Sensor de raios feito com materiais reciclados
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sexta-feira, 17 de março de 2017
Fábio Cavazotti<br>Especial para a FOLHA
Pesquisadores do Laboratório de Ciências Atmosféricas (LCA) da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) desenvolveram um sensor de raios atmosféricos que antecipa em praticamente 15 minutos o alerta para situações de risco. A novidade traz mais segurança para operação de empresas que realizam muitos trabalhos externos, como mineradoras e portos, e para a população em geral, já que o Brasil é líder mundial em incidência de raios e em acidentes relacionados a eles.
O equipamento tem a capacidade de medir a atividade elétrica e as alterações ocorridas nas nuvens e transmitir as informações via rádio até um ponto remoto. A localização é definida através da captação de sinais de satélite por um aparelho de GPS. Em relação a outros sensores encontrados no mercado, ele se diferencia por fazer a medição dos riscos antes do início das tempestades.
A novidade impressiona não só por sua importância, mas pela simplicidade da maior parte dos materiais utilizados. O sensor foi construído sobre uma base de alumínio formada por uma leiteira encontrada em supermercados, além de componentes eletrônicos obtidos por meio da reciclagem de HDs e outros equipamentos de informática.
"Tivemos financiamento do CNPQ para o projeto, mas o cilindro de alumínio é caríssimo. Um dia, passando por uma rua com várias lojas de panelas e objetos similares, vi pendurada uma leiteira de alumínio. Comprei dez leiteiras para testar e o resultado foi excelente", conta o físico Moacir Lacerda, um dos responsáveis pelo projeto.
A utilização da leiteira e de lixo eletrônico para boa parte dos componentes também ajudou a baratear o projeto. Lacerda conta que, apesar de entrar rapidamente em desuso, os hardwares (como são chamadas as partes físicas dos computadores) são feitos com materiais de ótima qualidade e duradouros.
A partir da captação da atividade elétrica das nuvens pelo sensor, um software organiza as informações e classifica o risco de raios entre baixo, médio e elevado. Além de ser usado no início das tempestades, o equipamento aponta quando a atividade elétrica cessa.
"Esta é outra parte importante: quando é que os riscos de raios terminam e os funcionários de uma determinada empresa podem voltar a campo, por exemplo? O sensor faz essa medição e indica quando a atividade elétrica volta a zero", explica o físico.
O aparelho já está na segunda geração e passa por negociação com empresas privadas para produção em escala comercial, com preço estimado entre US$ 5 mil e US$ 10 mil.
País é recordista em incidência de raios
Devido à dimensão geográfica e clima tropical, com alta incidência de chuvas e tempestades, o Brasil é o país que registra maior quantidade de incidência de raios no mundo. São aproximadamente 50 milhões de descargas elétricas por ano, responsáveis por 1.790 mortes entre 2000 e 2014, o equivalente a aproximadamente 120 óbitos por ano.
No Mato Grosso do Sul, onde foi criado o novo sensor de raios, há registro de aproximadamente 16 raios por km2. Para efeito de comparação, na Europa há registro de um raio para cada 2km2 quantidade 32 vezes menor.
Em razão dos riscos, a novidade foi logo utilizada para criar uma rede de monitoramento na capital Campo Grande. Em parceria com escolas de ensino médio, a UFMS instalou cinco sensores na cidade cujo monitoramento conta com auxílio dos próprios estudantes, dentro das aulas de ciências. Os Observadores Meteorológicos Mirins, como passaram a ser chamados, conhecem em detalhes os equipamentos por meio de demonstrações e capacitações práticas.
A partir do momento em que o sensor detecta alto risco de raios, o alerta é emitido para todo o estado pelo Centro Meteorológico do Mato Grosso do Sul. "Além de produzir rápida circulação da informação para diminuir risco de acidentes, o projeto cria forte estímulo aos alunos do ensino médio que têm inclinação para a área", explica o físico Moacir Lacerda. O projeto dos Observadores Mirins foi financiado por meio de um edital do Ministério da Educação (MEC). (F.C.)