Imagem ilustrativa da imagem Minha vida não é minha
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Chamo o táxi para ir à missa em latim. No trajeto, como faço sempre, puxo conversa com o motorista. Ele diz que estava na praça há pouco tempo, apenas alguns meses. Trabalhou durante anos numa grande empresa da cidade, mas pediu as contas para abrir seu próprio negócio. Como vivemos no país em que mais de 90% das empresas fecham as portas no primeiro ano de atividade, ele não teve sucesso. Mas não desanimou. Por indicação de um amigo, começou a trabalhar com táxi. Por enquanto, é o suficiente para pagar as contas.
Ao me deixar na capela, o taxista diz, com um sorriso: "A minha vida não é minha, ela pertence a Deus".
"A minha vida não é minha." A frase ficou ressoando em minha mente durante um longo tempo, inclusive durante os momentos mais solenes da missa em latim. Saí da capela revigorado, pronto para enfrentar os desafios do mundo e escrever um livro sobre um homem que conheci há muitos anos; um homem que viveu a glória e o ostracismo; o poder e a traição; o sucesso e a derrota; a riqueza e a simplicidade; o sonho e a desilusão; a guerra e a paz. Entre os papéis do homem, encontrei um velho poema de Rudyard Kipling, traduzido por Guilherme de Almeida, que meu pai um dia disse ser "o príncipe dos poetas".
Eis o poema, que serve para mim, para o taxista, para o homem do livro e para todos vocês, meus queridos sete leitores:

Se és capaz de manter a tua calma quando
Todo o mundo ao teu redor já a perdeu e te culpa;
De crer em ti quando estão todos duvidando,
E para esses no entanto achar uma desculpa;
Se és capaz de esperar sem te desesperares,
Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,
E não parecer bom demais, nem pretensioso;
Se és capaz de pensar — sem que a isso só te atires,
De sonhar — sem fazer dos sonhos teus senhores.
Se encontrando a desgraça e o triunfo conseguires
Tratar da mesma forma a esses dois impostores;
Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas
Em armadilhas as verdades que disseste,
E as coisas, por que deste a vida, estraçalhadas,
E refazê-las com o bem pouco que te reste;
Se és capaz de arriscar numa única parada
Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,
E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada,
Resignado, tornar ao ponto de partida;
De forçar coração, nervos, músculos, tudo
A dar seja o que for que neles ainda existe,
E a persistir assim quando, exaustos, contudo
Resta a vontade em ti que ainda ordena: "Persiste!";

Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes
E, entre reis, não perder a naturalidade,
E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,
Se a todos podes ser de alguma utilidade,
E se és capaz de dar, segundo por segundo,
Ao minuto fatal todo o valor e brilho,
Tua é a terra com tudo o que existe no mundo
E o que mais — tu serás um homem, ó meu filho!