Alunos da oficina Música e Educação Musical Intergeracional: dança, canto, improvisação e criação
Alunos da oficina Música e Educação Musical Intergeracional: dança, canto, improvisação e criação | Foto: Fotos: Marcos Zanutto


Quando o suíço Émile Henri Jaques - um dos grandes pedagogos musicais da primeira metade do século XX - criou um sistema de ensino rítmico musical através do movimento corporal, professores passaram a ver a educação musical por outro prisma. Desde que passou a ser difundido a partir de 1930, o método, que ficou conhecido como Pedagogia Dalcroze, tem o objetivo de desenvolver as capacidades artísticas do ser humano por meio de sua sensibilidade e sensorialidade.

"É pelo corpo humano que aprendemos a sentir a música. As atividades corporais propostas, portanto, levam a pessoa a vivenciar os elementos da linguagem musical, desenvolvendo e estimulando a percepção auditiva, visual, tátil, o tempo e o espaço", explica Iramar Rodrigues, professor do Instituto Dalcroze, em Genebra, que veio ministrar a oficina "Os princípios da Pedagogia Dalcroze: expressão corporal, a rítmica, o solfejo e a improvisação", no 37º FIML (Festival Internacional de Música de Londrina).

Durante a aula, fitas amarradas aos dedos, varetas pressionadas nas mãos, passos pela sala, criações melódicas, exercícios de respiração, equilíbrio, emissão de voz, juntamente com os movimentos corporais, compõem o aprendizado que vai sendo construído aos poucos. "A compreensão musical acontece naturalmente pela interação entre mente e corpo; esses elementos não existem isoladamente. Aprende-se a música pelo corpo e suas sensações; os códigos (como notas, intervalos) vêm como parte conclusiva desse processo. Não queremos fabricar gênios da música, mas seres humanos sensíveis. É uma necessidade do nosso século." As correntes por novas formas do ensino da música, bem como os princípios dessa pedagogia de trabalhar com o corpo vivenciando os elementos musicais, passaram a influenciar outras áreas, como a dança, as artes cênicas e até mesmo a educação física.

Oficina Canto Coletivo Improvisado: todos podem fazer música
Oficina Canto Coletivo Improvisado: todos podem fazer música



Nessa vertente da educação musical contemporânea, destacam-se outros movimentos que primam pelo ensino diferente do formal e tradicional, considerado muito rígido e massante. Músico e educador musical, Marcelo Caires, mestre em Gerontologia, é autor de uma metodologia chamada de Escuta Sensível (sonoplastia no audiovisual) e do livro "Educação Musical na Maturidade". Com oficinas de música, atua para um envelhecimento saudável em adultos e idosos. "Inicio os idosos na prática e compreensão musical que acaba desenvolvendo o aspecto social, além de ativar sistemas neurológicos que vão contribuir com o lado motor, auditivo, visual e cognitivo. A música é instrumento de formação global e, por isso, esse trabalho está muito ligado à área da saúde e para o despertar de um ser humano melhor", explica ele, que também veio ao FIML ministrar a oficina Música e Educação Musical Intergeracional.

Os resultados, segundo ele, a partir "do corpo em ação e música em movimento", são notórios na recuperação de comandos, organização dos membros, autonomia, melhoria em níveis de demência e qualidade de vida devido ao estímulo de novas sinapses cerebrais. "É um movimento biopsicossocial na redescoberta de habilidades. A sociedade, infelizmente, ainda não enxerga a arte como construção do ser humano de maneira ampla." A aula geralmente inicia com a sensibilização rítmica seguida de movimentos que estimulam a lateralidade. Aos poucos são inseridos dança, canto, improvisação e criação. "Ninguém afina ou canta no ritmo se não foi sensibilizado inicialmente. Sem a vivência não é possível sentir ou pensar a música. Apenas uma segunda etapa direcionada é voltada à compreensão dos símbolos que vão convergindo para a alfabetização da linguagem musical."

Construção coletiva

Depois de conhecer o trabalho do músico norte-americano Bobby McFerrin, criador do método Circle Songs, Uliana Dias, professora do Departamento de Música da UnB (Universidade de Brasília), juntamente com o músico Zuza Gonçalves, tem estudado e desenvolvido caminhos alternativos dentro da música vocal em contextos de ações educativas e de performance. Nessa visão, tudo se constrói de forma coletiva ao passo que vão agregando elementos de práticas diversas como a improvisação vocal, os cantos circulares (circle songs), a percussão corporal, a canção brasileira e o canto coral.

"Essa prática parte do entendimento de que todos podem fazer música e que, esta, é uma atividade humana essencialmente criativa. Por isso, estimulamos que as pessoas cantem, exerçam essa criatividade, a espontaneidade, de maneira que as ideias sejam criadas coletivamente, organizando para uma construção musical", explica ela, que ministrou a oficina Canto Coletivo Improvisado no FIML.

Nesta aula, uma roda é formada e, ao centro, uma pessoa conduz os exercícios que vão sendo pouco a pouco incrementados. "Cada um vai dando sua contribuição dentro de ideias e células melódicas determinadas, ritmos que vão se repetindo, expressando sua musicalidade de maneira confortável. Tudo se transforma em um grande diálogo." A prática pode ser realizada em grupos diversos e com todas as idades. Não há restrições nem mesmo de local, podendo acontecer ao ar livre, como praças e parques.

"Percebemos que as pessoas perdem o medo de cantar ao começar interagir com as outras, desenvolvem a noção de tempo e ritmo pela habilidade de escuta e percepção, aprendem a identificar outras vozes e timbres. Mas, acima de tudo, é um espaço para a gente ser o que é."