"Essa viagem me deu mais propriedade para trabalhar com o blues", diz a baixista Sara Secco Delallo, que está despontando como uma das melhores do País
"Essa viagem me deu mais propriedade para trabalhar com o blues", diz a baixista Sara Secco Delallo, que está despontando como uma das melhores do País | Foto: Gustavo Carneiro


Quando a baixista Sara Secco Delallo começa a contar sobre a recente viagem de 44 dias pelos Estados Unidos, as imagens que vêm à mente são cinematográficas. Lembram os road movies, aqueles filmes em que os protagonistas estão na estrada, viajando de costa a costa e se apresentando em bares e festivais.

Sara não chegou a ver o mar, mas percorreu cerca de 20 mil quilômetros entre 13 estados norte-americanos, contabilizando 23 shows ao lado da inglesa Bex Marshall. "Começamos e terminamos no Mississipi", conta Sara, enfatizando o roteiro especialíssimo que vivenciou. "Toquei blues na terra do blues", comemora.

Nascida em Astorga e radicada em Londrina, Sara cresceu em um meio musical. A mãe, professora de piano, dava aulas no fundo da casa. "Nem consigo dizer quando comecei a tocar piano, foi algo natural. Aprendi a ler partitura ao mesmo tempo que aprendi o alfabeto", diz. Mas a virada para o atual instrumento, o contrabaixo, ela lembra bem quando foi e por qual motivo. "Foi aos 15 anos porque queria ter uma banda."

O alvo dela, na época, era a guitarra. "Como tinha muitos alunos de guitarra, eram 40, 50 e nenhum de baixo, o professor perguntou se eu não queria o baixo. Ele disse 'todos eles vão precisar de você' porque sabia que eu queria mesmo tocar numa banda, não era paixão pela guitarra nem nada. Foi o melhor conselho que me deram. Realmente gostei do baixo", diz.

Apesar de já ter tocado com Bex Marshall nas diversas vezes que a inglesa esteve no Brasil, Sara não imaginava que faria parte da banda na viagem norte-americana. "O convite surgiu um mês antes porque o baixista teve problemas pessoais e desistiu. Eu não tinha nem passaporte, mas quando é para ser, é. Se eu tivesse parado para pensar, não iria", afirma.

Ainda assimilando a ideia de tocar em solo sagrado do blues por mais de 40 dias, Sara foi atrás do visto americano e mostrou que sobrevive a fortes emoções. "O passaporte com o visto chegou apenas duas horas antes de eu embarcar para São Paulo. Até abracei o entregador", diverte-se. "Tinha feito uma turnê internacional antes, na Argentina. Mas lá não precisa de passaporte", explica.

Sara se mudou para Londrina aos 17 anos, quando entrou no curso de Música, na Universidade Estadual de Londrina (UEL). "Pensava em fazer Direito, mas mudei na hora da inscrição", relata. A faculdade lhe trouxe uma grande rede de contatos e amigos com quem toca até hoje. Bandas como Hocus Pocus, Terra Celta, Madera e Pedrera fazem parte do currículo da baixista, que integra a Luke de Held & the Lucky Band há sete anos.

Mas foi só em 2013 que "o blues caiu no meu colo", define. "E meu primeiro show de blues foi com uma lenda, o Lurrie Bell", diz. Ela explica a emoção da estreia com uma metáfora: "quanto mais perto da fonte, mais pura a água". E na viagem, a baixista teve pelo menos quatro momentos inesquecíveis. A lista inclui as apresentações no Teddy's Juke Joint, que tem mais de 30 anos de história em Louisiana, e no House of Blues, em Chicago, outro solo sagrado do blues.

"E também quando tocamos na Beale Street, em Memphis. Nós recebemos a jam lá e toquei a noite inteira", lembra Sara, que na ocasião dividiu o palco com vários músicos em um dos endereços mais icônicos para os fãs do estilo musical. O quarto momento foi o show no Kalamazoo Blues Festival, com a maior plateia da turnê. "Não sei dizer quantas pessoas, mas era muita gente", conta, sobre o evento com mais de duas décadas de tradição.

Ainda atrapalhada com o fuso horário, Sara também segue em êxtase com toda a experiência das últimas semanas. "Essa viagem me deu mais propriedade para trabalhar com o blues, que está crescendo muito no Brasil. O maior festival de blues da América Latina acontece em Caxias do Sul (RS) e o número de bares de blues tem aumentado muito também e em consequência disso aumenta o número de bandas para tocar nesses lugares", contextualiza.

Com um nicho bem específico, Sara se prepara para dar início a aulas de baixo via Skype e assim poder atender os interessados em todo o País. "Gosto muito de dar aula", avisa. Para os alunos, uma honra, já que a paranaense é considerada uma das melhores baixistas de blues do Brasil. "O filho do Muddy Waters me coloca entre as três melhores do mundo", avisa, sem se levar muito a sério. Em novembro, ela volta a se apresentar ao lado de Bex Marshall no Brasil.