É preciso debater a importância de considerar a semente como matéria-prima primordial de um mercado de escala cada vez mais competitivo e com novas tecnologias
É preciso debater a importância de considerar a semente como matéria-prima primordial de um mercado de escala cada vez mais competitivo e com novas tecnologias | Foto: Fotos: Anderson Coelho



Produzir sementes de soja de qualidade depende de manejo adequado do solo, tratamento contra doenças, colheita sem danos mecânicos, beneficiamento, secagem, limpeza de impurezas, classificação e separação por peso e forma. Ainda, é necessário fazer o resfriamento do grão e a armazenagem em condições ideais de umidade e temperatura. O serviço é especializado e exige equipamentos avançados, a um preço de 5% a 10% do custo total do agricultor no campo. Mesmo assim, há quem prefira arriscar a compra de produtos piratas ou tentar guardar parte do que plantou para o ano seguinte, o que coloca em risco as próprias metas de ampliação de produtividade.

O exemplo pode ser aplicado às tantas outras culturas que usam transgenia ou melhoramento de sementes, como milho, forrageiras, hortaliças, o trigo ou o algodão. Também não se trata de fazer a defesa do comércio de insumos ou de questionar a liberdade do agricultor de reservar, a cada safra, uma parte da própria produção para semeadura no ciclo seguinte, algo garantido por lei. É preciso, entretanto, debater a importância de considerar a semente como matéria-prima primordial de um mercado de escala, cada vez mais competitivo e com novas tecnologias lançadas a cada ano.

Imagem ilustrativa da imagem No princípio está a semente



Na safra 2016/17, o custo médio com sementes de soja por hectare representa 5% do total para a soja RR1 e de 10,8% para a RR2 PRO, conforme a Circular Técnica 126 da Embrapa Soja, divulgada em janeiro deste ano e que leva em consideração a microrregião de Campo Mourão. O levantamento aponta uma renda mediana de R$ 4,1 mil a um custo de R$ 2,7 mil, quando considerada uma produtividade de 3,5 toneladas por hectare e um valor de R$ 70 por saca.

Apesar do gasto mínimo de 5% do custo total, 30% das sementes vendidas no País são piratas, de acordo com a Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem). "É a pior economia que o indivíduo pode fazer. Se parar para pensar no valor agregado da terra, custo do adubo, amortização do maquinário, trabalho do preparo, químicos que terá de aplicar como inseticida, fungicida, herbicida, despesas de colheita, transporte e armazenamento na cooperativa, o custo da semente é baixo", diz o presidente da Associação Brasileira de Tecnologia de Sementes (Abrates), Francisco Carlos Krzyzanowski. "É falta de informação comprar o falsificado", completa.

Conforme a Abrasem, o custo do produto pirata gira em torno da metade do original, mas nem sempre atinge a germinação mínima estipulada por lei, de 80%. Para Krzyzanowski, comprar o grão original para o plantio funciona até como uma garantia. "É como um seguro e muito barato, porque você tem para quem reclamar. Se der um revés e a semente foi a causa, a empresa fornecedora, além de pagar pelo prejuízo do produtor, paga sobre o lucro cessante, conforme o Código do Consumidor."

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Dor no bolso

A conta por pagar barato na semente pirata chega na hora da entrega do produto. Como 94% da soja e 85% do milho semeados no País são transgênicos, um teste rápido feito por fiscais mostra se os grãos são de determinada variedade ou empresa. Assim, a cobrança pelos royalties que não foi feita na saca para o plantio é feita depois.

Esse, no entanto, não é o maior risco para o agricultor. O pesquisador em tecnologia de sementes José de Barros França Neto, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Soja, afirma que os produtos originais são certificados de primeira ou segunda geração (C1 e C2), ou são fiscalizados e com origem nas certificadas (S1 e S2). Sem os selos, é difícil ter a garantia de produtividade. "Se a pessoa planta com mistura varietal, pode perder produtividade", diz. "Não é produzir o grão, limpar e pôr no saco que vai germinar, então quem compra pirata compra lixo", completa.



Quando o desenvolvimento da planta não avança, começam os problemas. É preciso correr para fazer nova semeadura, com atraso, o que muitas vezes significa não encontrar mais a variedade que se queria no mercado. "Replantio é a pior coisa, porque não se sabe se tem de adubar de novo, se choveu e o potássio desceu, se preciso colocar mais herbicida com risco de a dosagem superior prejudicar a germinação", diz Krzyzanowski. "Ele perde tempo, dinheiro, adubo, herbicida, e, se estabeleceu uma meta de 4,2 mil quilos por hectare, mas colhe 3 mil quilos, talvez só empate pelos gastos", explica.

Motivos que levam França a afirmar que não considera mais a semente como um insumo. "Pensava assim até alguns anos atrás, mas hoje enxergo como matéria-prima. A semente de qualidade é a que estabelece todas as demais atividades da lavoura."