Enquanto para empresas de alguns setores econômicos o fim de ano representa uma desaceleração das atividades, em outros, as festas trazem com elas um grande movimento, como no comércio e nos bares e restaurantes. Em períodos como esses, é comum a admissão de trabalhadores extras para complementar a equipe. A nova modalidade de trabalho criada pela reforma trabalhista, o trabalho intermitente, trouxe a possibilidade de contratação desses funcionários de maneira formal.
Nesse tipo de contrato, não existe carga horária mínima e o empregado atua apenas quando é convocado. Pela lei, os empregados devem receber pela hora ou dia pelo menos o valor proporcional ao salário mínimo: R$ 4,26 pela hora ou R$ 31,23 pelo dia de trabalho. Eles terão direito a férias, FGTS, previdência e décimo terceiro salário proporcionais. Segundo especialistas, a modalidade deve ser usada em categorias com demanda irregular por mão de obra na semana, como garçons.
Segundo o advogado Fernando Bastos Alves, integrante da banca Nogueira de Azevedo Advogados Associados, no trabalho intermitente, o empregador pode ficar até um ano sem chamar um empregado para trabalhar, sem que isso onere a companhia ou seja considerado para o trabalhador tempo à disposição da empresa. "Ao contrário do que ocorria anteriormente, em que o tempo à disposição da empresa era pago ao empregado, este poderá trabalhar algumas horas em uma semana, em um mês, em um ano, fazendo jus apenas às horas efetivamente trabalhadas", explica ainda a advogada Meire Palla, da Hasegawa&Neto Advogados.
E, no período de inatividade, o trabalhador pode prestar serviços a outros contratantes. A convocação deve se dar com pelo menos três dias de antecedência. "Isso desonera a empresa de ter de contratar uma pessoa de forma permanente. Ela passa a contratar de forma pontual e é uma segurança para o trabalhador, que terá a carteira assinada e poderá prestar serviços a outros empregadores. Em serviços freelances, sabe-se que tem muita informalidade", comenta Alves.
Mas, pelas próprias características dessa modalidade de trabalho, é possível que um empregado com carteira assinada no regime intermitente termine o mês com renda inferior ao salário mínimo num mesmo contrato. Assim, o empregador não fará a contribuição mínima ao INSS e nem ao FGTS, deixando o trabalhador vulnerável em relação à seguridade social.
Com a nova MP (Medida Provisória) editada na última terça-feira, 14, quando a renda mensal não atingir o salário mínimo, se desejar, o próprio trabalhador terá de pagar a diferença ao INSS. Se ele não pagar, o mês não será considerado para fins de cálculo de aposentadoria.
No encerramento de cada contrato, será permitido ao trabalhador movimentar 80% da conta do FGTS, caso ele tenha recebido mais de um salário mínimo no mês. Mas jamais terá acesso a seguro-desemprego.

Imagem ilustrativa da imagem Trabalho intermitente ajuda a formalizar, mas não garante Previdência



'DESCARACTERIZAÇÃO'
O Partido dos Trabalhadores está debruçado sobre a Medida Provisória 808 com a intenção de apresentar emendas para tentar mudar pontos da reforma trabalhista. Uma delas têm o objetivo de impor o salário mínimo para todos os contratados, inclusive intermitentes.
Na visão do advogado Fernando Bastos, isso descaracterizaria o trabalho intermitente. Ele ressalta que a reforma trouxe outras opções de contratação, como a terceirização e a contratação de autônomo.
Alexandre Guimarães, da Abrasel (Associação de Bares e Restaurantes de Londrina), opina que o trabalho intermitente não foi criado para ser a principal fonte de renda dos trabalhadores, e sim um "complemento na atividade principal", que já oferece garantias.
"Para uma maior segurança ao trabalhador, o ideal seria a concessão de todos os benefícios em igualdade às demais modalidades de contrato, mormente em relação à Previdência e seguro desemprego", pondera ainda Meire Palla, advogada do Hasegawa&Neto Advogados. "No entanto, como se trata de um contrato de trabalho diferenciado, bem como formalizado pelas partes de forma consciente, justifica a ausência de concessão a esporadicidade da prestação dos serviços, a possibilidade de prestação de trabalho a vários tomadores, além da previsão de ocorrência de rescisão tácita, que se dá quando decorrido o período de um ano sem qualquer convocação ao trabalho pelo empregador ou recusa por parte do empregado." (Com Agência Estado)

