Após ajuda humanitária não conseguir entrar em Aleppo, comerciantes ficam sem produtos em tenda de mercado na área controlada pelos rebeldes
Após ajuda humanitária não conseguir entrar em Aleppo, comerciantes ficam sem produtos em tenda de mercado na área controlada pelos rebeldes | Foto: Karam Al-Masri/AFP



Alepo - Alimentos e medicamentos eram cada vez mais escassos nos bairros rebeldes de Aleppo, submetidos a intensos bombardeios do regime sírio e da Rússia, acusados de "crimes de guerra" pelas potências ocidentais.
"Nos últimos anos suportamos os bombardeios e não abandonamos Aleppo. Mas agora não há pão, água, nada nos mercados. A situação piora dia a dia", afirmou nesta segunda-feira (26) Hassan Yasin, de 40 anos. Este pai de quatro filhos teve que abandonar com a família o apartamento no terceiro andar de um prédio e buscar refúgio em uma barraca no térreo, para evitar os ataques contra o bairro de Ferdus.
Pela quarta noite consecutiva, as bombas voltaram a atingir o leste de Aleppo, segunda maior cidade síria, controlada pelos insurgentes desde 2012.
A ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH) informou que o balanço de mortos subiu a 140 - em sua grande maioria civis - desde quinta-feira à noite, quando o exército sírio anunciou uma ofensiva mais intensa para reconquistar a totalidade de Aleppo.
Os aviões russos e do regime realizaram "dezenas de ataques" a partir da meia-noite no leste da cidade controlada pelos rebeldes, segundo o OSDH. Ao amanhecer os bombardeios se intensificaram e provocaram incêndios.
Entre os mortos estão mais de 20 crianças e muitas mulheres, afirmou Rami Abdel Rahman, diretor do OSDH. Segundo o OSDH, o número total de vítimas fatais em Aleppo e na província homônima sobe agora para 248, desde o reinício dos bombardeios há uma semana.

'ESGOTADOS'
Os quase 250 mil habitantes dos bairros rebeldes de Aleppo não recebem ajuda externa há dois meses. Desde os bombardeios de sábado, a população não tem água, de acordo com o Unicef.
"Os hospitais se encontram sob forte pressão com o número elevado de feridos e a falta de sangue disponível, além da ausência de cirurgiões especializados em transfusões", afirmou uma fonte médica à AFP. "Por isto, as pessoas gravemente feridas são imediatamente amputadas", completou a fonte.
"Os pacientes são colocados no chão e as equipes médicas trabalham no limite da resistência humana" contou o médico Abu Rajab, da ONG Save the Children.
Ele disse que quase metade dos pacientes nos hospitais são crianças.
A AFP constatou que o preço de sete porções de pão árabe passou de 350 libras sírias (70 centavos de dólar) na semana passada, antes da ofensiva, para 500 libras sírias (1 dólar).
"Agora comemos apenas uma vez por dia. Meus filhos e eu não conseguimos acabar com nossa fome há duas semanas", conta Hassan Yasin

TENSÃO
Em Nova York, as potências ocidentais criticaram a Rússia no domingo em uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU, com acusações diretas a respeito da ofensiva contra Aleppo.
"O que a Rússia apoia e faz não é luta antiterrorista, é barbárie", disse a embaixadora americana Samantha Power.
O Kremlin respondeu nesta segunda-feira e criticou "o tom e a retórica inadmissíveis" dos Estados Unidos e do Reino Unido.
"Consideramos o tom e a retórica dos representantes do Reino Unido e Estados Unidos inadmissíveis e, inclusive, suscetíveis de prejudicar nossas relações", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
O embaixador britânico Matthew Rycroft citou a possibilidade de levar a questão ao Tribunal Penal Internacional, competente para os crimes de guera. A última tentativa do Conselho de Segurança esbarrou no veto da Rússia.
No atual contexto, o apelo do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, para "acabar com o pesadelo" na Síria tem poucas possibilidades de ser ouvido esta semana.
Além disso, no terreno, 131 rebeldes e 119 familiares foram evacuados do último quartel em seu poder na cidade de Homs (centro). É a terceira evacuação desse tipo depois de um acordo de dezembro prevendo que esse setor passaria para controle do exército sírio em troca de levantar o cerco imposto três anos antes.
Cerca de 600 mil pessoas vivem sitiadas em toda a Síria, segundo a ONU.
Além disso, chegou uma ajuda no domingo pela primeira vez em seis meses a quatro localidades sitiadas: Madaya e Zabadani, cercadas por tropas do regime na província de Damasco, e Fua e Kafraya, pelos rebeldes em Idleb (Noroeste), segundo a Cruz Vermelha.
O conflito sírio provocou mais de 300 mil mortes desde 2011, segundo o OSDH, e resultou na maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial.