O tema da Semana Literária do Sesc deste ano é a violência. É uma temática presente na literatura brasileira? Está presente em seus livros?
A violência e suas inúmeras facetas (física, psicológica, moral, financeira) é o grande tema da literatura há milhares de anos. Desde a Epopeia de Gilgamesh, um épico mesopotâmico de 2750 antes de Cristo, até a Ilíada e a Odisseia, e por fim chegando na literatura contemporânea. A violência é um grande tema, pois é sobretudo humano: somos violentos, somos animais de dentes rangentes encarcerados no processo civilizatório, mas estamos sempre prontos para explodir, para voltar à nossa natureza mais original e cruel, e respeitar o único instinto não domesticado: o da sobrevivência. É um grande tema na literatura brasileira, o Jaime Ginzburg tem um artigo muito interessante que une duas lendas vivas da literatura brasileira: Dalton Trevisan e Rubem Fonseca, dois mestres em criar personagens com as inúmeras facetas da violência. Estou lendo "O Trovador", do Rodrigo Garcia Lopes, que se passa em Londrina e a violência é também um ingrediente importante, sobretudo por se tratar de uma narrativa policial.

Como você escolhe os temas que abordará na ficção?
Um romance ou um conto ou um poema podem surgir de uma imagem, de uma música, de uma história ouvida, de uma memória verdadeira ou falsa. Tudo pode ser material para a ficção, e como somos a soma das nossas referências, quanto mais e melhores elas forem, melhor saberemos lidar com o que queremos ou não em nossa escrita. Meu último livro, "As Fantasias Eletivas", é sobre um recepcionista de hotel que passa as noites a limpar com álcool o balcão, mas que, no fundo, guarda um passado secreto e um emaranhado de angústias. Sua amizade com Copi, uma travesti argentina que investiga a literatura através da fotografia parece uma saída para sua vida destruída. Eu sou um cara perturbado que escreve sobre personagens perturbados, e de maneira perturbada. Não pretendo ser o salvador da pátria ou o grande escritor brasileiro, quero apenas ser sincero comigo e com minha escritura.

Você já trabalhou como recepcionista de hotel, não? Já escrevia naquela época?
Trabalhei em quatro ou cinco hotéis em Balneário Camboriú, e em turnos diferentes. Eu tinha vinte e poucos anos, pouco dinheiro e um senso de observação bem aguçado. Escrevia muitos contos sobre hóspedes, mas sempre acabava jogando fora, pois me sentia como um vampiro que sugava a essência do hóspede. Foi uma época divertida, sobrava tempo para ler e escrever nas madrugadas sombrias que eu passava na recepção, e muitos hóspedes sul-americanos esqueciam livros nos hotéis, muita porcaria, mas também coisas que foram muito importantes para minha formação, como Augusto Monterroso, Mario Levrero, Pablo Palacio, Onetti e Borges.

Como vê a projeção da literatura produzida em Santa Catarina no resto do País?
Santa Catarina é uma província com belas praias, não esperem muita coisa de lá. Mas a verdade é que não importa onde nasce um escritor, e sim sua obra. Uma obra poder ser regional e global, como do Guimarães Rosa ou Graciliano. Mas algumas cabeças que nasceram no Estado conquistaram grande expressão, mesmo morando pouco tempo lá: Cruz e Sousa, Karam, Ettore Bottini, Cristovão Tezza e Godofredo de Oliveira Neto são catarinenses. E há uma excelente geração surgindo no Estado, como a Patrícia Galelli e o Guille Thomazi.