Imagem ilustrativa da imagem VIOLÊNCIA - ‘É preciso acolher a dor dos jovens’
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A violência está presente no dia a dia dos adolescentes brasileiros. Enganam-se, porém, aqueles que pensam que ela incide apenas nas periferias. O psicólogo clínico e psicoterapeuta de crianças, adolescentes e famílias Ivan Capelatto avisa que a violência contra esta faixa etária perpassa todas as classes sociais. "Ela não é provocada por falta de dinheiro, mas por ausência do afeto, do acolhimento e da paciência", resume.
Não à toa, segundo ele, o Brasil é o terceiro país em violência no mundo e o primeiro em suicídio de jovens. "Isso ocorre porque entramos na sociedade contemporânea com gerações que já vinham sendo comprometidas pela descrença na vida e pela necessidade de ter prazer imediato", analisa, remetendo ao início do atual milênio, quando passa a ficar cada vez mais comum crianças e adolescentes envolvidos no crime ou consumindo álcool e drogas. "As festinhas de condomínio começaram a ter bebidas, o sexo aparece como forma de prazer imediato e vimos a instalação dos bailes funks e da ‘adultização’ das crianças", critica.
Por outro lado, a sociedade passou a assistir a falência do desejo, o que Capelatto considera extremamente perigoso para a vida humana. "Desejar é ter meta, ter sonhos que demandam sacrifícios para serem atingidos. É o que chamamos de pulsão de vida", diz ele, que cada vez mais observa o desejo ser substituído por um "simples querer" que visa atender o prazer imediato, como por exemplo ganhar um videogame. "Ocorre que é o desejo que mantém a gente ligado à vida."
Ele exemplifica lembrando que as crianças atuais não esperam mais a Páscoa para ganhar ovos de chocolate, visto que estes produtos estão disponíveis nas gôndolas dos supermercados desde o Carnaval. "É necessário mudar a maneira de entender a vida, temos que voltar a fazer com que crianças desejem que chegue o Natal para ganhar uma calça nova. Suportar a frustração é o que traz saúde mental", ensina.
O problema de uma "sociedade sem desejo" é o aumento da intolerância, o que fica perceptível "no comportamento ácido e bélico entre as pessoas". "Quanto mais há falência do desejo, mais há preconceito, agressividade, bullying e violência como um todo", avalia, destacando que o cenário se concretiza, por exemplo, naquelas histórias em que um menino não aceita o término de um namoro e acaba matando a namorada ou a si próprio.
Para o psicoterapeuta, essas situações mostram que os adolescentes não estão conseguindo chorar, não colocam para fora as próprias angústias e não são acolhidos pelos adultos. "A escola não deixa e a família não liga. Muitas crianças estão em sofrimento e não têm com quem falar, o que acaba resultando em violência", lamenta.
Os pais destes adolescentes, por outro lado, também são "buscadores de prazer" e incutem essa cultura na cabeça dos filhos, ao invés de incentivarem o desejo.
"O pai que também quer ter prazer imediato não para de ver o futebol quando vê o filho chegar da escola chorando. Ele manda o filho se virar, não tem paciência e tolerância com o sofrimento", analisa.

Superproteção
Capelatto não acredita que a superproteção seja capaz de impedir o contato com a violência. "Não adianta ter muro no condomínio ou matricular o filho em uma escola particular cara, porque a violência está lá dentro. Os filhos dos outros são criados de forma diferente e provocar a diferença pode ser muito violento para as crianças", afirma.
A mudança, segundo ele, depende de conscientização da escola, que ainda educa "para o vestibular" mas não acolhe o aluno que está em dificuldades. "O professor chama os pais para se queixar e a família terceiriza o problema para psicopedagogos e outros profissionais, mas o problema não é esse. O principal é que alguém acolha aquele adolescente que está sofrendo", ensina.
O conselho de Capelatto para manter os filhos saudáveis e protegidos não é novo, mas acaba sempre esquecido. "Os pais precisam estar presentes para escutar o adolescente falar do que vê ao redor, seja sobre sexualidade ou da bebida que começa a aparecer nas festinhas. É preciso ter proteção e cuidado, mas também presença, escuta e acolhimento da dor", pede.