A diarista Maria Sezinandi sofre com reações alérgicas desde criança e espera há cinco anos na fila do SUS para consultar um especialista
A diarista Maria Sezinandi sofre com reações alérgicas desde criança e espera há cinco anos na fila do SUS para consultar um especialista | Foto: Ricardo Chicarelli


Leite de vaca, ovo, trigo, frutos do mar e amendoim são algumas das comidas que mais desencadeiam reações alérgicas, mas a lista é muito maior. Para quem sofre com o problema, a grande dificuldade é o diagnóstico, que só é conclusivo se feito pela provocação oral com alimentos, prática ainda pouco disseminada entre os especialistas.
As mudanças no estilo de vida da humanidade têm provocado um crescimento significativo nos casos de alergia, seja ela alimentar, respiratória, de contato, medicamentosa. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 35% da população brasileira sofre desse mal, mas especialistas estimam que, em alguns anos, metade da população terá desenvolvido algum tipo de alergia.
A alergia alimentar ocorre quando o sistema imunológico reage à ingestão de um determinado alimento. O problema, muitas vezes, é descobrir que alimento é esse. "Na maioria das vezes, o diagnóstico é feito com teste de sensibilização, mas o único realmente eficiente para comprovar 100% a alergia é a provocação oral", afirma a alergologista do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), Ariana Campos Yang.
O teste de provocação oral consiste na ingestão assistida de alimentos suspeitos. "O paciente ingere ali no consultório, com supervisão médica, aquele alimento que pode ser o responsável pela reação alérgica. E aí se observa se vai haver essa reação", explica Ariana. Segundo ela, esse teste não é novo, mas ainda não está presente na maioria dos serviços de saúde. "Poucos centros no Brasil estão capacitados para realizar esse teste. Em Londrina, existe um ou dois profissionais", conta.
Sem o teste adequado, o diagnóstico pode acabar sendo impreciso o que, muitas vezes, faz com que o paciente exclua de sua dieta alimentos que não são os responsáveis pela alergia. "Na nossa experiência no HC, percebemos que a cada dez pessoas que fazem restrição alimentar, pelo menos sete não são alérgicas a alimentos. O que provoca a reação alérgica nelas é outro fator, como ácaros, animais", explica a especialista. "Nós vivemos hoje um problema que é o overdiagnosis, ou sobrediagnóstico, que faz a pessoa adotar restrições alimentares desnecessárias, por erro no diagnóstico", conta Ariana.
Segundo ela, isso ocorre porque o aumento dos casos de alergia ainda é recente e a medicina ainda não está totalmente preparada para lidar com isso. "Até 15 anos atrás, alergia era uma coisa rara. Nas universidades, os médicos não foram treinados para tratar isso, por isso há a necessidade de fazer esse preparo agora", afirma. Por isso, a provocação oral com alimentos será um dos assuntos abordados por diferentes especialistas no 43º Congresso Brasileiro de Alergia e Imunologia. O evento, realizado pela Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia (Asbai), ocorre entre 28 de setembro e 1º de outubro, em Curitiba.

ALERGIA GERAL
Desde pequena, a diarista Maria Sezinandi sofre com reações alérgicas. Ainda hoje, aos 50 anos, ela não sabe como evitar o problema, que parece piorar com o tempo. "Eu tenho alergia a tudo o que é industrializado, que tenha corantes e conservantes", conta. Mas também já sofreu reações depois de ingerir produtos in natura. "Algumas vezes, o tomate me dá alergia, talvez pela quantidade de veneno que ele absorve", pondera.
Maquiagem, perfume, sabonete também estão na lista de restrições de Maria. E o pior: alguns medicamentos são igualmente prejudiciais a ela. "Já tomei remédio antialérgico que só piorou. Hoje só tem um que eu sei que posso tomar tranquila", afirma.
Por sorte, a reação do organismo dela não é tão extrema, como o choque anafilático, que em poucos minutos pode levar à morte. Mas não deixa de ser um grande sofrimento. "A sensação é horrível: sinto um cansaço, uma falta de ar, os olhos ardem, não consigo enxergar direito, tudo incha", conta a diarista.
Mas a falta de diagnóstico no caso de Maria não vem da falta de capacitação médica para realizar o teste de provocação oral. Maria nem sequer passou por um especialista. "Estou na fila de espera há cinco anos, para poder passar por um especialista do SUS", lamenta.