As autoridades presentes à cerimônia, no Parque Ney Braga, contemporizaram a mobilização ocorrida nesta sexta-feira em todo o País
As autoridades presentes à cerimônia, no Parque Ney Braga, contemporizaram a mobilização ocorrida nesta sexta-feira em todo o País | Foto: Roberto Custódio



Se para o governo, a greve geral foi um "fracasso", líderes sindicais e demais representantes da classe trabalhadora comemoram a "grande adesão popular". Segundo a Força Sindical, 40 milhões de pessoas não foram ao trabalho em todo o País. Na guerra de números, ambos os lados consideram-se vencedores. Para Clodomiro Bannwart, professor de Ética e Filosofia Política da Universidade Estadual de Londrina (UEL), o direito de se expressar é salutar tanto para quem é à favor às reformas, quanto para aqueles que são contrários. "A democracia está aberta justamente para isso, desde que nós tenhamos um limite de respeito pela posição ideológica de cada lado deste debate", avalia.

Para o professor, ambos os lados têm erros e acertos. "Vejo as manifestações como legítimas, até porque temos o encaminhamento de duas reformas bastante significativas no Congresso Nacional. Isso afeta diretamente diversos setores da sociedade. E esse é um direito natural de manifestação e reivindicação e de se posicionar democraticamente contra pontos em que há um discordância em relação a esses dois projetos do governo federal", argumenta.

Bannwart acredita que algumas reformas possam ser necessárias, porém este talvez não seja o momento. "Esta não é uma questão só do Brasil, mas do mercado globalizado. Os países que fizeram muitas concessões ao social acabaram tendo que recuar porque começaram a perceber que o Estado não dá conta de cumprir isso. A polaridade do mercado impõe a necessidade de reformas de austeridade, e que isso seja feito em prol do mercado. Nós estamos realizando isso num dos piores momentos de nossa história, que é o momento de nossa crise política. Deveríamos fazer isso num momento de estabilidade", opina.

Segundo ele, as manifestações de 2013 deram a ideia de uma consolidação da democracia brasileira. "Isso infelizmente não ocorreu. Estamos em uma democracia muito fragilizada, porque o sistema político como um todo, além de estar criminalizado, aniquilou a tensão necessária entre governo e oposição. Temos uma espuma ideológica de direita e de esquerda, mas no fundo são discursos que fazem uma cortina de fumaça tentando desviar nossa atenção de questões mais importantes".

O professor se diz cético com a capacidade dos atos públicos de influenciar as votações no Congresso. "Não creio que terá impacto de mudar o curso das reformas. Boa parte do Congresso está criminalizado. Do ponto de vista moral, qual é a dimensão que esse Congresso tem para impor essas reformas? Tudo isso sem debate com a população. É um quadro trágico que não deve ter grandes mudanças". Como solução para uma mudança efetiva, Bannwart aponta a necessidade da reforma política e diz só haver três formas para isso: "Educação, educação e educação".

‘RECADO DAS RUAS’
O professor de Ética e Filosofia Política na UEL, Elve Cenci, destaca que, mesmo com a tentativa do governo de desqualificar o movimento, a greve geral reuniu um número expressivo de manifestantes em todo o país. Para ele, a mobilização pode sim impactar diretamente na tramitação das reformas trabalhista e previdenciária. "Ex-aliados do Temer, pessoas que deram algum suporte para que ele chegasse ao poder, agora se voltam contra ele e contra essas reformas. Também estamos mais próximos das eleições e muitos deputados já temem o efeito eleitoral dessas votações. Esse movimento é o recado das ruas para os deputados. Muitos deles devem repensar agora se vale a pena arriscar uma possível reeleição no ano que vem para sustentar um governo com pouco apoio popular", ressalta.

Cenci acredita que a mobilização nas ruas não foi polarizada como em protestos realizados anteriormente. "Foi um movimento que atingiu sindicatos, trabalhadores e grupos organizados na sociedade. Ganhou uma amplitude muito grande se nós compararmos com o pouco tempo em que o Temer está no governo. Teve uma adesão imensa de grupos que até meses atrás talvez não fossem às ruas. As pessoas deixaram de lado as disputas de quem é pró isso ou pró aquilo e foram atrás de uma bandeira comum. As pessoas foram às ruas porque se sentiram atingidas pelas reformas. Ninguém sai de casa por uma bandeira muito específica que não lhe atinja diretamente", pondera.