Imagem ilustrativa da imagem Elis: o ícone, o filme, a celebração
| Foto: Fotos: Divulgação
A mineira Andréia Horta interpreta Elis de forma impressionante: lá estão os tiques, o gestual, a gargalhada escrachada e até a aura
Imagem ilustrativa da imagem Elis: o ícone, o filme, a celebração



Inexplicavelmente inédito em Londrina, onde um público potencial que o exibidor local até agora vem desprezando, o longa metragem "Elis" cumpre ótima carreira nas bilheterias. Em apenas duas semanas decorridas da estreia, o longa metragem já foi visto por 32.500 espectadores, e continua mantendo média de espectadores sem demonstrar cansaço. O filme, que em agosto concorreu aos principais prêmios do 44º Festival de Cinema de Gramado – perdeu absurdamente para "Barata Ribeiro, 716", crônica memorialística de Domingos de Oliveira –, acabou ficando com o Kikito de melhor atriz para Andreia Horta, além de melhor montagem e melhor filme pelo júri popular.
Surpreendente estreia no cinema do diretor Hugo Prata, até então somente produtor de videoclipes para extensa lista de artistas e bandas nacionais, o filme não deixa dúvidas quanto ao recorte, ou o foco pretendido por Prata a partir do roteiro de Nelson Motta, Patrícia Andrade e Luiz Bolognesi.
O que o público assiste é uma narrativa segmentada sobre a vida de Elis Regina a partir de seus 18 anos, quando ela sai da Porto Alegre natal e chega ao Rio em 31 de março de 1964, data emblemática que anos depois estaria no foco de um dos episódios mais controvertidos de sua trajetória como pessoa pública – a briga histórica com o desenhista Henfil, que a crucificou sem tréguas por cantar em evento militar durante o período mais repressivo e brutal da ditadura. O argumento do longa cobre os principais momentos da vida artística e pessoal de Elis. Hugo Prata afirmou, durante a coletiva/debate que se seguiu à projeção em Gramado, que teve absoluta liberdade e total apoio da família da cantora para montar sua história. Claro também ficou para ele que, embora curta (Elis morreu prematuramente em 1982, aos 36 anos), a vida dela, imensa, intensa, vibrante e polêmica, não poderia caber num longa metragem de 110 minutos, que tampouco pode ser chamado de biografia. Para o diretor, é de fato apenas um recorte de eleição pessoal. Mas este olhar de Prata sobre personagem tão mítico obteve ótimos resultados, fazendo de "Elis" um filme ao mesmo tempo rico e complexo.

Imagem ilustrativa da imagem Elis: o ícone, o filme, a celebração
Imagem ilustrativa da imagem Elis: o ícone, o filme, a celebração
Elis: em apenas duas semanas, o filme foi visto por mais de 32 mil espectadores


LACUNAS - Cobrado por conta da não inclusão de alguns nomes fundamentais na carreira de Elis (Tom Jobim e Milton Nascimento, presentes apenas indiretamente em diálogos), Prata reconheceu a lacuna. Mas reafirmou que o arco da dramaturgia pensada para a personagem na tela tinha necessariamente que sacrificar alguns fatos. A despeito deste, digamos, escorregão, e mesmo compactada em hora e cinquenta, a vida pública e privada da cantora ressurge bem reconstituída – presentes de corpo e alma o empenho e muitas vezes a obsessão de vencer suas atribulações como mulher, vale dizer, as relações afetivas tormentosas e a incessante busca de perfeição artística.
Não bastasse a mineira Andreia Horta ser fisicamente muito parecida com Elis, ela ainda recebeu notável preparação para o papel. Também presente à coletiva em Gramado, a atriz (tiete assumida da cantora) enfatizou não somente o preparo vocal na dublagem, mas toda uma atitude física na reencarnação de Elis – estão lá os tiques, o gestual, a gargalhada escrachada, até aquela aura –, reconhecida como um dínamo transfigurado quando pisava num palco. O resultado desta estafante entrega é uma interpretação de antologia, imediatamente reconhecida pelo público presente à première do filme no Festival de Gramado e agora nas salas onde o filme continua em exibição. Os atores Gustavo Machado e Caco Ciocler, respectivamente como Ronaldo Bôscoli e Cesar Camargo Mariano (primeiro e segundo marido da cantora) também embarcaram com tudo neste revival de Elis.
Não poderia ser diferente: os últimos tempos atormentados da vida da artista deixam o tom do filme mais sombrio, embora discreto em relação à sua entrega e dependência das drogas. E a sequência que imediatamente antecede a morte, momentos de busca e despedida, é um fecho cinematográfico da melhor intensidade e construção. "Elis" está colhendo merecido retorno, claro que avalizado muito mais por aqueles que acompanharam a carreira dela ao vivo. Mas é uma excelente oportunidade para a geração virtual saber o que havia e haverá sempre nas asas da Panair.