Durante a 8ª edição do EncontrosFolha, o procurador da Lava Jato, Carlos Fernando dos Santos Lima, compartilhou com os participantes alguns desdobramentos da operação – que completou recentemente três anos. Segundo ele, os empresários precisam absorver o conceito de compliance de forma séria e eficiente para sobreviver, já que o cenário é de "desfaçatez da classe política". "A Lava Jato me ensinou que não adianta fazermos compliance para 'inglês ver'. Me preocupo muito como vamos discutir ética num ambiente tão complexo. Como o empresário vai se proteger individualmente de um sistema (político) como esse?", indagou.

O procurador citou como exemplo o Grupo Odebrecht. Lembrou que a empreiteira tinha um departamento de compliance, que curiosamente ficava ao lado do departamento de operações estruturadas, que basicamente cuidava da negociação de propinas. "A Odebrecht, como outras empreiteiras, fazia da corrupção um modo de fazer negócio, incentivado pelo histórico de privilégios dentro de diversos governos."

Na concepção do procurador, hoje, o "sistema político partidário brasileiro é criminógeno", ou seja, gera a corrupção, porque cada candidato precisa procurar uma fonte de financiamento para sua campanha. "Neste panorama, vemos que os empresários estão numa situação muito difícil, que é de serem vitimas desse sistema junto com a população brasileira. Cada um de nós quando compra um produto no supermercado ou enche o tanque de gasolina, paga um imposto chamado corrupção. Ela não é algo distante de nós, está incutida em tudo que pagamos."
Neste turbilhão de dificuldades, o compliance verdadeiro, se torna mais complexo porque "o empresário pode até tentar fazer individualmente, mas pode estar inserido numa cadeia de corrupção". "Por isso temos que ter políticas públicas que incentivem investigações como a Lava Jato".

Com a Lava Jato, o procurador salienta que pela primeira vez pessoas de alto poder foram para a cadeia. "Isso não existia na história brasileira, salvo em alguns casos como o Mensalão. Mostra que o exemplo deve vir de cima para baixo, assim vamos mudar toda essa estrutura."

Aos empresários, Lima relatou que uma estratégia é a organização de classe, como também para trabalhadores, consumidores, etc. "O empresário individualmente não tem como se contrapor (a essas situações de corrupção) e nós como procuradores sabemos disso. Quando recebemos uma denúncia, deixamos claro aos denunciantes que não podemos impedir as consequências daquilo. Hoje o governo não quer punir as empresas que roubaram a Petrobras, mas sim as empresas que colaboraram com Justiça. A organização de classe tem muito poder para evitar esse tipo de problema, com um papel proativo."

Por fim, o procurador relatou que não sabe "se a Odebrecht sobreviverá a tudo o que aconteceu". "A empresa demorou para fazer o acordo, tentou enfrentar as investigações. Ela fez o 'não compliance', que é muito mais caro que o compliance. A Lava Jato é um movimento inevitável de limpeza ética dos negócios e para isso precisamos do empresariado."

José Nicolás Mejía, superintendente do Grupo Folha
José Nicolás Mejía, superintendente do Grupo Folha | Foto: Fotos: Fábio Alcover



ENCONTRO
Para o superintendente do Grupo Folha, José Nicolás Mejía, a grande lição que a sociedade deve aprender com a Lava Jato é que é possível fazer negócios de forma correta. "Podemos manter um relacionamento ético entre poder público e inciativa privada, seguindo as leis, bons princípios e valores", avaliou. Mejía disse ter ficado satisfeito ao ver que o EncontrosFolha conseguiu reunir diferentes pontos de vista sobre o tema e, ao final, "convergir para a mesma solução".

O EncontrosFolha é promovido pelo Grupo Folha três vezes por ano e conta com o patrocínio da Vectra Construtora e Isae/FGV.