Para especialistas, eventual saída de Temer deve ser sucedida de eleições indiretas, como prevê a Constituição; bandeira das Diretas Já é oportunista
Para especialistas, eventual saída de Temer deve ser sucedida de eleições indiretas, como prevê a Constituição; bandeira das Diretas Já é oportunista | Foto: Lula Marques/AGPT



Colocado no centro do mais recente escândalo político nacional pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS, o presidente Michel Temer ainda contabiliza, ao lado do seu grupo de apoio, o tamanho do impacto das novas delações para o futuro do seu governo, que acabou de completar um ano, no último dia 12 de maio. Atualmente, o cenário de calmaria é o mais distante para o peemedebista, tendo em vista o ritmo acelerado de novas revelações depois da quebra do sigilo dos áudios e dos textos pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A incerteza sobre os rumos do País se reflete também nas divergências entre analistas ouvidos pela FOLHA, acostumados a estudar as sucessivas instabilidades na administração pública. Para o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) e analista político, Antônio Augusto de Queiroz, Temer dificilmente vai recuar na sua promessa de não renunciar. "Se ele resistir por mais alguns dias, vai ser muito alvejado e deve ter o mandato cassado no TSE, essa seria uma saída menos traumática e que o grupo no poder considera honrosa. Pouparia a equipe do desgaste de uma demissão do governo, como acontece no processo de impeachment."

Segundo a Câmara dos Deputados, até sexta-feira (19), estavam protocolados oito pedidos de impeachment contra o presidente. O sociólogo da Universidade Mackenzie, Rodrigo Augusto Prando, afirmou que o áudio da conversa entre Temer e Joesley deu fôlego ao presidente, evitando o perigo do impeachment, "por enquanto". "Antes do áudio havia uma debandada, com partidos falando em entregar os cargos. Parece que o pior momento já passou, tanto que o PSDB, com o ministro das Cidades, Bruno Araújo, iria entregar os cargos e recuou, saindo apenas o Roberto Freire (Cultura)." Prando lembrou que "se o ministro Edson Fachin e o Rodrigo Janot têm a visão geral de todas as delações, nós vamos tendo acesso aos poucos."

A sustentação política de Temer vinha se mantendo porque, na avaliação de Queiroz, o Planalto vinha colocando para rodar as reformas que agradam o setor produtivo. Portanto, se Temer tiver condições de manter o governo no mesmo ritmo reformista, ainda poderá ter chances. "O mercado vinha sustentando o governo, por conta da capacidade de Temer de bancar as reformas, mas se ele perde essa capacidade, perde apoio. É diante desse cenário que está Michel Temer, pressionado pela sociedade, pelo lado ético, e pelo mercado, porque ele não vai entregar o que prometeu."

Para o professor de Filosofia da Universidade Estadual de Londrina (UEL) Bianco Zalmora, não há dúvidas de que os vídeos da delação de Joesley Batista incriminam o presidente. "Deveria ter denunciado tais fatos, mas demonstrou assentimento." Diante desta constatação a melhor decisão do peemedebista seria a renúncia, entende Zalmora, acrescentando que trata-se de mera retórica a afirmação de que sua saída geraria instabilidade e paralisaria as reformas necessárias para o fim da crise. "Esse discurso do medo é o mesmo que a ex-presidente Dilma usou para justificar a permanência no cargo. Em que pese o conteúdo diferente, a forma retórica é a mesma." A falácia, segundo o professor, se evidencia justamente porque as denúncias contra Temer já causaram racha na base. "Se ele permanecer, haverá um bloqueio deste processo de reforma defendido por ele."

O professor defende que o atual estado de coisas seja enfrentado sem rupturas, acatando-se os comandos constitucionais e respeitando-se o estado democrático de direito. Por isso, afirma ele, eventual saída de Temer deve ser sucedida de eleições indiretas, como prevê a Constituição. "A bandeira das "Diretas Já" é inoportuna e oportunista", criticou. Para ele, "neste caldo de colapso, eleições diretas, contrariando a Constituição, abririam espaço para propostas salvacionistas, messiânicas".

Zalmora disse que o fato de os simpatizantes do PT defenderem as "Diretas Já" se deve, sobretudo, pelo fato do principal líder petista, Luiz Inácio Lula da Silva, ser o mais bem avaliado em recentes pesquisas de intenção de voto. "Esta ruptura constitucional seria uma forma de um grupo político tentar voltar ao poder, ao comando, local de onde foi retirado pela via democrática", analisou. "Não obstante esta convulsão política, as instituições democráticas estão em perfeito funcionamento no País e devem ser respeitadas." Caso a opção seja por eleições diretas, esta possibilidade precisaria ser discutida com a sociedade e votada Emenda Constitucional no Congresso Nacional.