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O Leão
O circo chegou na cidade. Minha infância foi em um lindo sitiozinho próximo a um vilarejo. Era uma linda propriedade, pequena, mas que tinha na cabeceira um cafezal, logo abaixo um "palhada" (até hoje não sei porque esse nome), onde meus pais plantavam milho pipoca, vassouras, abóboras e mandioca.
A casa era de madeira e muito grande, pois nossa família era numerosa. A varanda era no alto, com a cadeira preguiçosa do meu velho pai. A seguir, uma grande sala com um corredor que passava pelos vários quartos. No final, a grande cozinha, com fogão a lenha, que nos dias frios nos aqueciam. Ah, o guarda-comida onde eram guardados os "trens" da cozinha e que cada final de ano recebia uma demão de tinta. Cada ano era pintado de uma cor diferente pelo nosso pai, o que deixava minha mãe feliz. Nos fundos tinha a horta, e um pequeno pasto onde ficava a mula "calçada" e duas vaquinhas para o leite. Muitas galinhas no quintal. Nos fundos, o rio do salto que era nossa diversão nos dias quente.
Certa manhã, com meus 11 anos, amanheci com muita febre e dor de garganta. Apesar dos remédios caseiros da mãe, não melhorei, o que fez meu pai me levar ao hospitalzinho do doutor Santos, um velho e competente médico. Após me examinar, pediu à "enfermeira" Cici, uma moça loirinha, para me aplicar uma injeção. Veio a Cici com uma injeção branca parecendo leite e muito dolorosa. Após a medicação, pediu para que ficássemos na sala de espera para ver se não teria reação. Sentamos, com mais outros pacientes, muitos deles amigos de meu pai. Para surpresa de todos, entrou pelo portão do hospital, um leão do circo preso a uma corrente sendo segurado por homens do circo. Os leões, e eram dois no circo, brigaram e um deles foi ferido no lombo e no rabo. Como na cidade não tinha veterinário, levaram para o doutor Santos. Houve muita conversa, pois o velho médico recusava a atender o "paciente" leão.
No final das contas, o velho médico aceitou a atender o "animalzinho", mas que era bem grande. Sei que na sala de sutura, prenderam a cabeça do leão na porta e os homens do circo seguram. Logo que o doutor Santos começou seu trabalho, o leão soltou um grande urro, que ecoou hospital a dentro. Foi um alvoroço só, pois todos correram, inclusive os pacientes que estavam internados, com seus frascos de soro na mão. Acredito que pela competência do doutor Santos o leão não ficou rabicó.

Sidney Girotto é leitor da FOLHA