A entrada maciça das mulheres na vida econômica brasileira vai contra aquela velha ideia de que o maior sonho feminino é encontrar um príncipe encantado para lhe proporcionar segurança financeira. A grande maioria contribui hoje com o pagamento de despesas domésticas. Esta foi uma das constatações da pesquisa desenvolvida com exclusividade para a reportagem, pela Sophia Mind Pesquisa e Inteligência de Mercado, empresa do grupo de comunicação Bolsa de Mulher.
Foram entrevistadas, via internet, 507 mulheres, entre 18 e 60 anos, com renda própria e média de R$ 2 mil mensais. A metade era casada. Nessa amostra, 94% contribuem com as despesas domésticas e boa parte (56%) divide igualmente as contas com o parceiro. Outro mito feminino foi colocado em xeque: o de que elas são perdulárias e torram seu dinheiro com futilidades, como itens de moda e beleza.
O estudo aponta que gastos com cuidados pessoais (produtos, salão, academia) e moda (roupas e acessórios) estão em sétimo e oitavo lugares, respectivamente, na escala das principais despesas das casadas. Entre as solteiras, beleza ganha mais destaque, e está em terceiro lugar, enquanto moda cai para o décimo lugar. Mas até para quem não tem obrigações fami­liares, esses são os principais itens a serem cortados na hora do aperto.

Sacrifícios
A prestação pesada do financiamento do imóvel impulsionou um corte drástico nas despesas da estilista Andrea Clara Flores, de 38 anos. Todo mês ela precisa desembolsar R$ 2 mil para pagar seu apartamento, onde mora sozinha. ''Para ter casa própria, abri mão de várias coisas de que gosto'', conta. Saíram da sua lista tratamentos estéticos e massagens. Agora ela mesma hidrata seus cabelos em casa, e passou a malhar na academia do prédio, que não cobra mensalidade.
Roupas e acessórios novos entram raramente em seu guarda-roupa. ''Quando preciso comprar alguma coisa, procuro peças clássicas, que não saiam de moda'', diz Andrea, que trabalha como autônoma. ''O que mais doeu, no entanto, foi tirar do meu orçamento as idas a restaurantes, e deixar de viajar, outra paixão.''
As despesas fixas, com supermercado, luz, água, transporte, plano de saúde, etc., correspondem à fatia mais pesada do orçamento feminino. São as que mais impedem as mulheres de pouparem e se prepararem para o futuro. De acordo com a economista Alexandra Almawi, gerente comercial da Lerosa Investimentos, mesmo entre aquelas que não são as responsáveis ''oficiais'' pelo sustento da casa, a renda mensal acaba sendo direcionada para o que ela chama de ''gastos imprevisíveis'', que aparecem constantemente nas despesas familiares.
''Enquanto os homens cobrem custos programados; as mu­lheres ficam responsáveis pelo supermercado, objetos de casa, despesas extras com filhos, médico e o que aparecer'', explica Alexandra. ''Razão pela qual eles conseguem se programar para investir, enquanto elas vivem apagando incêndio.'' Ou­tra desvantagem que acaba pesando bastante no orçamento feminino é a disparidade salarial entre mulheres e homens, o que piorou no Brasil.
Apesar de a participação das mulheres na força de trabalho ter aumentado de 57%, em 2006, para 64%, em 2010, o rendimento feminino é pouco mais da metade do masculino, quando se considera a execução do mesmo trabalho. Elas ganham 60% do salário deles. Esses dados, divulgados em outubro pelo Fórum Econômico Mundial, fazem parte da avaliação das desigualdades de gêneros em 134 países. O item ''diferença sa­larial'' levou o Brasil a ocupar, pelo segundo ano consecutivo, as piores posições do ranking global: de 81º, em 2009, caiu para 85º, este ano.
''Quem ganha menos poupa menos'', ressalta a especialista em educação financeira, Eliana Bussinger, autora dos livros ''As Leis do Dinheiro para Mulheres'' e ''A Dieta do Bolso'' (Editora Elsevier). ''Portanto, se as mulheres dividem as despesas igualmente com seus companheiros, apesar do salário menor, estão fazendo errado. Isso só seria justo se os ganhos fossem semelhantes.''

Gastos desiguais
A maioria das solteiras entrevistadas mora com os pais, em segundo lugar vêm aquelas que vivem com os filhos e apenas 13% moram sozinhas. Para todas, depois dos gastos fixos, a maior despesa é com os produtos classificados como ''telecom'': celular, telefone fixo, banda larga e assinatura de canais.
Segundo a pesquisa da Sophia Mind, apenas 6% das casadas não contribuem com as despesas. Para essa minoria, gastos com cuidado pessoal e entretenimento são as prioridades.