Anne Frank: seu diário continua sendo visto como denúncia sobre o contexto opressor da guerra
Anne Frank: seu diário continua sendo visto como denúncia sobre o contexto opressor da guerra | Foto: Reprodução



Paris - Há 75 anos, o diário íntimo de uma menina de 13 anos revelou ao mundo a trajetória de vida e morte de oito judeus-alemães. Eles haviam sobrevivido enclausurados durante 743 dias no anexo de um apartamento em uma Amsterdã ocupada pelo exército e pela ideologia nazista que invadira a Holanda. Publicado há sete décadas, o Diário de Anne Frank tornou-se o maior clássico da literatura do holocausto, um relato poderoso da perseguição sofrida por judeus no momento mais brutal e chocante da história da Europa.
Com 50 milhões de cópias vendidas, o documento escrito por Anne Frank entre 12 de junho de 1942 e 1.º de agosto de 1944 ganha agora duas novas versões adaptadas ao século 21. Criadores de "A Valsa de Bashir", animação indicada para o Oscar e vencedora do Globo de Ouro de filme estrangeiro em 2009, o roteirista e diretor de cinema Ari Folman e o desenhista David Polonsky lançam "O Diário de Anne Frank" em quadrinhos. Folman prepara ainda uma versão em animação para o cinema.
A adaptação para os quadrinhos, que será publicada em mais de 50 países ao longo de setembro e outubro, foi apresentada em Paris e mobilizou jornalistas de mais de 60 nacionalidades. Converter o livro para graphic novel exigiu dos autores um brutal esforço de concisão. Se fosse transposto na íntegra, a obra em quadrinhos teria 3,5 mil páginas. Por isso, o diário gráfico traz a essência do texto, sintetizado e adaptado por Folman. Sua maior riqueza em relação ao texto original talvez seja o fato de ter sido imaginado e traduzido para os quadrinhos pelos traços de Polonsky, às vezes divertidos, não raro oníricos e trágicos - como era o próprio "Kitty", o diário escrito por Anne Frank até sua morte, no campo de concentração de Bergen-Belsen, em março de 1945, no apagar das luzes da Segunda Guerra.

Como nas confissões íntimas da menina, a edição em quadrinhos é fiel à sequência cronológica da narrativa. Estão na adaptação a angústia do início da perseguição nazista, a incompreensão pela violência, depressão, dúvidas e sonhos da adolescência, assim como sua análise cortante sobre a Europa sob o jugo de Hitler. "À noite, costumo ver longas filas de gente boa e inocente com crianças chorando, andando sem parar até quase caírem. Ninguém é poupado. Doentes, velhos, crianças, bebês, todos são forçados a marchar em direção à morte", escreve Anne Frank, em trecho do original mantido por Folman. Na ilustração, Polonsky desenha rostos magros, olhos tristes e mãos ao alto que falam por si.
Na apresentação do livro, em Paris, os autores comentaram o desafio de traduzir para uma nova linguagem um clássico da literatura que é muito mais do que um best-seller mundial, por seu conteúdo documental ímpar. Folman lembrou o impacto da leitura do Diário de Anne Frank quando se é adulto, e disse ter imaginado um livro voltado para crianças e adolescentes. "Um jovem não consegue apreciar o valor literário do livro como um adulto", lembra Polonsky. Por isso, os autores frisaram, na adaptação aos quadrinhos, os temas que atravessam o imaginário dos jovens. "Quando se é adulto, lê-se o diário sob o prisma de uma adolescente falando de você, adulto. Quando se lê ainda garoto se tem outra perspectiva", explicou Folman. "Adolescentes e crianças, em especial meninas, vão encontrar o que eles precisam no diário original: a relação com a mãe, com outras crianças, o amadurecimento sexual."
Para Folman e Polonsky, o diário gráfico e a versão para o cinema são uma missão: a de ajudar a eternizar a história do holocausto entre novas gerações.