Modalidade proporciona segurança jurídica

Na visão de Alexandre Guimarães, presidente da Abrasel, o trabalho intermitente trará flexibilidade e segurança jurídica as relações entre contratantes e trabalhadores. "Isso traz uma segurança jurídica que não existia para essa forma de trabalho. A maioria dos restaurantes hoje trabalha com picos e precisaria de mão de obra para aquele momento, o que não justificaria um trabalho mensal. Pode-se usar mão de obra qualificada no mercado disponível para aquele período." E para o trabalhador, é uma oportunidade de sair da informalidade, pontua ele.
Para Guimarães, os bares e restaurantes da cidade irão utilizar o trabalho intermitente "em massa". A Abrasel, ressalta, foi uma das entidades mais atuantes no pedido de regulamentação do trabalho intermitente.
Alzir Bocchi, presidente do SindHotéis Londrina (Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Londrina), opina que o trabalho intermitente beneficiou os trabalhadores, que poderão trabalhar para várias empresas. "Eles terão mais opções." As festas de fim de ano, ele acrescenta, trarão muitas oportunidades para o trabalho intermitente em bares e restaurantes. "Haverá muito serviço extra, serviços para empresas, e o trabalho intermitente vai funcionar bastante."
Dono do restaurante Brasiliano, em Londrina, Marcelo Camargo vê com bons olhos a mudança na legislação e diz que pretende contratar trabalhadores dentro do regime intermitente. "Sem dúvida vai favorecer o setor dos dois lados. Dá mais segurança para o empregador, que agora pode empregar um trabalhador sem nenhum risco por hora, e abre mais possibilidade de trabalho para quem quer atuar no setor."
Para Cláudio Tedeschi, presidente da Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina), a legislação trabalhista era muito "engessada", e empresas acabavam contratando sem amparo legal. "Se engessa de um lado, engessa do outro. Tem que parar de pensar que vai ser bom só de um lado."
O trabalho intermitente, na visão do presidente da Acil, representa também mais oportunidade de trabalho.

Trabalhadores são contra

Ao contrário dos empresários e advogados, os trabalhadores não estão animados com o trabalho intermitente. Pelo contrário. Vice-presidente do Sindecolon (Sindicato dos Empregados no Comércio de Londrina), Manoel Teodoro da Silva ressalta que a nova modalidade trouxe complexidade ao assunto. "Imagine só chegar ao fim do mês e não se recolher o suficiente. O trabalhador vai ter que completar?".
Ele diz que a legislação já permitia contratar por um período menor. "O que acontece é que deixavam de registrar os trabalhadores, situação que continuará sendo recorrente", acredita.
Além disso, na opinião do sindicalista, o trabalho intermitente irá criar "subempregos", ao invés de mais empregos. "Tem muitas empresas que acham que é interessante, mas não é. Tem gente confundindo com horista, acha que vai ficar chamando a hora que quer e que o empregado vai trabalhar por R$ 5 a hora. Ele não vai querer", aposta.
Claudeir Albunio, diretor Jurídico do Sindihotéis, de Curitiba, entidade que representa os garçons, diz ser "radicalmente" contra o trabalho intermitente. Ele usa o mesmo argumento de Silva. "Se quisessem contratar só por alguns dias da semana, as empresas já podiam antes da reforma. Não acho que será bom para o trabalhador e não acredito que irá gerar empregos", ressalta.
Embora reconheça não saber exatamente como será o trabalho intermitente, o garçom londrinense Rafael Ramos Ferreira, 34, não viu nenhuma vantagem para ele. "Não precisávamos de reforma trabalhista e sim de reforma política, com tanta corrupção neste País. Está tudo errado", declara.