No núcleo regional da Seab em Londrina, a colheita de trigo está bem adiantada; até dia 12 de setembro, 81% dos 33,8 mil hectares (ha) já estavam colhidos
No núcleo regional da Seab em Londrina, a colheita de trigo está bem adiantada; até dia 12 de setembro, 81% dos 33,8 mil hectares (ha) já estavam colhidos | Foto: Fotos: Marcos Zanutto



Todo mundo já sabe os percalços que o trigo tem enfrentado nos últimos anos, principalmente quando se trata de preços baixos e concorrência com o produto importado. Mas pelo menos quando se pensa na colheita, a situação é positiva neste momento. O tempo bom faz com que o ritmo esteja acelerado nas lavouras, principalmente na região Norte do Estado. São duas realidades distintas: dentro da porteira, o trigo paranaense tem qualidade para atender a indústria e auxilia o produtor "agronomicamente" para a sequência da safra. Já na hora de comercializar é que a dor de cabeça começa. A reportagem da FOLHA traz esses dois lados da moeda.

De acordo com o Deral (Departamento de Economia Rural) da Seab (Secretaria de Agricultura), até o dia 12 de setembro, 33% da safra havia sido colhida. O número é bem superior ao 19% da mesma data do ano passado. "Em outros anos, neste mesmo período, já chegamos a ter 46% da área colhida. Mas de qualquer forma, a nossa avaliação é que o tempo está ajudando bastante", explica o engenheiro agrônomo da entidade, Carlos Hugo Godinho.

O tempo seco que auxilia agora é o mesmo que foi vilão da safra nos meses anteriores e se tornou responsável pela quebra de produção da cultura, numa estiagem que durou de 45 a 60 dias. Na área de 962,5 mil hectares (já reduzida em 12% comparada ao ano passado) a expectativa é de uma colheita de 2,59 milhões de toneladas, uma retração de 26% até o momento. "Este número é relativo a agosto, mas tivemos mais 13 dias de seca e temos certeza que será pior no próximo levantamento. A princípio, a região mais afetada foi o Norte, mas a seca recente pegou o Sul também. Uma situação similar em todo o Paraná."

E nem mesmo a quebra de safra foi capaz de fazer os preços melhorarem. Godinho explica que a expectativa de produção de trigo na Rússia, que pode colocar no mercado mundial aproximadamente 30 milhões de toneladas, pressiona os valores. Além disso, tem a Argentina, com safra ainda em desenvolvimento. "Precavido com a possibilidade de faltar trigo por aqui, a importação aumentou, ainda mais com preços convidativos. Mais uma vez, vamos trabalhar com comercialização abaixo dos custos de produção, que estamos estimando na casa dos R$ 38."

Mais do que esse cenário já batido, Godinho levanta uma preocupação ainda maior aos produtores. Nos últimos tempos, com preços pressionados, as safras de verão não estão remunerando tão bem assim para saldar os números vermelhos recorrentes do inverno. "A safra de verão, digamos, sempre foi a salvação da lavoura. Antes, não era necessário uma rentabilidade tão grande com as culturas de inverno, olhava-se mais para os aspectos técnicos. Nem a safra colhida de verão como a que estão por vir estão com valores em patamares altos, principalmente quando se trata da soja. Os valores continuarão pressionados."

No total, a expectativa é que safra 2016/17 feche com um volume de 40 milhões de toneladas, uma retração de 5% frente aos 42 milhões esperados anteriormente. Tudo isso caso não haja mais algum evento climático sobre as lavouras de trigo do Centro-Sul, que estão em estágios de floração e frutificação.

Sérgio Komura reduziu a área de plantio: "O preço de fato não remunera e acabamos partindo para a adubação verde ou milho safrinha"
Sérgio Komura reduziu a área de plantio: "O preço de fato não remunera e acabamos partindo para a adubação verde ou milho safrinha"



Economicamente é desanimador, reclamam produtores
No núcleo regional de Londrina, a colheita de trigo está bem adiantada. Até o dia 12 de setembro, 81% dos 33,8 mil hectares (ha) já estavam colhidos. O que se constata na região, de forma geral, são produtividades oscilantes, alguns locais que sofreram com veranicos, um pouco de geada e outras passando de forma ilesa. No geral, os produtores mostram desânimo com a cultura, que perde força e área safra após safra.

Eucler Alcântara Ferreira há quatro anos plantava 500 alqueires de trigo. O cenário desanimador do mercado fez com que ele diminuísse a área, que hoje totaliza 135 alqueires distribuídos por vários lotes em Tamarana. Até o momento, ele colheu 50 alqueires de um trigo que plantou em meados de abril e ficou contente com a produtividade de 160 sacas por alqueire. "Foi melhor do que eu esperava. Minha área é muito bem cuidada, fazemos agricultura de precisão e trabalhamos com esterco de galinha no solo".

Outro ponto que acha que foi fundamental nesta safra atual foi o plantio do cereal em cima da palhada do milho, o que, segundo ele, auxiliou na conservação da umidade do solo e ajudou contra a seca que atingiu a região. "Nas outras áreas, acho que vou fechar com médias menores, na casa de 140 a 145 sacas por alqueire. Pelo menos, meu custo de produção ficou em 120 sacas por alqueire", calcula ele.

Ferreira fica desanimado, entretanto, quando o assunto é a comercialização. Ele vendeu seu produto em média a R$ 33 a saca. "Há 10 anos, me lembro de estar vendendo a R$ 40. O preço do pãozinho subiu muito nesse período, mas o produtor não viu esse repasse. O que percebemos é o governo autorizando cada vez mais a entrada do trigo importado e deixando nosso produto escanteado. Os compradores se abastecem do que vem de fora. É triste porque se trata de uma cultura importante, principalmente nas regiões mais frias. Hoje confesso que planto mais para não perder a habilidade de manejo sobre a cultura, porque economicamente é desanimador".

Para ele, com safra de inverno remunerando pouco e a de verão com pressão de preços da soja e milho para baixo, a situação do produtor fica complicada. "Antes, a gente tinha gordura para queimar porque os valores da soja estavam lá em cima. Agora, precisamos nos profissionalizar cada vez mais e diminuir nossas margens de erro".

Também em Tamarana, o produtor Sérgio Komura plantou uma área de 310 alqueires da cultura. Ele colheu esta semana uma média 150 sacas por alqueire. "O que plantei em meados de abril, peguei um pouco de geada. Agora, o que vou colher mais para o final de setembro, bem provavelmente sofreu mais com aquela seca prolongada".

Komura relembra que há sete anos dedicava 100% da sua área para a cultura. "Ano passado foram mil hectares (413 alqueires) e agora 750 hectares (310 alqueires). O preço de fato não remunera e acabamos partindo para a adubação verde ou milho safrinha. Mas por uma limitação climática, não dá pra plantar milho em toda a área".

No final das contas, pelo investimento em tecnologia, Komura gostaria de ter atingido produtividades maiores para que o negócio valesse a pena. "Em relação a doença foi mais tranquilo pelo clima seco, mas acabamos pegando uma geada e dois veranicos. No final, ainda consegui fechar a venda a R$ 38 a saca".