Imagem ilustrativa da imagem Às mães que perderam seus filhos
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"O inferno é não amar nunca mais."
(Georges Bernanos)

Havia acabado de enviar a coluna de hoje quando recebi a terrível notícia das crianças assassinadas na escola em Suzano, São Paulo.

Meu pensamento imediatamente se volta às mães das crianças mortas. Ninguém jamais poderá definir, com meras palavras, o que se passa no coração de uma mulher que perde o seu filho. Igualmente impossível será definir a treva que se apossou do coração dos demônios que cometeram o crime. Mais uma vez, recorro às palavras que escrevi um dia:

Não há ninguém mais triste do que a mãe que perdeu o filho. Tens dificuldade para acordar de manhã? Lembra-te da mãe que perdeu o filho - e levanta. Tua conta está no vermelho, tuas dívidas se acumulam, teu negócio não prospera? Pensa por um minuto na mãe que viu o corpo do filho sem vida; consola-te para todo o sempre. Acordaste de ressaca? Toma um comprimido, meio litro d'água, um banho bem quente - e toca o barco, rapaz! Estás gripada, moça? Para isso, há vitamina C e cama. Para a mãe que perdeu o filho não há nada. Tens medo de perder o emprego, amigo? Não te esqueças do pior medo que um dia se confirmou neste mundo.

As canções mais tristes de Schumann, os retratos mais sombrios de Goya, os poemas mais áridos de Eliot não chegam nem perto do olhar vazio da mãe que acabou de perder um filho. As árvores de Beckett não têm folhas nem frutos. No entanto, são mais felizes do que a mãe que perdeu o filho.

É para ti que escrevo, ó mãe que perdeu o filho. É para ti que trabalho sete dias por semana, 30 dias por mês, 12 meses por ano, 60 segundos por minuto. É para ti que alinho verbos, substantivos, artigos, preposições, conjunções, numerais e outros tipos de palavras. Deixo para trás os adjetivos pois, face a ti, mulher que perdeu o filho, só me resta um: triste. Quando me lembro do que aconteceu, imagino por um instante que Deus criou o mundo vitimado pela tristeza. Ele também perderia o Filho. E esse Filho teria Mãe.

A cidade dos mortos está repleta de filhos que deixaram suas mães. Naquele lugar, existem estranhos relógios. Mas, na cidade dos vivos, o tempo não passa para as mães que perderam os filhos. Aconteceu há 50 anos? Há dez anos? Há um ano? Há uma semana? Há um dia? Não importa: os filhos mortos têm a estranha capacidade de continuar vivos, ao lado de suas mães, para a eternidade. Eles são a verdadeira razão da existência das sombras. Quando olhares para tua própria sombra, leitor, lembra-te das mães acompanhadas por quem do ventre delas nunca saiu. Os oceanos da Terra, e as águas ainda por ser descobertas em outros planetas, mesmo que somadas, não seriam suficientes para limpar a nódoa de um só minuto da mãe sem o filho.

E, no entanto, contra toda as marés, elas vivem. Elas sobrevivem. Às vezes, são até capazes de sorrisos e pequenas alegrias. Algumas chegam a gerar outros filhos para povoar o desértico vale da vida. Nenhuma glória humana - nem a roda, nem a América, nem a penicilina, nem o computador, nem a bomba atômica, nem a viagem à Lua - pode chegar aos pés do milagre da mãe que perdeu o filho, e continuou vivendo.

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