"Neste ano não veio um centavo para a compra de equipamentos e investimentos", explica Sidney Lourenço
"Neste ano não veio um centavo para a compra de equipamentos e investimentos", explica Sidney Lourenço | Foto: Marcos Zanutto



Equipamentos à espera de laboratório, professores temporários enquanto não há autorização para a contratação de efetivos, obras paradas... Esses são apenas alguns dos problemas enfrentados pelas universidades públicas em todo o País. Nas instituições federais do Paraná, promessas de recursos que não saíram do papel, cortes no repasse e contingenciamento do pouco que restou preocupam gestores e alunos da UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná), da UFPR (Universidade Federal do Paraná), da Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana) e do IFPR (Instituto Federal do Paraná).

No campus Londrina da UTFPR, os estudantes aguardam a construção de dois barracões para abrigar laboratórios dos cursos de engenharia. Há mais de um ano, um dos equipamentos permanece do lado de fora do prédio. A jateadora deveria ser utilizada para a limpeza e separação de materiais, mas está parada por falta de local adequado para funcionamento.

"O curso de engenharia química, por exemplo, requer muito aparato tecnológico. Hoje faltam laboratórios e equipamentos. Acredito que isso afeta a qualidade do curso porque não conseguimos fazer todas as atividades práticas. Não tem laboratório de engenharia química no campus e algumas matérias previstas para daqui um ano precisam desse espaço", lamentou a aluna Ana Luisa Trzeciak, do 3º ano de engenharia química.

Dos sete cursos ofertados no campus Londrina da UTFPR, três não receberam recursos prometidos pelo governo federal (engenharia mecânica, engenharia química e engenharia de produção). Os cursos foram iniciados recentemente em razão da demanda por engenharias identificada na região de Londrina. Conforme o diretor-geral da UTFPR Londrina, Sidney Alves Lourenço, um acordo entre os governos federal e estadual viabilizou, na época, a abertura dos cursos de forma gradativa.

Cerca de 700 alunos frequentam as três graduações e espaços adaptados são utilizados como laboratórios. "Temos tornos que foram comprados, mas ainda não foram ligados porque não estão no local adequado. Eles também precisam ir para esses barracões. Neste ano não veio um centavo para a compra de equipamentos e investimentos", afirmou o diretor-geral.

A construção dos laboratórios, no entanto, não depende apenas de recursos federais. Segundo Lourenço, o governo do Estado adquiriu terreno ao lado da sede da universidade para a construção dos espaços e iria repassar R$ 4 milhões. Porém, com a falta de recursos, o valor foi renegociado e ficou em R$ 2 milhões. O montante será utilizado na construção de dois barracões para laboratórios das engenharias mecânica e química. O projeto foi refeito e encaminhado à Seti (Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior). Outros R$ 2 milhões para a compra de equipamentos dependem do governo federal.

Já em relação às contratações, seriam necessárias 14 vagas para docentes no curso de engenharia química. "Se as vagas não forem abertas, vamos ter que fechar o curso. O que a gente faz enquanto isso é contratar temporários em cima de vagas de algum docente que saiu para fazer capacitação, por exemplo. Aí o departamento absorve a carga horária daquele docente. Na prática, o departamento acaba ficando sobrecarregado, mas é o que conseguimos fazer", justificou.

Em nota, a assessoria da Seti informou que "a versão final do projeto foi apresentada à secretaria somente no mês de agosto. A partir de agora, o projeto será analisado pela Unidade Gestora do Fundo Paraná. [...] Se estiver tudo certo, a expectativa é que a primeira parcela seja liberada ainda neste exercício".

ALTERNATIVAS
A UTFPR possui 13 campi no Estado. De acordo com o reitor da universidade no Paraná, Luiz Alberto Pilatti, o corte no orçamento destinado aos investimentos gira em torno de 40% a 50%, o que compromete o andamento das obras já programadas. "Passamos por um momento de dificuldade. Em algumas situações específicas estamos tendo que renegociar dívidas de compras que fizemos anteriormente", explicou.

Segundo o reitor, a redução no orçamento das verbas de custeio deve ficar em torno de 15%. Os problemas com o contingenciamento se arrastam há pelo menos três anos. No mesmo período, os custos aumentaram em razão da inflação. O orçamento de investimento que neste ano é de R$ 28 milhões já chegou a R$ 100 milhões há cinco anos, quando ainda havia o programa Reuni (Reestruturação e Expansão das Universidades Federais). "Para chegar até o final de 2017, nós dependemos de liberação integral do orçamento [de custeio]", destacou. Neste caso, o valor é de, aproximadamente, R$ 70 milhões.

UFPR revê contratos com terceirizadas
A redução no repasse de recursos federais refletiu em cortes de 10% a 20% nos contratos firmados entre a UFPR e as empresas terceirizadas responsáveis por manutenção, serviços gerais e vigilância nos campi. Campanhas internas foram promovidas para reduzir gastos com energia.

O orçamento destinado a investimentos caiu de R$ 30 milhões, em 2016, para R$ 22 milhões, em 2017. Desse total, R$ 15 milhões foram contingenciados, restando apenas R$ 7 milhões para o uso nos campi. Já o orçamento de custeio para manutenção sofreu corte de R$ 11 milhões e contingenciamento de R$ 15 milhões. O total disponibilizado é de R$ 136 milhões.

