Cannes - Um estupro coletivo, um filho assassinado pelo pai, uma neta que filma o suicídio do avô e uma idosa alvejada na testa são algumas das atrocidades que passaram pela tela do 70º Festival de Cannes.
A mais importante mostra cinematográfica do mundo terminou no domingo (28), na França, chancelando filmes de arte que não poupam o estômago do espectador.
Não deixa de ser irônico, contudo, que a trama do principal vencedor desta edição, "The Square", invoque a obsessão da arte por se fazer marcante a partir do choque.
Dirigida pelo sueco Ruben Östlund, essa sátira de humor negro foi vencedora da Palma de Ouro. É uma crítica ferina ao universo de artistas contemporâneos, cheia de situações que beiram o absurdo.

Um dos méritos de ‘The Square’, dirigido por Ruben Östlund (no detalhe), seria atacar a ditadura do politicamente correto, "a pior de todas as ditaduras", segundo Pedro Almodóvar, que presidiu o júri
Um dos méritos de ‘The Square’, dirigido por Ruben Östlund (no detalhe), seria atacar a ditadura do politicamente correto, "a pior de todas as ditaduras", segundo Pedro Almodóvar, que presidiu o júri | Foto: Divulgação



A história gira em torno do curador de um museu em Estocolmo, vivido por Claes Bang, que quer atrair mais visitantes para a instituição.
Em meio a clichês do mundinho da arte - etéreos textos de catálogo de exposição, performers radicais e obras de qualidade duvidosa- a solução encontrada para chamar público é fazer um vídeo violento viralizar na internet.
"A arte contemporânea, como qualquer área, tem de ser criticada", disse Östlund, com a Palma em mãos, em entrevista à imprensa após a premiação. "O mesmo tem que acontecer com a indústria cinematográfica e qualquer outra área ritualizada."
A escolha de "The Square" como o vencedor pelo júri capitaneado por Pedro Almodóvar não teve repercussão unânime na imprensa.
O longa de Östlund foi malhado pelos críticos franceses e foi chamado de "força menor" - brincadeira com outro filme do diretor, o aclamado "Força Maior" (2014). O filme será distribuído no Brasil pela Pandora e é possível que esteja na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no segundo semestre. Ao justificar o prêmio, Almodóvar disse que "The Square" ataca com humor a "ditadura do politicamente correto" que, afirmou, "é pior do que todas as ditaduras".

Imagem ilustrativa da imagem O humor vence a violência



O espanhol ficou com a voz embargada quando foi questionado sobre o longa francês "120 BPM", de Robin Campillo. Essa ficção sobre um grupo de ativistas que nos anos 1990 defende soropositivos e luta contra a homofobia levou o Grande Prêmio do Júri, o segundo mais importante.
O filme de Campillo, que era um dos favoritos à Palma de Ouro, levou ainda o prêmio da imprensa, dado pela Fipresci, entidade que reúne críticos de diversos países.
Almodóvar também cumpriu o prometido na abertura do festival e ignorou a Netflix, centro da celeuma do ano. O serviço de vídeo sob demanda tinha "Okja" e "The Meyerowitz Stories" na disputa e irritou a comunidade cinéfila ao anunciar que os filmes não passariam nos cinemas na maioria dos países.

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