Imagem ilustrativa da imagem Café especial (e que transforma)
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O que já foi símbolo de uma época de ouro da agricultura paranaense, "apanhou" muito nas últimas décadas. Escanteado, o café perdeu espaço para outras culturas safra após safra, mas - em meio a tantos problemas vivenciados – sempre existe espaço para transformação, mudança de cenário. O projeto de Cafés Especiais do Norte Pioneiro, lançado em 2006 pelo Sebrae/PR, é a prova de que a cultura não morreu no Estado e, em pouco mais de uma década, elevou para outro nível a qualidade do produto, além da mentalidade e a rentabilidade do produtores. Ações importantes que potencializaram os valores do café commodity e colocaram lotes de cafés especiais produzidos aqui para o mundo todo.

A safra 2016/17 do café do Paraná já está finalizada. Em 46 mil hectares, foram colhidas 68,5 mil toneladas, aproximadamente 12% a mais do que a anterior. Praticamente toda a produção vem da região Norte, sendo que 8% a 10% deste volume é ligado aos 200 produtores do Norte Pioneiro que atuam no projeto do Sebrae. Na próxima semana, entre os dias 4 e 6 de outubro, cafeicultores, especialistas e indústria estarão reunidos na 10ª Feira Internacional de Cafés Especiais do Norte Pioneiro (Ficafé), em Jacarezinho, com o objetivo de divulgar a qualidade do café produzido na região. Compradores do mundo – por meio de trades – vão estar na cidade para adquirir lotes cujos valores podem chegar a R$ 4 mil por saca.

Nos últimos anos foram muitas conquistas que colocaram o Norte Pioneiro em outro patamar quando se trata de cafés especiais: registro de Indicação Geográfica de Procedência, certificações internacionais, criação de associações e cooperativa, fomento de exportações para outros Países (Fairtrade), entre outras inovações técnicas. "Em 2006, quando iniciamos, o maior problema era o reconhecimento como produtores de cafés diferenciados. Na época, se vendia as sacas para Minas Gerais e só por estar lá o produto já valorizava 30%. Isso não acontece mais para o nosso produto commodity. Já é um ganho importante que conquistamos", explica o consultor do Sebrae/PR e gestor do projeto, Odemir Capello.



FORÇAS E GARGALOS
Agora, para Capello, é momento de fomentar o manejo do café cereja descascado (CD), deixando de lado o tradicional terreiro e utilizando maquinário específico. Muitos, inclusive, estão comprando os equipamentos em conjunto ou mesmo alugando. "Na minha opinião, o CD é que vai dizer se o projeto segue ou não na região. Como se trata de um processo todo mecânico, isso mitiga o problema de perda de qualidade em 90%. É uma tecnologia que buscamos na Costa Rica em 2013, adaptamos a baixo custo, já que temos um fator climático recorrente de chuva na colheita, o que interfere demais na qualidade final do café."

Hoje, mais consolidado, o consultor elenca fatores conquistados que fazem toda a diferença para o projeto: visibilidade, mercado, rastreabilidade e processos associativos em diversas cidades, além de uma cooperativa. "Hoje temos a Acenpp (Associação dos Cafés Especiais do Norte Pioneiro do Paraná), que forma de fazer a representatividade do produto e a Cocenpp (Cooperativa), que surgiu como um braço da comercialização dos cafés. Estamos falando de pequenos produtores, que se não tiverem inseridos em processos associativos eficientes, não conseguem ter pesquisa disponível, formar lotes, conseguir crédito ou assistência técnica."

Entre os gargalos, Capello cita que deveria haver mais fomento da pesquisa para atender especificidades da região e também formar mais "Q-Graders", profissionais que avaliam a qualidade do café. "Hoje, precisamos chamar profissionais de fora para fazer a prova do café. Um dos problemas é que quem compra nosso produto muitas vezes conhece ele mais do que nós mesmos".

Edson Messias de Carvalho, de Joaquim Távora, não esconde a satisfação com os resultados do cereja descascado
Edson Messias de Carvalho, de Joaquim Távora, não esconde a satisfação com os resultados do cereja descascado



Diversificação e melhorias no manejo
A força do café na região está muitas vezes atrelada na diversificação de culturas para garantir um suporte financeiro aos produtores em pequenas propriedades. Essa é uma estratégia fomentada pela Emater, que atende 22 municípios e possui técnicos em 12 deles, nos locais onde a produção está mais concentrada, como Santo Antônio da Platina, Joaquim Távora, Siqueira Campo, Tomazina, Ibaiti, Curiúva e Carlópolis, cidade com a maior produção do Estado: 6 mil hectares, 800 produtores e uma safra em média com 180 mil sacas anuais.

O coordenador dos trabalhos da Emater no Norte Pioneiro, Otávio Oliveira da Luz, explica que ao contrário do restante do Estado, a área para café tem permanecido sem decréscimo na região nos últimos anos. "Como estamos falando de pequenas propriedades, soja e cana não entraram muito aqui e o pessoal diversificou o café com a fruticultura e gado de corte, o que dá uma estabilidade financeira importante a eles."

Quando se trata da evolução da produtividade do café, os resultados em algumas cidades são bem significativos. Na regional de Jacarezinho, onde está a maior área (26,3 mil ha), o salto foi de 1.465 kg/ha para 1.703 kg/ha, elevação de 16% comparando as últimas duas safras. A média paranaense ficou em 1.577 kg/ha "Em Carlópolis, por exemplo, já estamos encostando em 30 sacos beneficiados por ha, acima da média estadual de 25 sacos/ha. Sem falar que estamos sempre entre os finalistas do Concurso Estadual Café Qualidade."

Dentre as estratégias da extensão rural, está um trabalho forte para recuperação da fertilidade de solo tanto em ordem física como biológica, uso de variedades melhoradas e resistentes, além de um bom trato na lavoura. "Hoje estamos falando de cinco mil plantas por hectare. Há 20 anos, não passava de 1500 plantas/ha. Adensamos mais e, com a melhoria de solo, tivemos um incremento na qualidade."

Outro ponto bastante positivo que tem ocorrido é o fomento da colheita mecanizada e seletiva em áreas que existe essa possibilidade técnica. Em Carlópolis, 70% a 80% já é feita dessa forma, com máquinas grandes e regulada para colher baixa taxa de frutos verdes, que não são apropriados para a qualidade. "Quando não temos as máquinas, alugamos, o custo cai e podemos fazer lotes de qualidade. Na pequena propriedade, focamos na coleta seletiva manual, do café mais maduro."

Aliás, a Emater tem fomentado as mulheres a fazerem nanolotes de café qualidade (meia saca), colhido manualmente, secado de maneira bem fina no terreiro e assim participar de um "cup" de comercialização, na sede do Iapar em Londrina, no início do mês de outubro. "Já temos mais de 70 nanolotes que serão degustados, pontuados e comercializados."

Entre os gargalos produtivos, Luz ainda cita, no quesito manejo, uma estrutura ruim de pós-colheita em diversas propriedades. Após colher o café no momento certo, muitas vezes falta um terreiro no tamanho certo, lavador, descascador e secador disponíveis. Outra situação é encontrar compradores que valorizem a qualidade dos cafés produzidos. "Não adianta fazer qualidade e vender a preço de commodity. Quem está na Acenpp e Cocenpp, que é a minoria dos produtores, não sofre tanto com isso. Um mercado justo para qualidade capitaliza o cafeicultor, que se anima a fazer mais. Melhorou bastante, mas ainda tem muito para evoluir."