O ajuste do governo federal atinge até a receita própria da universidade com a limitação do uso dos recursos arrecadados pela UFPR. A medida também foi aplicada a outras federais. "Em alguns casos, o governo segura o valor contingenciado até dezembro. Daí diz: 'Agora pode gastar'. Isso em dezembro. Muitas vezes, pelas limitações que a instituição pública tem, ela não consegue gastar ou licitar os recursos a curto prazo", afirmou o reitor da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca. "Essas severas providências que tomamos não serão suficientes de fato para a universidade se manter funcionando até o final do ano. Se o governo não liberar o orçamento, a universidade não terá como pagar contas básicas", alertou.

Fonseca lamentou que os recursos destinados à ciência, tecnologia e ensino superior sejam tratados como meros gastos. "Deveriam ser considerados investimentos. A gente não vai ter, até do ponto de vista econômico, um salto efetivo no País se diminuir os gastos com ensino superior. Temos um Plano Nacional de Educação que prevê um avanço no ensino superior. A UFPR está em expansão em Jandaia do Sul, Palotina e Toledo, mas quando a gente faz uma pactuação para expansão, isso demanda recursos. No que diz respeito às expansões, o governo nos deve vagas docentes. Isso para todas as universidades", completou o reitor.

O IFPR também foi afetado pelo contingenciamento, mas os representantes preferiram não conceder entrevista para detalhar as dificuldades.

A Unila iniciou as atividades em 2010 e, desde então, funciona em imóveis alugados em Foz do Iguaçu (Oeste). Ao todo, três edifícios são utilizados como salas de aula, escritórios e almoxarifado. Um espaço no Parque Tecnológico de Itaipu também é destinado à Unila. A universidade bilíngue atende estudantes de 20 nacionalidades nos cursos de graduação e pós-graduação. "Precisamos resolver o problema da construção da infraestrutura, mas as verbas de investimento caíram drasticamente", explicou o reitor da Unila, Gustavo Vieira.

Nos últimos três anos, a universidade praticamente triplicou de tamanho, segundo Vieira. Alguns ajustes foram feitos para reduzir os custos de manutenção. "Estamos fazendo agora um estudo sobre redimensionamento dos espaços para conseguir liberar alguns imóveis alugados. Estamos tentando concentrar mais as nossas atividades para diminuir os custos operacionais", destacou. De acordo com o reitor, houve contingenciamento de 60% das verbas de investimento e 30% dos recursos de custeio.

As despesas têm sido pagas com atraso de, aproximadamente, um mês. A administração, conforme Vieira, prioriza a folha de pagamento dos funcionários, as bolsas destinadas aos alunos e a manutenção de serviços estratégicos. A falta do repasse previsto anteriormente adia a contratação de servidores, a construção de novos laboratórios e compromete a qualidade dos cursos. A reitoria também está preocupada com a possível evasão dos alunos diante da falta de investimentos e melhorias.

"Ainda nos faltam mais de 200 vagas para docentes e técnico-administrativos do que foi pactuado com o MEC. Essas vagas nos colocam um desafio muito grande quando não são abertas porque alguns cursos em implantação estão com muito pouco docente", lamentou. O orçamento previsto para o custeio é de R$ 36,3 milhões. Até agosto, o governo federal havia liberado R$ 27,3 milhões. Já as verbas de investimento, dos R$ 15,7 milhões, apenas R$ 6,2 milhões foram repassados à Unila. (V.C.)

Para MEC, instituições têm recursos
O MEC (Ministério da Educação) liberou, no início do mês, cerca de R$ 1 bilhão para as universidades federais. Com o contingenciamento, o governo federal estabeleceu limite de empenho de 85% para despesas de custeio das universidades federais e de 60% para as verbas de investimento. Até setembro, foram liberados 80% do orçamento de custeio e 50% dos recursos de investimento.

As informações foram repassadas pela assessoria de imprensa do MEC. Desde janeiro foram liberados R$ 5,2 bilhões em recursos financeiros e R$ 7,1 bilhões de limite para empenho de orçamento de todas as 63 universidades e 38 institutos federais. A assessoria ressaltou ainda que os primeiros cortes e contingenciamentos foram efetivados no governo anterior.

Já em relação às universidades do Paraná, o MEC exaltou os aumentos nos orçamentos da UFPR, da UTFPR e da Unila. Sobre os repasses destinados à UFPR, a assessoria informou que liberou neste ano mais de R$ 145 milhões, somando fontes do Tesouro e próprias. Para a UTFPR foram liberados mais de R$ 100 milhões. Já a Unila recebeu R$ 34,4 milhões. Conforme a assessoria, juntas as três universidades possuem, aproximadamente, R$ 50 milhões disponíveis para empenho das despesas de custeio e investimento. No entanto, conforme os representantes das universidades, diante da incerteza do recebimento total dos recursos, as instituições preferem agir com cautela, já que não é possível fazer um planejamento a médio prazo.

Segundo a nota encaminhada pelo MEC, a situação da Unila é mais complexa já que "a instituição foi concebida sem o consenso dos países vizinhos e a promessa aos estudantes de um diploma reconhecido automaticamente pelos países latino-americanos não se concretizou". A construção da universidade, orçada em quase R$ 1 bilhão, teve a obra paralisada em 2014 em razão de litígios contratuais. Para a conclusão seriam necessários R$ 682 milhões, recursos não disponíveis no momento. O MEC não comentou a situação do IFPR.(V.C.)