"Se associarmos a infertilidade com o tratamento, o mais comum no sexo feminino é o de câncer de mama, mesmo não tendo relação com o trato genital", afirma oncologista clínico Vitor Teixeira Liutti
"Se associarmos a infertilidade com o tratamento, o mais comum no sexo feminino é o de câncer de mama, mesmo não tendo relação com o trato genital", afirma oncologista clínico Vitor Teixeira Liutti | Foto: Saulo Ohara



Há poucas décadas, não se podia imaginar um médico conversando sobre fertilidade com um paciente com câncer. Hoje, já existe a oncofertilidade, uma interface entre a oncologia e a reprodução humana, em que a qualidade e vida social dos indivíduos são levados em conta com o tratamento.

Essa esfera tem alguns motivadores, como o avanço da medicina que promove um prognóstico de sobrevida aos pacientes, as novas tecnologias e pesquisas no campo da reprodução humana e o fato, também, de que a doença tem atingido homens e mulheres em idade reprodutiva.

Segundo o oncologista clínico Vitor Teixeira Liutti, que atua no Hospital do Câncer de Londrina, os tumores ginecológicos são os tipos mais relacionados com a infertilidade. "No caso das mulheres, são os de colo uterino, endométrio, ovário e vulva. Em homens, são os linfomas e o de testículo. Isso relacionado ao tumor em si. Se associarmos a infertilidade com o tratamento, o mais comum no sexo feminino é o de câncer de mama, mesmo não tendo relação com o trato genital", afirma.

Liutti comenta que há três pilares de tratamento na oncologia: cirurgia, radioterapia e quimioterapia. A cirurgia pode comprometer a fertilidade quando se faz um procedimento, por exemplo, de retirada do útero ou ovários; ou nos homens em cirurgia da próstata que compromete todo o aparelho espermático ou do testículo.

Na radioterapia, quando aplicada, por exemplo, na pelve, os folículos ovarianos podem entrar em falência por conta disso. Já da parte masculina, a atenção é para o campo de tratamento próximo da gônada, como para tumores de reto, próstata e de testículos. "Atualmente, há técnicas que conseguem focar mais no tumor e menos nas estruturas em volta, mas ainda assim há a possibilidade de comprometimento. Outro fator a ser considerado são os pacientes submetidos à radioterapia no crânio, pois pode atingir a hipófise e comprometer a produção hormonal que estimula tanto os folículos ovarianos quanto as espermatogônias dos testículos", comenta.

Quanto à quimioterapia, o impacto na fertilidade vai depender muito do tipo e dose aplicada, da idade de cada paciente e a reserva ovariana ou de espermatozoide.

Imagem ilustrativa da imagem REPRODUÇÃO - O impacto do câncer na fertilidade



O ginecologista Ricardo Marinho, membro da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana, explica que alguns tratamentos baseados na quimioterapia atingem as células cancerígenas, mas também as células germinativas, em homens e mulheres.
"O cenário que a gente tem hoje são mulheres mais jovens com tipos de câncer que têm a chance muito grande de serem curadas, mas que a quimioterapia pode afetar a chance delas engravidarem futuramente. As mulheres passaram a prestar atenção nisso agora, mas os homens também", comenta ele, diretor científico da clínica Pró-Criar, em Belo Horizonte (MG).

Para o oncologista, o aspecto mais importante é a idade. "Artigos estimam que em adolescentes o risco de infertilidade induzido pela quimioterapia é entre 6% a 12% e em pacientes acima dos 40 anos é acima de 50%", afirma, considerando a lógica de que o avançar da idade dificulta cada vez mais as chances de mulheres engravidarem.

"Mas pode acontecer que com o tratamento o paciente entre em um quadro de infertilidade transitória e, com o passar de alguns anos, volta a ser fértil. Isso pode ser conferido com exames específicos", completa Marinho.

CONTRACEPÇÃO
Ainda de acordo com o oncologista, é preciso aconselhar os pacientes também sobre a concepção durante o tratamento de câncer. "A mulher não pode engravidar nesse período porque há o risco de ela perder o bebê e também comprometer o tratamento, pois ele não poderá ser continuado", salienta.

De forma geral, a recomendação para esses pacientes é o uso de métodos contraceptivos de barreira, como a camisinha ou DIU (dispositivo intrauterino). "Muitas vezes, as mulheres têm alguns tumores que são dependentes de hormônios e por isso, nesses casos, usar o contraceptivo não é uma recomendação de rotina", diz.