Ribeirão do Pinhal - A última segunda-feira foi dia de festa no bairro da Jacutinga, zona rural de Ribeirão do Pinhal. A 75ª Festa de Folia de Reis, evento tradicional na região, voltou a reunir devotos dos Santos Reis, como acontece todos os anos em quase oito décadas. Este ano, cerca de 2,5 mil pessoas prestigiaram a folia. A comemoração remete a chegada dos três reis magos, Melchior (Pérsia ), Baltazar (Arábia) e Gaspar (Índia) ao local onde nasceu o menino Jesus, ocorrida no dia 6 de janeiro.
Estima-se que a Folia de Reis tenha chegado ao Brasil com os portugueses, em meados do século 18. Em Ribeirão do Pinhal, a festa foi trazida por Ambrósio Dutra da Silva em 1939. Natural de Minas Gerais, ao tomar posse da então Fazenda Jacutinga, Ambrósio pediu a Nossa Senhora Aparecida e aos Santos Reis que fosse livrado de possíveis desentendimentos com vizinhos. Depois de atendido, ele fundou a companhia e deu início as festividades.
Hoje, são seus descendentes e outros devotos que procuram manter a tradição viva. Um detalhe curioso é que o evento precede a emancipação do município, enquanto a festa chega a sua 75ª edição, Ribeirão do Pinhal completa 67 anos em 2014. "A festa é mais antiga que o município e, quando chega essa época do ano, os fieis já esperam pela folia", diz o produtor rural Júlio Dutra, de 62 anos, que embora resida em Itapetininga (SP), faz questão de tirar férias durante o período só para participar das comemorações.
Júlio explica que grande parte dos devotos é membro da família Dutra. Eles aproveitam o momento para se reencontrar, além de agradecerem as bençãos dos Santos Reis. Antes do grande festejo, realizado no dia 6 de janeiro, no bairro da Jacutinga, são feitas visitas nas casas para arrecadar prendas para o evento. "As visitas servem para levar a bandeira de Santos Reis para a casa dos fieis e possibilitar que eles façam pedidos e agradecimentos. É um momento de muita fé e alegria", diz.
A companhia dos foliões de Ribeirão do Pinhal é composta, como na maior parte do Brasil, por um embaixador, responsável pela bandeira e também por fazer versos, como repentista; um grupo de músicos, que tem a função de puxar as canções, com violas, violões, pandeiro e outros instrumentos; e os palhaços ou bastiões – que com roupas coloridas e máscaras animam o ambiente com brincadeiras, sobretudo após o dono da casa anunciar qual será sua doação. "Esses palhaços representam os soldados que o rei Herodes mandou para seguir os reis magos, mas que se arrependeram ao ver o menino nascido e se tornaram protetores dos três reis, desde então. Eles se vestiam de um modo diferente, por isso as roupas e as máscaras para trabalharem escondidos", garante Júlio.
Primo de Júlio, o comerciante Amado Dutra, de 73, lembra que os cânticos remetem ao aviso de que os foliões chegaram a casa que será visitada para anunciar o nascimento de Jesus. Em seguida, uma nova música é entoada agradecendo a hospitalidade da família e pedindo que a mesma seja abençoada. Antes de sair, a companhia, entoa mais uma música, agradecendo a oferta feita pelo "patrão" – dono da residência visitada.
Também são feitas orações e gritos de viva ecoam pelos mais diversos motivos. "Por gerações minha família mantêm a tradição. No início as visitas eram só no bairro da Jacutinga, mas como muitos devotos vieram para a cidade começamos a fazer visitas em Ribeirão do Pinhal e cidades próximas, como Santo Antônio da Platina e Congonhinhas. No ciclo de visitas (entre 26 de dezembro e 5 de janeiro) chegamos a passar por mais de 120 casas", detalha Amado.

Embaixador
Membro da companhia de foliões há quase 50 anos e embaixador há mais de duas décadas, o agricultor aposentado José de Souza, de 76, comenta que é uma grande honra ocupar esse papel. "É um privilégio ser responsável por cuidar da bandeira de Santos Reis. Aumenta muito a fé".
O ex-agricultor não pretende parar tão cedo. Souza comenta que é o 3º nome a ocupar o cargo de embaixador e que já treina descendentes para que o substituam. "Ainda não penso em parar. Vou fazer isso até quando Deus permitir, mas meus filhos já estão treinados caso um dia precise", afirma.
Um desses filhos, a que se refere Souza, é o supervisor de laboratório Leodenis Aparecido de Souza, de 46. Residente em Apucarana (Norte), ele conta que já participa da companhia, como integrante do grupo de músicos há cerca de 28 anos. "Verso não será problema para mim, caso me torne embaixador. Nessa época do ano meus patrões já sabem que eu tiro para os Santos Reis".

Leia também:

- Fé move famílias a receber Santos Reis

- Jovens querem manter tradição