A atriz e cantora Sophia Abrahão foi atacada nas redes sociais depois que cortou os cabelos no estilo "joãozinho"
A atriz e cantora Sophia Abrahão foi atacada nas redes sociais depois que cortou os cabelos no estilo "joãozinho" | Foto: Gshow -Carol Caminha/Divulgação



Cabelo e maquiagem são algumas maneiras de uma mulher mostrar seu estilo. Em pleno 2017 imaginamos que cortes de cabelo e cores de batom sejam algo de livre escolha feminina, porém, não é o que acontece. Há quase um ano a atriz e cantora Sophia Abrahão foi atacada nas redes sociais depois que cortou os cabelos no estilo "joãozinho".

"Cara de homem" e "parece uma 'sapatão'" foram algumas das postagens que a levaram a se posicionar: "Se o comentário fosse só para falar que está feio, não teria problema algum, cada um tem o seu gosto. Mas dizer que 'tá' feio porque parece uma 'sapatão'? Que tipo de gente é essa????", twitou.

No dia a dia podemos não ser ofendidas de forma tão ostensiva, mas muitas mulheres se privam de usar cabelo, maquiagem, roupas ou esmaltes de determinadas cores ou modelos por causa da opinião do companheiro ou dos filhos.

Coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero da UFPR e professora do programa de pós-graduação em sociologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Marlene Tamanini conta que o comprimento do cabelo e as cores da maquiagem tiveram diferentes significados ao longo dos anos e ainda hoje podem sofrer determinadas regras de acordo com a profissão. Porém, não há mais razão para um marido ou namorado querer ditar como a mulher deve se arrumar.

"(Isso) Tem a característica da dominação. Ele acha que ela vai ser linda para ele a vida inteira, mas vão vir o trabalho, os filhos e ela não vai dar conta de ser para sempre quem ele imaginou. Quando a mulher aceita esse tipo de atitude (é porque) vê como proteção e amor, mas não é. Essa é uma forma de empoderamento masculino, que começa pelo controle do corpo, do cabelo, da amamentação, do útero. Isso vai se reproduzindo ao longo dos tempos, com outras caras", alerta.

História
Marlene conta que, a depender do contexto, ter o cabelo comprido está associado à feminilidade e por isso usá-lo curto pode trazer diversas conotações. "Nas religiões pentecostais o cabelo comprido é associado ao sagrado, à pureza e visto como um manto. Já nos conventos cortar o cabelo significa esquecer de si, não ser atrativo para o outro. O cabelo curto também foi usado nas cortes como forma de higiene por causa de parasitas e neste caso somente os ricos podiam comprar perucas", explica.

De acordo com a professora, é seguindo o raciocínio de que o cabelo comprido representa feminilidade que mulheres são punidas com o corte de cabelo durante brigas com as rivais ou por problemas com criminosos. "Se a mulher se sente bonita com o cabelo comprido, ela se sentirá profundamente agredida com o corte do cabelo. A mulher que corta o cabelo da outra quando briga compartilha da representação masculina, de que a mulher 'natural', tem o cabelo comprido. A mulher que usa o cabelo curto, frente à masculinidade hegemônica, se torna menos desejada. Meninas que se tornam empoderadas com o cabelo comprido podem competir entre si para saber quem tem o cabelo mais bonito. Atrás disso tem um comportamento machista", diz Marlene.

‘A ideia de pintar a cara não era bem vista’

Assim como os cortes de cabelo, a maquiagem também passou por mudanças ao longo dos anos e de forma geral, apenas recentemente as mulheres passaram a usar mais batons vermelhos e outras cores tidas como "chamativas".

"Se voltarmos a 1930, 1940 e 1950, o ditado era 'quem muito a cara pinta, não tem moral'. A ideia de pintar a cara não era bem vista. As mulheres nascidas em boas famílias, com posses, pregavam pela pureza e a maquiagem mais forte era restrita às prostitutas. As atrizes também eram vistas como mulheres 'disponíveis'. Se a mulher se pintasse de outra forma não seria possível saber a fronteira entre aquela 'para casar' e aquela para 'vários homens'. Por isso as mulheres tidas de boas famílias usavam maquiagem em cores mais angelicais, transmitindo assim a ideia de pureza, de boas intenções, de mãe dedicada", explica Marlene Tamanini, coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero da UFPR.

Ela lembra que ainda hoje muitas mulheres se pautam por um código social ligado à determinadas profissões e por isso também não podem exagerar na maquiagem, porém, nos ambientes mais informais têm total liberdade para ousar nas cores. "Por outro lado temos também as mulheres que não querem usar nada, elas são livres de se maquiar se e como estiverem com vontade, porque para suas profissões não faz diferença."