Os irmãos Tomás, 3, e Cecília Mansano, 5, se divertem na cozinha: incentivo da família
Os irmãos Tomás, 3, e Cecília Mansano, 5, se divertem na cozinha: incentivo da família | Foto: Saulo Ohara



Criança na cozinha nem sempre é sinônimo de bagunça. Com os incentivos corretos, estar em contato com o alimento pode gerar um universo de descobertas que envolvem bons hábitos alimentares, autonomia, desenvolvimento, autoestima e diversão. Seja em casa ou em cursos de culinária, colocar a mão na massa pode ser uma forma de aprender brincando.

"Eu vou ser cozinheiro", diz Tomás, 3, enquanto coloca chapéu e avental. A irmã, Cecília, 5, já estava na bancada formando as bolinhas do hambúrguer. "Eu gosto mais de fazer macarrão e sopa", opina a mais velha, que participa de cursos de culinária nas férias. Enquanto isso, o mais novo copia os trejeitos da irmã, bate na carne moída e se diverte enquanto produz os hambúrgueres.

Os pais, os empresários Roberta e Fábio Mansano, incentivam os filhos a estarem em contato com a cozinha. "Ela me ajuda em casa, gosta de comer comida de verdade, vai ao supermercado, sabe que tem que fazer a lista e gosta de coisas diferentes", conta a mãe. Cecília participou de três colônias de férias em escola de gastronomia e procura aplicar os aprendizados em casa.

Com a prática, adquiriu conhecimento sobre os alimentos, sobre como manipulá-los e formas de cozinhá-los, criando interesse pela comida caseira. "Ela gosta de comida de verdade, a gente sempre introduziu a comida feita em casa e ela tem a oportunidade de participar. No meu prédio tem horta, então ela colhe, já conhece os alimentos, tem acervo sobre a comida", explica a mãe.

"O bolo que eu mais gosto de fazer é o de chocolate e o de limão", afirma Cecília, pegando as últimas porções de carne na vasilha. Tomás se diverte ao lado, não entendendo muito bem como manipular aquilo que ele chama de massinha, mas sabe que é comida e que é ele quem está produzindo.

Cecília foi matriculada no curso com o incentivo da avó, Regina Nunes, que também já participou de algumas aulas. A mãe foi depois, em um evento sobre pizzas. "É até engraçado, porque quando eu fui fazer ela ficou falando que já sabia, porque já tinha feito", brinca a mãe.

A filha foi cedo para as aulas, tinha apenas 3 anos, no início a avó a acompanhava, agora a família fica tranquila, porque sabe que Cecília tira de letra. "A gente leva e busca, porque ela já sabe como funciona. Lava as mãos, prende o cabelo, coloca o lenço na cabeça e o avental, como ela faz em casa, ela tem todo esse cuidado e me faz copiar também", revela a mãe.

Quando sai das aulas, conta os desafios. Abrir um ovo, bater, colocar na tigela ao lado para se certificar de que ele está bom para o uso, tudo que vai aprendendo. "Em casa, quando tem manjericão, orégano, ela sabe que limpa na água e depois seca, então ela vai praticando", afirma.

Sobre a alimentação, a mãe conta que não é tão natural e que precisa de estímulo. "A gente sabe que é difícil, que é mais fácil comprar tudo pronto, mas fazendo em casa eu percebo que contribuiu para que ela coma de tudo", conta a mãe, acrescentando que a filha comentou, após ver comercial na TV, que nunca havia comido o fast-food da propaganda. "Mas não foi porque a gente proibiu, é porque não teve o interesse, ela come bem", afirma.

Roberta explica que mesmo com os incentivos há restrições no paladar, como chuchu ou abobrinha, mas acredita que os filhos possuem paladar crítico por estimular sempre alimentos naturais, já que os industrializados não são comuns na despensa da casa. "Ela come muita fruta e verdura. Isso tem que ser construído, a família precisa estimular", finaliza.

Os programas de TV e a internet ajudam a propagar a gastronomia no universo infantil
Os programas de TV e a internet ajudam a propagar a gastronomia no universo infantil | Foto: Shurtterstock



Mão na massa
Sentindo a demanda, algumas escolas de culinária desenvolveram programas de aprendizado para crianças. Assim, com projeto pedagógico específico, cursos temáticos, esporádicos ou regulares, colônia de férias e eventos de cozinha se tornaram alvos de interesse do público infantil.

"Trabalhar com o lúdico, aprender habilidades, trabalho em equipe, organização, distribuição de tarefas, destreza manual, organização, higiene, disciplina, planejamento e centro matemático, além da brincadeira", esses são os benefícios oferecidos pelas aulas citados por Ana Paula Lopes, sócia-proprietária da Menu Escola de Gastronomia, em Londrina. Segundo a chef de cozinha, colocar a criança em contato com o alimento pode promover a inserção de bons hábitos alimentares, pois começam a conhecer e ter curiosidade sobre novos ingredientes.

Ao mesmo tempo, as aulas trazem a criança para o convívio social ao reunir pessoas de vários perfis. "Cozinhar é para todos e para a vida toda, a cozinha reúne pessoas de universos diversos. Há crianças que vêm porque pretendem fazer intercâmbio e as mães se preocupam com o que vão comer ou até na faculdade que vão fazer lá na frente, o ensinamento é pra vida toda", afirma Lopes.

Além dos cursos exclusivos para o público infantil, a escola promove cursos de interação com a família, como o de lancheira saudável, em que os pais ou responsáveis acompanham e podem levar a criança para ajudar. "É livre, tem criança que vem sozinha, pais que vêm sozinhos e a família que vem junta", conta. A intenção é dar opções de lanches e fazer a criança provar o alimento feito de várias formas diferentes para que tirem suas conclusões.

A cozinha é o espaço da casa que une a família e ter os filhos participando é uma forma de fazer com que eles interajam. "Hoje a gente vê tanta criança no computador, tablet, em um tempo muito maior que o necessário e as aulas tiram as pessoas desse mundo, levando para o convívio com a família. Passam a querer ir ao supermercado, à feira. É legal quando o aluno fala que vai à casa da avó para ensinar a receita que ele aprendeu", conta a chef de cozinha.

O trabalho na cozinha é atividade que explora a curiosidade e criatividade, fortalecendo vários aspectos conforme os desafios que vão enfrentando. "Eles se sentem capazes, por isso desenvolve a autonomia, independência e senso crítico", explica Lopes.

Apesar da diversão, tem-se o cuidado para que as atividades sigam conforme o planejado, por isso exige disciplina e habilidade para que não fique uma aula chata. "Primeiro se cria o ambiente, porque elas não se conhecem, e depois nós vamos orientando, seguindo um roteiro. Além de chef, precisa ter perfil para lidar com o público infantil", afirma.

Esse cuidado já estava previsto desde o plano de negócios da escola, pois já se esperava promover aulas para o público infantil, mas veio depois, conforme a demanda. "Os programas de TV atuais incentivaram, canais infantis começaram a colocar a culinária em sua programação, a TV aberta também começou a explorar esse universo, além da internet. Isso acaba sendo um estímulo e eles curtem." (L.T.)