Imagem ilustrativa da imagem Ninguém é alegre o tempo inteiro
| Foto: Shutterstock
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Problemas financeiros, humilhação, dor física ou depressão, entre outras causas, são muitas vezes apontados como gatilhos para o suicídio. Os casos recentes de dois homens que se suicidaram e também provocaram a morte de familiares, no Rio de Janeiro e em São Paulo, ganharam a mídia nos últimos dias e incentivaram a reflexão sobre o que leva pessoas a praticarem atos desesperados.



No final de agosto, um motoboy de 41 anos pulou do parapeito do 17º andar do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, na zona oeste de São Paulo, carregando o filho de 4 anos nos braços. Já no Rio de Janeiro, em um condomínio de classe média alta na Barra da Tijuca, um executivo da área de telecomunicações é suspeito de assassinar a mulher e os dois filhos antes de ter cometido suicídio. Nas duas ocorrências, foram identificados sinais de que as vítimas enfrentavam problemas financeiros.

O psicoterapeuta Sylvio do Amaral Schreiner, de Londrina, explica que há muitos tipos de suicídio, mas apenas um motivo leva as pessoas a tirarem a própria vida. "O problema do suicida é não saber lidar com a dor", afirma. No Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, neste sábado (10 de setembro), o especialista faz um alerta. "O grande risco para o suicídio é a falta de relações humanas verdadeiras. Sem elas, as pessoas criam ilusões sobre a vida. Dor, sofrimento e frustração fazem parte da existência, por isso precisamos aprender a lidar com eles. As pessoas podem ser felizes, mas ninguém é alegre o tempo inteiro, pois alegria é apenas um estado momentâneo", defende.

Schreiner lembra que os casos de suicídio são crescentes, inclusive em países sem grandes crises financeiras, como Suécia e Japão. No Brasil, as taxas de morte por este motivo aumentaram 62% entre 1980 e 2012, com maior índice de crescimento entre os homens. "O suicida não quer morrer, ele quer viver, mas não consegue suportar a dor que sente. Os gatilhos podem ser vários, inclusive uma crise financeira, mas não é ela a causa do ato, e sim a representação que a pessoa faz da crise", explica, destacando que, neste sentido, as mulheres parecem ser mais "sábias". "Elas sabem que há uma personalidade além do trabalho. Uma das maiores causas de depressão para os homens é a perda do emprego, pois a identidade masculina é muito ligada a isso. Ele passa a se sentir ‘ninguém’", expõe.

A atitude drástica do suicida decorre de uma mente que não é desenvolvida para lidar com a frustração. Segundo o psicoterapeuta, como não é capaz de se relacionar com as adversidades, a pessoa acaba consigo em uma tentativa de não sentir mais dor. "A prevenção do suicídio não é como uma vacina, mas precisamos começar a desmitificar a vida. Sempre vai haver pessoas boas e ruins, perigos na rua e insucessos", exemplifica.

Este é o caminho para criar indivíduos que saibam usar a mente de maneira mais eficiente e capazes de entender que a dor não é só deles, mas de todo mundo. "A vida não tem que ser gratificante sempre. Existem dificuldades financeiras, familiares e de relacionamentos, tudo isso faz parte e precisamos aceitar que é natural. Há uma ilusão sobre ter sempre sucesso e ser feliz", critica, lembrando que "mesmo as pessoas de sucesso sofrem."

A melhor forma de ajudar pessoas em sofrimento é tentar entendê-las e ajudá-las a dar um sentido para o que estão sentindo. "Não conseguimos fazer com que as pessoas mudem, mas conseguimos jogar elementos para que reflitam e pensem em procurar ajuda", diz. Schreiner destaca que o enorme desenvolvimento tecnológico da sociedade atual dá a sensação de que as tecnologias podem resolver todos os problemas. A mente humana, entretanto, continua com os mesmos desejos e necessidades afetivas da pré-história. "Não houve evolução no mundo interno. A tecnologia não vai tirar a necessidade de lidar com a vida, com as dores e com a construção de uma mente que não vem pronta."

A prevenção do suicídio, portanto, começa com a necessidade de ensinar as pessoas, desde crianças, a lidar com dificuldades e adversidades, construindo alternativas para lidar com isso de maneira eficiente. "Crescer não é só físico, a construção da identidade não ocorre sozinha, a gente tem que nascer por dentro para lidar bem com a vida", diz, lembrando que a causa do suicídio é a desesperança. "A esperança, ao contrário, é o que nos mantém vivos."

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| Foto: Ricardo Chicarelli
O psicoterapeuta Sylvio do Amaral Schreiner: "O grande risco para o suicídio é a falta de relações humanas verdadeiras. Sem elas, as pessoas criam ilusões sobre a vida"