Em agosto do ano passado, durante uma reunião de trabalho, num café, com o novo empresário, o cantor Ritchie foi interpelado por um representante da gravadora Sony, de quem ouviu: ''Você sabia que eu continuo vendendo seu primeiro álbum até hoje?'' Ritchie e o empresário já conversavam sobre o desejo de relançar ''Voo de Coração'', que completará 25 anos e, naquele momento, concluíram: o encontro não era só coincidência, e sim um sinal de que o projeto tinha mesmo de ser realizado.
Considerado um marco do rock brasileiro, o disco, praticamente só de parcerias de Ritchie com Bernardo Vilhena, tem no lado A seu maior hit, ''Menina Veneno'', além dos também sucessos ''A Vida Tem Dessas Coisas'' (Pra conversar/ Te convencer/ Te confessar/ Quero só você), ''Casanova'' (Boa noite, rainha, como vai?/ Sou o seu curinga, o seu ás) e ''Voo de Coração'' (No canto da sala/ O seu holograma/ Você parece sorrir); no lado B, ''Pelo Interfone'' (Chamo por você, ninguém atende/ De repente uma luz acende).
À época, o LP vendeu mais de 1 milhão de cópias. O sonhado relançamento deu-se perto do Natal passado. Está indo bem, conta o hoje cinquentão Ritchie (ele faz 57 anos em março), que teve dificuldade para emplacar a proposta na gravadora. ''Fomos à Sony (que comprou a CBS, pela qual o disco saiu em 83) e nos disseram que tinha muita gente comemorando 25 anos, que não havia equipe para fazer. Só conseguimos quando dissemos que faríamos tudo, e eles só precisavam distribuir'', relembra o cantor, que foi atrás das fitas originais num depósito da Sony, a fim de tirar o mofo e remasterizá-las.
O resultado é um som de qualidade, que agrada não só aos fãs da década de 80, mas também a quem não a viveu - no site de Ritchie, www.ritchie.com.br, os comentários não são só de quarentões. O cantor fez questão de fixar o preço do produto em R$ 12,90, o mesmo de uma versão que ele considera fajuta, ainda no catálogo da Sony.
No CD, o público tem, além das dez faixas originais (''No Olhar'', ''Preço do Prazer'', ''A Carta'', ''Parabéns Pra Você'' e ''Tudo Que Eu Quero'' complementam as já citadas), três bônus: ''Mi NiÀa Veneno'', versão em espanhol que a CBS encomendou em 83 a Ritchie por conta da febre da música no Brasil, e que o levou a alguns países na América Latina; ''The Letter'', cover, em inglês, da música original que ele verteu para o português há 25 anos; ''Baby Meu Bem'', o lado B do compacto de ''Menina Veneno'', que naturalmente ficou ofuscada; e uma versão 2008 de ''Voo de Coração'', acústica, sem a guitarra de Steve Hackett (ex-Genesis, que naquela faixa substituiu Lulu Santos, guitarrista do disco com Liminha) e a bateria de Lobão, e com o piano de Humberto Barros, o violão de Paulinho Moska e a flauta de Ritchie.
Ele não para. No segundo semestre, o cantor inglês, que nos anos 90 dedicou-se ao trabalho como consultor de informática para a área musical, lança um DVD com inéditas, no estilo ''ao vivo no estúdio''; em seguida, vem um CD também de inéditas. Entre os planos para o futuro, poderá constar o lançamento de um CD com suas 14 músicas incluídas em novelas, sendo as primeiras ''Menina Veneno'', que entrou em ''Pão Pão Beijo Beijo'' já ''estourada'', e ''Casanova'', tema de abertura de ''Champagne'', ambas em 1983, e a última, ''Fala'', tema do personagem de José Mayer em ''A Favorita''.
Sem gravadora, o que acha ótimo (''não quero estar num navio que está afundando''), Richard David Court, que chegou ao Brasil em 72, aqui se fixou e teve duas filhas, segue se apresentando pelo País e escrevendo no blog que mantém desde 2004.
Nele, lê muitos comentários de admiradores: ''Sou seu fã desde o vinil'', dizem. Não é nostálgico. Cumprida a missão de recuperar ''Voo de Coração'', quer ''olhar para a frente, não para trás''. Mas quem não gostaria de relembrar aqueles anos? ''Era coisa despretensiosa, que fizemos entre amigos. Quase ninguém ganhou dinheiro com o disco. A gente pensou que ia sair vendendo numa Kombi em Marechal Hermes'', brinca. ''Hoje é maravilhoso poder sentir o mesmo calor do público.''