Pesquisadores do Laboratório de Ciências Atmosféricas (LCA) da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) desenvolveram um sensor de raios atmosféricos que antecipa em praticamente 15 minutos o alerta para situações de risco. A novidade traz mais segurança para operação de empresas que realizam muitos trabalhos externos, como mineradoras e portos, e para a população em geral, já que o Brasil é líder mundial em incidência de raios e em acidentes relacionados a eles.

O equipamento tem a capacidade de medir a atividade elétrica e as alterações ocorridas nas nuvens e transmitir as informações via rádio até um ponto remoto. A localização é definida através da captação de sinais de satélite por um aparelho de GPS. Em relação a outros sensores encontrados no mercado, ele se diferencia por fazer a medição dos riscos antes do início das tempestades.

A novidade impressiona não só por sua importância, mas pela simplicidade da maior parte dos materiais utilizados. O sensor foi construído sobre uma base de alumínio formada por uma leiteira encontrada em supermercados, além de componentes eletrônicos obtidos por meio da reciclagem de HDs e outros equipamentos de informática.

"Tivemos financiamento do CNPQ para o projeto, mas o cilindro de alumínio é caríssimo. Um dia, passando por uma rua com várias lojas de panelas e objetos similares, vi pendurada uma leiteira de alumínio. Comprei dez leiteiras para testar e o resultado foi excelente", conta o físico Moacir Lacerda, um dos responsáveis pelo projeto.

A utilização da leiteira e de lixo eletrônico para boa parte dos componentes também ajudou a baratear o projeto. Lacerda conta que, apesar de entrar rapidamente em desuso, os hardwares (como são chamadas as partes físicas dos computadores) são feitos com materiais de ótima qualidade e duradouros.

A partir da captação da atividade elétrica das nuvens pelo sensor, um software organiza as informações e classifica o risco de raios entre baixo, médio e elevado. Além de ser usado no início das tempestades, o equipamento aponta quando a atividade elétrica cessa.

"Esta é outra parte importante: quando é que os riscos de raios terminam e os funcionários de uma determinada empresa podem voltar a campo, por exemplo? O sensor faz essa medição e indica quando a atividade elétrica volta a zero", explica o físico.

O aparelho já está na segunda geração e passa por negociação com empresas privadas para produção em escala comercial, com preço estimado entre US$ 5 mil e US$ 10 mil.

O físico Moacir Lacerda: aparelho foi construído sobre uma base de alumínio formada por uma leiteira encontrada em supermercado
O físico Moacir Lacerda: aparelho foi construído sobre uma base de alumínio formada por uma leiteira encontrada em supermercado | Foto: Anderson Coelho



País é recordista em incidência de raios
Devido à dimensão geográfica e clima tropical, com alta incidência de chuvas e tempestades, o Brasil é o país que registra maior quantidade de incidência de raios no mundo. São aproximadamente 50 milhões de descargas elétricas por ano, responsáveis por 1.790 mortes entre 2000 e 2014, o equivalente a aproximadamente 120 óbitos por ano.

No Mato Grosso do Sul, onde foi criado o novo sensor de raios, há registro de aproximadamente 16 raios por km2. Para efeito de comparação, na Europa há registro de um raio para cada 2km2 – quantidade 32 vezes menor.

Em razão dos riscos, a novidade foi logo utilizada para criar uma rede de monitoramento na capital Campo Grande. Em parceria com escolas de ensino médio, a UFMS instalou cinco sensores na cidade cujo monitoramento conta com auxílio dos próprios estudantes, dentro das aulas de ciências. Os Observadores Meteorológicos Mirins, como passaram a ser chamados, conhecem em detalhes os equipamentos por meio de demonstrações e capacitações práticas.

A partir do momento em que o sensor detecta alto risco de raios, o alerta é emitido para todo o estado pelo Centro Meteorológico do Mato Grosso do Sul. "Além de produzir rápida circulação da informação para diminuir risco de acidentes, o projeto cria forte estímulo aos alunos do ensino médio que têm inclinação para a área", explica o físico Moacir Lacerda. O projeto dos Observadores Mirins foi financiado por meio de um edital do Ministério da Educação (MEC). (F.C.)