São Paulo - A FDA, agência de fármacos e alimentos dos EUA, decidiu apressar testes clínicos com metilenodioximetanfetamina (MDMA) para tratar transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). É a primeira droga psicodélica a receber sinal verde preferencial para buscar licença como remédio. A MDMA entra - ou deveria entrar - como principal componente do ecstasy, estimulante de amplo consumo em festas e raves. Proibida, a droga vendida ilegalmente pode, contudo, conter mais anfetamina do que a própria metilenodioximetanfetamina.

A decisão da FDA contempla esforços da Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos (Maps, na abreviação em inglês), organização sem fins lucrativos fundada em 1986 nos EUA. Ela já angariou US$ 44 milhões para estudos sobre uso medicinal de maconha, MDMA, LSD e outras substâncias. "Pela primeira vez a psicoterapia assistida por psicodélicos será avaliada em testes de fase 3 para possível uso sob prescrição, com a psicoterapia apoiada por MDMA (ou midomafetamina, nome genérico aprovado para a droga) para TEPT abrindo o caminho", festeja o presidente da Maps, Rick Doblin.

Em estudos preliminares para investigar efeitos colaterais e doses ideais (fase 2) com uma centena de pacientes, a MDMA obteve resultados encorajadores. Após 12 meses de acompanhamento, 68% dos participantes não se encaixavam mais nos parâmetros para diagnosticar TEPT. A expectativa é que a aprovação final venha em 2021.

A MDMA atua sobre os receptores serotoninérgicos do cérebro, aumentando os níveis do neurotransmissor serotonina. Reduz o medo, rebaixa defesas, melhora a comunicação, a introspecção, a empatia e a compaixão.

Ministrada na forma pura em três sessões, como propõe a Maps, com acompanhamento de uma dupla de terapeutas especialmente treinados, a droga permite ao paciente falar de eventos traumáticos sem reviver a angústia, as crises de pânico, os pesadelos e os pensamentos suicidas da vida cotidiana.

"Para além de qualquer tendência ideológica, o fato é que os resultados preliminares indicam grandes potencialidades da MDMA para o tratamento desse problema. Caso venha a ser legalizada, seguramente abre a porta para que novos psicodélicos sejam aceitos e incorporados como tratamentos com acompanhamento terapêutico", diz Beatriz Cayubi Labate, antropóloga social brasileira.

"Existe um grande tabu e uma estigmatização em torno dos psicodélicos, ora considerados como patologias, ora criminalizados, ora demonizados. Mas essas substâncias ocuparam e continuam ocupando lugares centrais no mundo dos povos tradicionais, como é o caso da ayahuasca no Brasil, do peyote no México e nos EUA", defende a pesquisadora.