A fruta é o primeiro alimento que o bebê irá provar após os seis meses de aleitamento exclusivo. E esse momento, que é tão aguardado pelos pais, teve um capítulo à parte na casa da família Magalhães Vidak. "Conforme eu ia oferecendo a banana, ela ia cuspindo e, em poucos minutos, a boquinha ficou toda vermelhinha; depois foram os olhos e orelhas até se espalhar pelo corpo todo", conta Selma, mãe da Helena, que acaba de completar um ano.

Após se consultar com um especialista e realizar um teste cutâneo, Selma descobriu que a filha caçula é alérgica à banana. "Agora, só introduzo um alimento novo por dia porque fico apreensiva se ela terá uma reação alérgica ou não. Procuro tomar todo o cuidado possível", comenta.

Alice Libos Boselli, de dois anos e meio, já pode comer todas as frutas, mas na introdução alimentar precisou ter um cardápio restritivo. "Entre os 9 meses e um ano, precisei investigar qual alimento estava provocando alergia, além do leite de vaca. Tirei muita coisa do cardápio e só reentroduzi muito tempo depois", conta a mãe Victória Libos. Dependendo do alimento, Alice tinha vermelhidão na pele, cólica e irritação intestinal. "O médico disse que a alergia ao leite também poderia desencadear reações a outros alimentos. No caso dela, foi à banana, laranja, morango, tomate e kiwi", afirma.

A alergista e imunologista pediátrica em Londrina, Ana Paula Juliani, diz que as reações alérgicas a alimentos são muito mais frequentes na faixa etária pediátrica (até os dois anos) do que nos adultos. "São inúmeros motivos, mas basicamente ocorrem porque são os primeiros alérgenos que a criança entra em contato. Vejo que tem aumentado o número de pacientes da faixa etária pediátrica com reação à fruta sim, mas essa frequência comparada ao de leite de vaca e ovo é bastante pequena", aponta.

Alice já pode comer todas as frutas, mas na introdução alimentar precisou ter um cardápio restritivo
Alice já pode comer todas as frutas, mas na introdução alimentar precisou ter um cardápio restritivo | Foto: Gustavo Carneiro



No dia a dia, Ana Paula tem visto casos de crianças com alergia à banana, mas esclarece que cada organismo pode dar uma resposta a determinados alimentos e que pode haver relação com outros agentes alergênicos. "Existem crianças maiores que têm alergia ao pólen e podem ter reação ao comerem frutas como banana, maçã, cereja, pêssego e kiwi", diz.

A presidente do Departamento Científico de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatra (SBP), Virgínia Weffort, acrescenta que o kiwi tem um látex que em alguns casos pode desencadear uma reação em crianças também com alergia à proteína do leite de vaca. "Há uma semelhança nos componentes", afirma.

Ela ainda ressalta que o morango não é muito recomendado entre os pediatras pela alta concentração de agrotóxicos em seu cultivo. "Não vai provocar uma alergia, mas pode causar uma intoxicação alimentar", completa.

O médico nutrólogo da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), José Alves Lara Neto, esclarece que todas as frutas podem ter elementos que podem ser tóxicos, mas em doses extremamente pequenas. "Todas elas (frutas) têm glicosídeos cianogênicos, que são substâncias de defesa do fruto, funcionando como um herbicida natural. Esses elementos estão por exemplo, nas sementes de ameixas, pêssegos, cerejas e maçãs, mas para causar uma intoxicação o consumo deve ser em grande quantidade", sustenta.

Imagem ilustrativa da imagem Frutas na primeira infância



IMEDIATO
As alergias às frutas são caracterizadas como reações mediadas por anticorpos da classe IgE, isto é, reações imediatas. Sendo assim, a criança vai apresentar alguns sinais minutos após o consumo da fruta, o que facilita na identificação do alimento alergênico. "Os sintomas não são gastrointestinais, mas de pele. Já em casos graves, a criança pode ter um choque anafilático com queda de pressão sanguínea e quadro de insuficiência respiratória", afirma a alergista.

Em relação ao tratamentos, a especialista detalha que para as reações leves, de pele, uma dose de antialérgico é suficiente. "Se as reações forem generalizadas ou com sintoma respiratório envolvido é preciso buscar um pronto-socorro imediatamente para aplicação de adrenalina intramuscular", indica. Com o diagnóstico confirmado, o médico poderá passar um kit de emergência para o paciente ter em casa. "É um plano emergencial até chegar ao hospital", completa.

Casos das lichias aumentou preocupação dos pais
Recentemente, um estudo relacionou a morte de mais de 100 crianças em Muzafarpur, na Índia, com o consumo de lichias. A região é a maior no país em cultivo da fruta. Entretanto, um artigo publicado no final de janeiro pela revista científica britânica The Lancet, esclarece que a ausência de refeições ao longo do dia modificou significativamente o efeito da ingestão da fruta.

Segundo o estudo, a toxicidade da hipoglicina A e seu composto metilenociclopropilglicino (MCPG) alteram o metabolismo da glicose pelo corpo, e a ingestão excessiva da fruta com a baixa condição nutricional das crianças ocasionou casos de hipoglicemia noturna e, consequentemente, encefalopatia.

O endocrinologista pediátrico em Londrina, Claudinei da Costa, comenta que a divulgação dos casos das lichias fez com que aumentasse a preocupação dos pais durante as consultas, sobre quais alimentos seriam realmente perigosos ou que não deveriam ser fornecidos para os bebês.

Ele enfatiza que o caso das lichias é específico e deve ser contextualizado com as condições de vida das crianças indianas. "Essa tragédia, porém, serviu de alerta para que os pais buscassem mais informações sobre como introduzir novos alimentos aos filhos", aponta.

A pediatra do departamento científico de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Virgínia Weffort, comenta que para saber se a lichia produzida no Brasil oferece algum risco é preciso realizar pesquisas específicas. "No Brasil, já se sabe que a carambola tem uma toxina, mas que só é prejudicial para quem sofre de problema renal", afirma. (M.O.)

‘O importante é ser tudo natural’
A pediatra do departamento científico de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Virgínia Weffort, ressalta que quando o bebê completa seis meses de vida, deve-se introduzir tudo na alimentação que possa dar alergia.

Segundo ela, com o tempo a criança vai dessensibilizando, adquirindo resistência. "Em torno de 5% das crianças serão alérgicas a vida inteira. Em geral, com dois, três anos, elas não terão mais reação. É por isso que recomendamos essa época (de seis meses de vida) para oferecer essas frutas. Ela vai reconhecer que o alimento é estranho, mas não vai produzir anticorpo contra o alimento", afirma.

Além disso, Virgínia recomenda oferecer a fruta e não o suco. "Trabalhos têm mostrado que a obesidade está relacionada com o consumo de suco, mesmo aquele que é feito na hora. O importante é ser tudo natural e lembrar que a criança tem que comer o que é próprio para a idade dela", completa. (M.O.)