhos, são exemplos de recicláveis que estão indo para o aterro, com autorização do município, por falta de compradores, segundo Aligleri. "Só a Cooper Região, pelo dado que ela levantou, chega a juntar quase uma tonelada por mês de BOPP e não tem destino. Os pets coloridos também são um problema. Talvez uma saída seria as empresas pagarem para as cooperativas separarem o material e as empresas então darem o destino adequado porque não pode jogar no aterro. A gente não pode assumir um custo público por isso, que é o que está acontecendo hoje", defende.

O vidro, um dos materiais mais abundantes nos barracões das cooperativas, também é outro problema porque, financeiramente, a reciclagem desse tipo de resíduo não compensa. O estudo apurou que todos os anos, as sete cooperativas que atuam em Londrina recebem, juntas, 2,3 mil toneladas de vidro e esse volume é enviado para o município de Porto Ferreira (SP), onde é feita a reciclagem. Os recicladores de Londrina, depois de separar e triturar o material manualmente, recebem apenas R$ 0,07 por quilo. "Não vale a pena reciclar vidro aqui em Londrina. As cooperativas fazem porque têm um compromisso social e ambiental. Agora, se elas deixassem de fazer, o custo para o município seria enorme porque todo esse vidro que hoje elas estão arcando com o custo de separação, o município teria que bancar com o custo de levar para o aterro e manter esse resíduo no aterro. Esse tipo de cálculo, na minha opinião, a prefeitura não faz quando fala de coleta seletiva", afirmou Aligleri.

Segundo a professora, na Cooper Região 25% da massa de material recebido é vidro, mas o produto representa apenas 1,4% do faturamento da cooperativa.

A CMTU nega que resíduos recolhidos pelas cooperativas estejam sendo encaminhados à CTR (Central de Tratamento de Resíduos) e por meio de nota informou que "eventuais artigos recicláveis que possam ter sido destinados ao CTR são oriundos da não segregação correta quando realizada nos domicílios".

GESTÃO
Mas apesar de todas as dificuldades que envolvem o sistema de coleta seletiva em Londrina, os pesquisadores concluem como viável o modelo de gestão por meio de cooperativas, embora entendam que esse modelo precisa ser aprimorado.

"A gente entende soluções como oportunidades em diferentes dimensões e uma das dimensões é na gestão das cooperativas. Existe uma oportunidade se você aprimorar o processo de coleta e de logística porque isso cria perspectivas, por exemplo, para o surgimento de novos negócios", explicou a professora do curso de administração e membro do grupo de pesquisadores, Samara Silva Headley. Ao colocar o sistema de coleta seletiva nos eixos, afirma ela, o município conseguiria criar uma geração de riqueza e formar uma cadeia de negócios e um arranjo produtivo local. "Existe aqui uma competência instalada que pode estar sendo desmantelada e está se perdendo. Mas existe um potencial já adquirido pelo município há algumas décadas que agora pode virar ganhos maiores para a sociedade", disse Headley.