O pão é vilão das rotinas saudáveis? Muitas pessoas o excluem da dieta, outros o substituem. No entanto, bem quentinho, saindo do forno, ver a manteiga derretendo na massa... A cena deixa qualquer um com água na boca. Mas tem jeito de consumir o pão sem prejuízos para a saúde?

Julianna Marias Vagula, coordenadora do curso de nutrição da Unopar EAD, afirma que sim, é possível comer pão e ser feliz. Considerado vilão nas dietas, o alimento ganhou a má fama por conta dos exageros. "A tendência das pessoas é diminuir o número das refeições para trocar por lanches, essa troca faz com que a quantidade de calorias e tipo de dieta fiquem muito monótonas. Mas se você colocar um pão em uma refeição durante teu dia, qual é o problema?", ameniza.

Por isso, Vagula explica que a quantidade é que interfere na saúde. "Por exemplo, vamos pegar o pão francês, ele tem a farinha de trigo branca, a taxa de índice glicêmico é alta, se for consumir duas vezes por dia o índice vai ficar mais alto. Esse é o problema, faz com que a pessoa, logo em seguida, tenha fome de novo, porque é absorvido rapidamente", explica. Já o pão integral reduz o índice glicêmico e possui mais nutrientes. "Você não vê um pão integral só com farinha integral, normalmente ele tem alguma castanha", afirma.

O Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, explica que pães são considerados alimentos processados, por isso o consumo deve ser limitado, "em pequenas quantidades, como ingredientes de preparações culinárias ou como parte de refeições baseadas em alimentos in natura ou minimamente processados". O Guia orienta a consulta de rótulos dos produtos, preferindo os que têm menor teor de sal ou açúcar.

Doença celíaca
Vagula explica que a doença celíaca é a "condição inflamatória resultante de uma resposta do sistema imunológico que afeta o intestino delgado. Isso acontece quando a pessoa consome: trigo, centeio, cevada e aveia. É errado falar intolerância ao glúten porque afeta o sistema imunológico", explica.

De acordo com a nutricionista, é necessário um diagnóstico muito sério para saber se a pessoa tem a doença e que o tratamento é a exclusão total desses ingredientes. "As pessoas que têm doença celíaca não podem de forma alguma consumir o glúten e têm que estar atentas para não correr o risco de contaminação cruzada", alerta. Por isso, há leis federais que obrigam a inscrição no rótulo, assim como leis para a rotulagem de alimentos alergênicos e principais requisitos que podem causar alergia.

Atualmente, com o compartilhamento de informações, muitos celíacos encontraram formas de desenvolverem suas receitas, trocando a farinha de trigo por fécula de batata ou farinha de arroz, por exemplo. Por isso, é possível continuar consumindo pão, desde que seja sem glúten.

Ao mesmo tempo, a nutricionista alerta que para quem não tem restrição, não há necessidade da exclusão do glúten. "Há a informação errada de que o glúten faz mal e surgiu essa exclusão sem a necessidade. Pra quem não tem restrição, a farinha é uma propriedade importante, é uma fonte de energia", finaliza.

O pão proibido

Sandra e Ronaldo Silva com o filho Guilherme, 13: família unida para desenvolver pães sem glúten de qualidade. Veja vídeo utilizando a tecnologia da Realidade Aumentada
Sandra e Ronaldo Silva com o filho Guilherme, 13: família unida para desenvolver pães sem glúten de qualidade. Veja vídeo utilizando a tecnologia da Realidade Aumentada | Foto: Marcos Zanutto



Foi por meio de uma reportagem na televisão que Sandra Silva pensou na possibilidade de ter uma doença cujos médicos ainda não tinham descoberto. Sozinha, pesquisou mais sobre o universo dos celíacos, entrou em redes sociais, descobriu um grupo do Rio de Janeiro (Rio sem Glúten) e encontrou orientação para que fizesse os exames.

Há oito anos, com o diagnóstico confirmado, vive sem consumir glúten. Antes disso, sofria com cólicas, intestino preso, perda da coordenação motora e memória. "Minha situação ficou muito séria, eu tinha sensação de infarto, taquicardia... Uma vez acordei no meio da noite e não sabia quem era o meu marido", recorda. Os sinais podem variar para cada pessoa.

Embora Silva sempre tenha sentido o problema de saúde, conviveu com os sintomas. Hoje, entende as dificuldades que passou durante infância e juventude. Depois de encarar várias empresas, resolveu trabalhar em casa, desenhava e costurava até quando pôde, depois as mãos já não a obedeciam mais. Com a gestação, os problemas se agravaram. E o único filho, Guilherme Silva, 13, também foi diagnosticado.

"Quando você tem uma criança celíaca em casa ainda não é tão difícil, porque ela não liga para o que vai comer, mas o adolescente já entende que está excluído das reuniões e festas dos amigos porque ele não pode comer o que os outros comem", lamenta a mãe. Incomodada com a situação, passou a estudar sozinha os ingredientes, suas funções, para produzir um pão sem glúten tão bom quanto os pães comuns.

No início, teve dificuldade para encontrar a farinha de arroz, polvilho ou fécula de batata, então ela mesma produzia. Há cinco anos, o que era só para a família, se tornou seu trabalho. O marido, Ronaldo da Silva, analista de sistemas, abandonou o emprego para auxiliar a microempresa. Hoje, Sandra viaja para vários estados para cursos de panificação e confeitaria para celíacos.

"Sempre gostei de pão, eu não comia, mas gostava de fazer. Não é que seja imprescindível ter o pão na dieta, mas na questão social ninguém quer ser diferente. A pessoa se sente excluída", afirma a culinarista. O marido gosta e acredita no trabalho. "Já vi uma pessoa que há mais de 20 anos não comia um pão francês, quando comeu o nosso, ficou emocionada porque era igual ao que ela comia antes", recorda.

Sandra possui uma variedade de pães para pessoas com restrições e acredita trabalhar com o emocional. "Eu trabalhei para desenvolver algo que fosse comum para outros. É mais pela questão psicológica do que pela saúde. Não é só o alimento do corpo, mas a mente também tem que caminhar junto", defende a microempresária. (L.T.)