O melhor lugar do mundo para se estar é a casa da gente. Ou pelo menos deveria ser. Não importa o tamanho que ela tenha, como está decorada, se é própria ou alugada, se é bonita ou feia. O que importa mesmo, é que ela vai estar sempre lá, esperando você chegar, nos momentos mais impróprios, nas horinhas mais doídas, no dia em que o cansaço tomou conta e o estresse impera da cabeça aos pés. E quando o que se quer é apenas um banho, uma cama e um bom sono.
Não troco minha casa por nada neste mundo. Quando estou viajando, conto nos dedos os dias para retornar ao casulo, onde instalei algumas regrinhas básicas para mim e minha prole vivermos em harmonia. Mesmo porque, mães, pais e filhos se ‘‘pegam’’ esporadicamente e na maioria das vezes pelas causas mais banais. Em qualquer lugar do planeta é assim - democracia familiar é a palavra-chave.
Pelo menos faço uma força danada para as coisas caminharem neste sentido.
Gostar de verdade da própria casa não significa, necessariamente, ser caseira. Eu mesma, em função de tanta coisa, fico pouco em casa. Mas quando estou dentro dela, aproveito. Em cada canto está um pouco de mim. Gosto da minha casa porque ela é a minha cara, tem tudo a ver comigo. E eu acho que é assim que deve ser.
Já estive na casa de pessoas que mais parecem viver numa gaiola de ouro. Em nada constatei algum detalhe que retratasse a personalidade do morador. Já estive em mansões deslumbrantes que mais parecem um grande hall de hotel, ou um cenário de uma peça de teatro. Tudo tão formal, frio e sem vida. Pessoas que vivem num ambiente assim não são felizes.
As únicas pessoas que tenho certeza que, decididamente, não gostam da própria casa são os adolescentes, salvo algumas raríssimas exceções. Eles entram em casa para comer, telefonar e dormir. O que mais adoram é passear no shopping, estar na casa dos amigos, dançar nas festas e ficar trançando de casa em casa. É um entra e sai contínuo e quando podem escapam para a rua. Mas adolescente é igual em qualquer lugar do planeta. Depois de um tempo, sossega.
Na verdade, muita gente apenas dá a verdadeira importância ao lar quando passa uma temporada longe. Por mais à vontade que a gente se sinta na casa de outra pessoa, nunca será como na nossa casa. E por mais bem tratados que sejamos num hotel de luxo, sabemos que a própria casa é o nosso ponto de referência, nossa terra firme. Nada a substitui.
Minha amiga Carmen está montando seu próprio apartamento. E tudo está sendo feito aos poucos. Cada conquista ela comemora com sabor de vitória. E é assim mesmo que deve ser. Nosso lar - que seja um cubículo - deve ser moldado conforme as nossas aspirações e o nosso bolso. E mesmo que ele demore para sair do papel, quando acontecer, que esteja carregado de boas vibrações. Uma casa onde o alto-astral predomina faz com que a vontade de voltar a ela seja uma constante.
Também de nada adianta viver num ambiente carregado de vibrações negativas, com gente que vive polemizando tudo, doido por uma briga. Pode ser um apartamento duplex, com a vista mais linda da cidade, que ninguém sob aquele teto será feliz.
Tenho uma amiga que depois de tantos anos morando na cidade, virou zen e se mudou para o meio do mato. Foi parar numa chácara, cercada por tudo quanto é bicho. Trocou o computador por uma horta, da qual trata como se fosse o único meio de sobrevivência. O apartamento chique foi trocado por uma residência confortável, sem maiores luxos. Pendurou uma rede na varanda e se desfez de um monte de enfeites. Esta minha amiga poderia ter a casa que quisesse, nos moldes que sonhasse, mas optou pela simplicidade. Sua casa vive cheia de gente e é palco de todas as festas da família. E ela adora aquilo tudo.
Viver luxuosamente e sem o mínimo de informalidade afasta qualquer pessoa da própria casa. De nada adianta viver num ambiente cercado de obras de arte, quando a alma está sempre em frangalhos. E para que serve uma casa tão bonita, quando não se tem amigos para visitá-la?
Qual o melhor lugar para afogar as mágoas sem ninguém por perto para azucrinar? A própria casa. Onde despejar o açude de lágrimas, quando a coisa pegou feio com a cara-metade? A própria cama e o melhor travesseiro do mundo, que nenhum hotel cinco estrelas tem para substituir.
Naquele dia em que o urubu pousou no nosso ombro, só a casa da gente pode dar a paz tão desejada. A gente chora, desabafa, esperneia e até grita dentro de quatro paredes. Sem ter que dar qualquer satisfação a ninguém.