O juiz Juliano Nanuncio começou a sua biblioteca ainda criança: admiração por Monteiro Lobato
O juiz Juliano Nanuncio começou a sua biblioteca ainda criança: admiração por Monteiro Lobato | Foto: Anderson Coelho



A rotina de trabalho de Juliano Nanuncio, 36 anos, não é das mais fáceis. Ele é o titular da 3ª Vara Criminal de Londrina e juiz exclusivo da operação que investiga casos de corrupção na Receita Estadual do Paraná, a Publicano. Tem muito a fazer e decisões importantes a tomar. Passa boa parte do dia lendo peças jurídicas.
Quando chega em casa, Nanuncio continua a ler. Mas, sempre que possível, deixa as obras inerentes à profissão de lado e mergulha no mundo da literatura, aproveitando o acervo da biblioteca particular que foi formando, livro a livro, desde menino.
Ainda na infância, entre uma brincadeira e outra pelas ruas de Jandaia do Sul (18 quilômetros a Oeste de Apucarana), era leitor de Pedro Bandeira, Ziraldo, Ana Maria Machado, Ruth Rocha e de Monteiro Lobato, que ele considera "o maior de todos". Por sinal, lamenta que uma das obras de Lobato, "Caçadas de Pedrinho", de 1933, tenha ido parar no banco dos réus do Supremo Tribunal Federal (STF) sob acusação de racismo.O seguimento ao processo foi negado pelo ministro Luiz Fux, em dezembro de 2014.
"A educação existe para ensinar as pessoas a lerem e interpretarem, entendendo o contexto no qual a obra está inserida. Toda criança precisa aprender a ser independente. E, pela leitura, isso se torna mais fácil", defende Nanuncio.



Na adolescência, o gosto pela literatura permaneceu e aumentou depois de conhecer o clássico "Dom Casmurro", de Machado de Assis. Daí em diante, leu tudo do escritor. "Ele nunca foi além de 120 quilômetros da capital onde nascera. Era pobre, gago, epiléptico e mulato, em um País que só abolira a escravidão quando Machado já tinha 50 anos de idade. E a tudo superou. Está entre os grandes da literatura universal", destaca, apostando que a vida do escritor foi transformada pelos livros.
Veio a faculdade e com ela os obrigatórios volumes de livros técnicos. Mesmo assim, Nanuncio não abandonou a literatura e continuou a aumentar a biblioteca. Questionado se o hábito de ler lhe ajuda no exercício profissional, o juiz não tem dúvidas.
"A partir da leitura, eu compreendi que havia outros mundos fora do meu. Tomei contato com a tradução de um horizonte ilimitado da vida, do pluralismo e da liberdade. A literatura, para mim, sempre foi muito didática, ensinou-me a viver, a sentir-me à vontade em qualquer lugar, a saber e a entender melhor as misérias e as angústias do homem. Tudo isso é importantíssimo na função de julgar, pois constitui um agente facilitador da incumbência de encontrar a solução mais justa para a resolução dos conflitos que são diariamente apresentados", detalha.
Em relação aos livros da biblioteca, que fica na sala do apartamento onde ele mora e já está com as prateleiras lotadas, reluta em apontar prediletos. Porém, aos poucos vai soltando títulos que considera essenciais, como "Os irmãos Karamázov", de Fiódor Dostoiévski, publicado pela primeira vez em 1880; "Hamlet", de William Shakespare, obra de 1605; e "Grande Sertão Veredas", publicação de 1956 do brasileiro João Guimarães Rosa.
Finalizando a entrevista, o repórter questiona sobre as novas tecnologias para leitura, como os tabletes e outros aparelhos eletrônicos específicos. Mas ele não trai a paixão. "Só deixo de ler no papel quando sou obrigado."