Uma das formas mais interessantes - e saborosas - de se conhecer a cultura de um país é pela gastronomia. Experimentar pratos típicos e ingredientes diferenciados é uma espécie de ''viagem'' às riquezas culturais que são peculiares a cada povo, a cada nacionalidade. No Ano do Brasil em Portugal - que foi lançado no último dia 7, no Brasil, e começa oficialmente hoje, em Lisboa, com ampla programação prevista até junho de 2013 - uma motivação a mais para aprender a apreciar as diferenças e semelhanças que marcam essa relação tão estreita entre os dois países. Se o Brasil é muito mais do que samba, futebol e feijoada, Portugal também vai além do fado e do bacalhau.
Um dos pratos típicos de Portugal que nem sempre é facilmente encontrado por aqui é a Sardinha Portuguesa na Brasa. Iguaria democrática, é apreciada em todo o país, com destaque para a produção das regiões litorâneas de Peniche e Nazaré, em direção ao norte de Portugal.
''De junho a agosto é a época em que se pesca as sardinhas com o tamanho e quantidade de gorduras ideias, que garantem um sabor especial. E nos meses de setembro a outubro é quando começamos a receber no Brasil parte dessa safra'', explica Hélio Paulus Campos, proprietário do Restaurante Cantinho Português, que está organizando para outubro algumas sardinhadas no almoço de sábado (as reservas devem ser feitas com antecedência por telefone).
Temperada apenas com sal grosso (normalmente colocado dentro das guelras), a sardinha é assada inteira na brasa, com escamas e vísceras (ou barrigada). Na hora de comer, a orientação é fazer um corte longitudinal da cabeça ao rabo para a retirada da espinha, da cabeça e das vísceras, que não devem ser consumidas pelo sabor amargo.
Normalmente servidas acompanhadas de batatas cozidas, salada de tomate e cebolas, pimentões assados, azeitonas pretas e pão caseiro, a iguaria é extremamente saborosa e saudável, já que a sardinha é rica em ômega 3. O toque especial fica por conta de um molho especial da casa, que leva azeite de oliva, alho, pimenta, páprica e outros segredinhos que foram passados pela matriarca Maria Amélia de Oliveira Caroço Costa à filha Ana Maria Costa Campos, que hoje comanda com maestria a cozinha do restaurante.
''Lá em Nazaré há muitas vielas, que desembocam no mar, em que é costume as pessoas prepararem as sardinhas nas calçadas em frente às casas, que são geminadas. As roupas ficam nos varais, do lado de fora, e a fumaça e o cheiro característico do peixe acaba impregnando tudo'', lembram os proprietários Hélio e Ana Maria, que frequentemente viajam a Portugal e no próximo mês comemoram os 15 anos do restaurante. ''Na praia de Nazaré também ainda é costume salgarem pequenos peixes e deixarem eles expostos em espaldários para secarem e serem servidos como aperitivos'', acrescentam.
Outros sabores de Portugal que merecem ser provados são a aguardente feita com bagaço de uva, a chamada Bagaceira (Bagaceira São Domingos), e a Ginginha, licor de ginja, uma espécie de cereja, produzido na região de Anadia. No caso do Cantinho Português, as bebidas são servidas em cálices, e não deixe de comer a ginja no final da degustação.

Delícias de ovo e açúcar
Em Londrina desde 2008, o confeiteiro português João Carlos Lopes de Jesus vê com bons olhos a iniciativa do Ministério da Cultura e do Ministério das Relações Exteriores de aproximar Brasil e Portugal. Dono há dois anos da Doceria Portuguesa, no Shopping Quintino, ele se orgulha do sucesso que vem obtendo junto à clientela londrinense ao comercializar dois doces típicos portugueses: o Pastel de Belém e o Pastel de Santa Clara, que são vendidos a R$ 2,50 a unidade.
Feitos com massas folhadas produzidas artesanalmente por ele, os doces preservam as características originais dos quitutes produzidos em Portugal. ''Na verdade, o Pastel de Belém, comercializado fora da região de Belém (que patenteou o nome), deveria ser chamado de Pastel de Tentugal, mas aqui optei por usar o nome mais conhecido pelos brasileiros'', explica o confeiteiro, que nasceu em Angola (na época uma colônia portuguesa) e mudou-se para Lisboa aos dois anos de idade. Casado com a brasileira Eliane de Oliveira, conta que admira as belezas naturais e as frutas brasileiras. Já ela afirma que se sentiu ''em casa'' em Portugal e aprova a alimentação lusitana, feita à base de peixes e legumes.
Apreciador de doces ''não tão melados'', Lopes procura manter esse padrão em seus produtos feitos diariamente, que além de deliciosos, não têm sabor de ovos, embora em ambas as receitas haja adição de gemas cozidas em creme à base de leite e açúcar (no caso do Pastel de Santa Clara, adiciona-se amêndoas e canela também). ''Muitas pessoas que experimentam o Pastel de Santa Clara acham que no recheio vai maçã ou banana'', comenta.
Com receitas doces que privilegiam a adição de ovos - herança da tradição católica portuguesa em que era necessário dar uma boa finalidade à grande quantidade de gemas após a utilização das claras para engomar as roupas nos conventos -, Lopes ressalta a criatividade na elaboração dos pratos. ''No Natal, uma grande mesa de doces que levam ovos tem papel de destaque na ceia e cada pessoa da família fica responsável por um prato doce''.
Entre os quitutes pouco conhecidos por aqui, Ovos Moles de Aveiro, Palha de Abrantes (feito com fios de ovos), Bolo Rei (parecido com panetone), Aletria (uma espécie de arroz-doce feito com macarrão cabelinho de anjo), Farófias (feito com claras de ovos batidas cozidas ao leite morno e canela) e Molotofe (pudim feito de claras batidas com caramelo).
''O Pastel de Cerveja, que também é produzido na cidade de Belém e é recheado com doce que leva ovos, vale a pena ser apreciado pelos brasileiros e pretendo em breve produzi-lo aqui'', adianta, para o deleite dos apreciadores de doces portugueses. Ele também aceita encomendas de bolinho de bacalhau, tortas doces e salgadas e pastéis de Belém e Santa Clara em versão reduzida.

Serviço
- Doceria Portuguesa - R. Quintino Bocaiúva, 812 (Shopping Quintino). Tel. (43) 3329-3644

- Restaurante Cantinho Português - R. Augusto Severo, 576. Tel. (43) 3337-1516