Gustavo Nicolai, médico especialista em segurança do trabalho
Gustavo Nicolai, médico especialista em segurança do trabalho | Foto: Divulgação



Quando o assunto é segurança e saúde do trabalho e, principalmente, o montante que é necessário para garantir isso em qualquer negócio, uma questão prática ronda o empresariado: é custo ou investimento?

Pois Gustavo Nicolai, médico especialista em segurança do trabalho e responsável pelo Departamento Nacional de Competências em Saúde do Trabalho, Gestão de Atenção à Saúde e Ergonomia da CNI/Sesi (Confederação Nacional da Indústria/Serviço Social da Indústria), tem na ponta do lápis, ou melhor, por meio do simulador Construindo Segurança e Saúde a resposta para cada organização.

A ferramenta é fruto de 17 anos de trabalho nessa área, na qual ele passou boa parte do tempo "tentando convencer os empresários a investir nisso". Diante dos números, o médico é categórico em defender que "o valor investido em prevenção sai barato".

O cálculo que você desenvolveu revela o custo de não investir em saúde e segurança do trabalho na empresa. Como tem sido a recepção entre os empresários?
Foi uma surpresa até para mim o quanto o cálculo chamou a atenção de todo mundo. Não chega a ser um aplicativo de celular, mas é uma página na internet (disponível no site www.portaldaindustria.com.br) que traz uma ferramenta feita para ajudar as empresas a fazerem esse cálculo. De repente, nós encontramos uma forma de falar com o empresário, em uma linguagem que ele entende. Como médico, por formação sou extremamente relacional, gosto de conversar e avaliar aspectos como clima organizacional, mas os donos da empresas, geralmente, são engenheiros. E o engenheiro por natureza é essencialmente analítico. Em dois minutos de conversa, eles perdem a paciência se não trazemos dados objetivos. E esse cálculo proporcionou exatamente isso, em dois minutos de conversa, ele verifica que está perdendo um bom dinheiro ao deixar de investir adequadamente em segurança do trabalho. Quando ele (o empresário) se depara com a planilha, que vincula o impacto financeiro na tributação do SAT (Seguro Acidente de Trabalho), provocado pelo FAP (Fator Acidentário de Prevenção) da empresa, que considera sua sinistralidade em relação aos acidentes e aos afastamentos previdenciários do tipo acidentários, há uma mudança de postura, até porque normalmente esse custo é entregue para ele pela contabilidade misturado ao pacote de tributos pagos. Ele não tem a percepção da economia que fará investindo em segurança do trabalho. Para as empresas, não é nenhum exagero ou sofisma dizer que os custos com saúde e segurança de empregados representam a segunda maior despesa empresarial, estando apenas atrás da folha de pagamento.

Como funciona o cálculo?
Esse SAT, na legislação tributária vigente, impôs à iniciativa privada uma tributação variável. O que fizemos foi quantificar o quanto elas estão pagando a mais quando registram um número maior de acidentes de trabalho ou afastamentos por doenças do trabalho. Compreender o valor de cada sinistro que ocorre em sua empresa ajuda na tomada de decisão e faz com que saúde e segurança não necessariamente representem gasto, mas sim investimento, contribuindo para o efetivo resultado empresarial.

Diante disso, já é possível projetar quanto cada soma investida em segurança do trabalho o empresário poupa na tributação incidente na folha de pagamento por conta do FAP?
Em termos de Brasil, ainda temos muita dificuldade de gerenciar esses dados. Mas existem estudos internacionais, com modelos de cálculo diferentes, revelando que, para cada dólar investido em prevenção de acidentes do trabalho, você recupera US$ 4. Os modelos internacionais mais sucintos apontam para essa proporção. E isso não conta todo o prejuízo de imagem que um acidente de trabalho pode acarretar para a sua empresa. O nosso argumento até então era nessa linha, quanto uma morte afetava a reputação da empresa, e falo da minha experiência com 17 anos atuando com medicina do trabalho. Isso não era palpável. Mas agora, eu chego e digo o quanto a mais o empresário vai pagar em imposto. Mostrar para ele que aquilo é completamente mensurável faz toda a diferença. E mesmo perdendo dinheiro, ele não tem essa noção. Porque o contador vira para o empresário no final do ano com a conta final, com vários impostos. Ele entende que aquilo é o tributo e vai pagar sem saber que naquele pacote tem isso, que sistematicamente ele perde dinheiro sem necessidade. O nosso simulador mostra que você está pagando caro pelos seus erros, e com uma parte desse montante você pode promover a prevenção. Tanto que, no nosso simulador, a barra inferior fica passando o valor médio de cada acidente ou afastamento de trabalho.

O que é preciso para usar a ferramenta/simulador?
No Portal da Indústria, qualquer empresário pode fazer o cálculo livremente. Precisará apenas dos dados do FAP de sua empresa, informados no site do INSS (mediante senha), e do valor estimado de sua folha de pagamento. Chamamos o simulador de Construindo Segurança e Saúde. Nós fizemos um levantamento preliminar desse banco de dados, em dois anos de simulações, e o banco de dados do sistema computava mais de 1,3 mil simulações, para cerca de 270 empresas cadastradas, em 25 Estados e no Distrito Federal. Estudos preliminares dessa base de dados revelam que, para esse grupo de empresas, cada acidente do trabalho custa em média R$ 9.417, e cada afastamento previdenciário mais de R$ 73,3 mil em acréscimos tributários ao SAT. Quando você fala para o empresário o quanto de dinheiro ele está pagando sem precisar, você dá uma informação que ele desconhecia. E o empresário passa a usá-la de forma estratégica.

De alguma forma, os empresários têm noção do quanto isso afeta na produtividade de cada empresa?
Sim e não, porque as formas de mensurar isso são subjetivas. Mesmo em uma empresa de linha de montagem, em que cada colaborador produza dez itens, por exemplo, com um trabalhador ausente, muitas vezes o grupo acaba suprindo a falta daquele. Em outro tipo de negócio, aí que fica ainda mais difícil notar de forma precisa.

Como equalizar prazos com segurança do trabalho e investimentos em um contexto de contenção de gastos nas empresas?
Quem ajuda são os profissionais prevencionistas. Um bom técnico de segurança, um bom profissional de saúde do trabalho, médico, enfermeiro, que farão a identificação dos riscos. Sem capital suficiente, o empresário deverá eleger prioridades e ferramentas de identificação, quantificação e prevenção, a fim de que gradativamente ele vá investindo em um cenário ideal de promoção de segurança e saúde no trabalho.