"Me aposentei, mas continuo trabalhando, graças a Deus e com a certeza de termos cumprido com as nossas obrigações. Quero deixar esse exemplo para os meus filhos", resume orgulhoso o empresário
"Me aposentei, mas continuo trabalhando, graças a Deus e com a certeza de termos cumprido com as nossas obrigações. Quero deixar esse exemplo para os meus filhos", resume orgulhoso o empresário | Foto: Saulo Ohara



O olhar tranquilo não deixa transparecer a rotina movimentada que o empresário Francisco Ontivero mantém aos 84 anos. O fundador da rede de lojas Móveis Brasília, que recentemente foi homenageada pela Câmara Municipal de Vereadores de Londrina com a Medalha Ouro Verde, diz que não pretende parar de trabalhar tão cedo, embora confesse já ter diminuído o ritmo. "Não temos mais a mesma vontade que aos 40 anos, quando se trabalha dia e noite; agora precisamos ir um pouco mais devagar", afirma.

Dividindo a administração da empresa com os filhos e o genro, Ontivero dá expediente todos os dias no Hospital do Câncer de Londrina, onde é presidente há dois anos e também pratica corrida. No dia da entrevista ele chegou bem disposto a seu escritório em uma das lojas depois de ter corrido oito quilômetros. Próximo de sua mesa, uma fileira de medalhas confirma que ele leva o esporte muito a sério, inclusive disputando várias meias maratonas.

"Corro desde os 40 anos e atualmente são 28 quilômetros por semana. Já disputei três (meia maratona) no Rio (de Janeiro) e quero ir para Foz do Iguaçu competir. É por categoria, acima de 75 (anos). Tem gente de 75 que chega na minha frente, mas tem muita molecada que chega atrás de mim", afirma rindo.

A história da empresa que acaba de completar 50 anos se confunde com a de seu fundador. Nascido em Cândido Mota, em 1933, Ontivero veio para Londrina aos seis meses de idade, na companhia dos pais, da irmã mais velha e de um tio. A família se estabeleceu em uma área de cinco alqueires na região do Bairro Boa Vista, junto à colônia japonesa, onde atualmente está a Associação Atlética Banco do Brasil. "Meu pai aprendeu com os japoneses a plantar frutas, que eram vendidas de carroça", conta, citando o fotógrafo Haruo Ohara como um de seus vizinhos.

De ajudante do pai nas vendas, Ontivero passou a office boy do Banco Comercial do Paraná, onde entrou aos 15 anos e chegou a procurador. Depois foi trabalhar com contabilidade na empresa Transparaná, onde conheceu sua esposa, Áurea Paganucci Ontivero, com quem está casado há 53 anos e tem três filhos e quatro netos.

Algum tempo depois, Ontivero começou a fabricar sofás e colchões junto com os irmãos em um barracão nos fundos da casa dos pais, na Rua Brasil. "As pessoas estavam começando a dormir em colchão de mola naquela época, antes dormiam em colchão de capim, de crina vegetal. Foi quando conheci o senhor Letério Livoti, que fabricava móveis em Apucarana e ficou sabendo que estávamos fabricando sofás. Eu tinha uma lojinha de 10 metros quadrados onde vendíamos o que fabricávamos. Ele vinha todo domingo, trazia guarda-roupas e levava os estofados. Um dia eu disse que ia parar com a loja porque o ponto era ruim, então ele falou de abrir uma loja aqui e disse que me daria a representação dos móveis em Londrina com exclusividade. Procuramos um ponto na Avenida Duque de Caxias, onde temos a loja até hoje, começamos com um ou dois funcionários e vendíamos os móveis que nós fazíamos e os móveis dele. Depois começamos a comprar de outras empresas."

Já nessa época os sócios adotaram a prática de vender usando carnês, que perdura até hoje, atendendo à demanda dos clientes. Outra decisão foi de que os lucros deveriam ser aplicados na própria empresa. "Por isso chegamos aos 50 anos, nunca fizemos Refis (programa de parcelamento de dívidas tributárias) porque nunca atrasamos impostos, nunca deixamos de pagar nossos fornecedores nem nossos funcionários, que sempre receberam em dia. Chegamos aos 50 anos com a consciência tranquila de dever cumprido", afirma.

A sociedade foi desfeita a pedido da família do sócio depois do falecimento dele. Hoje são 18 lojas de varejo, 20 lojas de celulares e uma loja de atacado de celular. O empresário diz que com a crise foi necessário diversificar os negócios, já que muitos de seus clientes também foram afetados.

VOLUNTARIADO
Ontivero conta que é voluntário do HCL há 12 anos e assumir a presidência foi uma consequência natural. "Graças a Deus tenho saúde e por isso, vamos trabalhar. Vou para lá todas as manhãs e se for necessário, vou a tarde também. O hospital tem 840 funcionários, 130 médicos, atendemos 220 municípios, é uma responsabilidade muito grande. Me aposentei, mas continuo trabalhando, graças a Deus e com a certeza de termos cumprido com as nossas obrigações. Quero deixar esse exemplo para os meus filhos."

Além da corrida, outro hobby era a pesca, que por causa da idade ele teve que parar. Ontivero também aproveita as visitas às filiais de Santa Catarina para passar um tempo em Balneário Camboriú. "É a viagem que costumamos fazer, toda a minha vida foi assim, sem glamour. A gente leva a vida simples, se dedica para a empresa e para as instituições que a gente faz trabalho voluntário. As pessoas perguntam como uma empresa chega aos 50 anos. Eu digo que você tem que deixar o que ganha na empresa, não pode só pensar em você e na sua família, tem de pensar na coletividade."