Ciclovê

Imagem ilustrativa da imagem AOS DOMINGOS PELLEGRINI
| Foto: Reprodução



Tenho amigo com mania de achar que tudo tem defeito; se não tiver, ele acha. E outro amigo tem mania de levar tudo na ironia. Então escute o papo dos dois comigo ao volante.
- Olha a ciclovia, espremida na ilha entre as pistas...
- Intervenção viária inserida no contexto urbanístico.
- E é uma ciclovia com postes e desníveis!
- Tecnologia urbana aberta para a aventura!
- E olha lá o ciclista, como sempre não respeitou sinal e vem na contramão...
- A diversidade é essencial para a democracia.
- Em Amsterdam, centenas de ciclistas esperam o sinal abrir.
- Está em licitação a importação de ciclistas holandeses.
- Lá tem ciclovias entre todos os bairros e cidades!
- Estamos importando também a geografia plana da Holanda.
- Em Paris, você aluga uma bicicleta com cartão, sem qualquer burocracia, e devolve no bicicletário do seu destino.
- Aqui você comprar uma bicicleta em sessenta prestações.
- Em Portugal, eu e minha mulher fomos de aldeia em aldeia, de bike e mochila, nossa mais barata e melhor viagem!
- Já disse um português que tudo vale a pena, se a alma não é pequena.
- E cadê nossa ciclovia? Começou ali mesmo e já acabou aqui! No final o começo está à vista!
- Um compacto exemplo de racionalização dos espaços urbanos com densidade de exposição dos valores culturais implícitos.
- Só falta dizer que é arte urbana!
- Você já disse. Não é ciclovia prioritariamente direcionada para os transporte, mas para o desenvolvimento civilizatório.
- Orra, parta-me um raio a cabeça se uma ciclovia sem bicicletas não deixa de ser ciclovia!
- Exatamente, é uma ciclovê, ciclovia para se ver.
- Mas para que eu preciso ver uma ciclovia?!
- Para inoculação de visão futurista favorável às transformações!
- Mas que transformações? Não vi nem a ciclovia ser usada, quanto mais se transformar seja no que for!
- Um monumento viário inserido no contexto urbano-cultural com intensa ação educativa e alto valor simbólico motivador de transformações direcionadas para o processo civilizatório.
Aí o jogo muda, o desfeitante ironizando:
- Eu não sabia que ciclovia podia ser tanta coisa, desculpe.
E o irônico sério:
- Não tem de que, nem bicicleta eu tenho.
Um desce do carro e fala da calçada:
- Bem, pelo jeito acho que nunca vamos nos ver na ciclovia, né?
- É, mas a ciclovê a gente vê todo dia.

Notícia da Chácara

Gorduchas ou suculentas?

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| Foto: Dalva Vidotte/ Divulgação



Chamadas de gorduchas ou, na versão politicamente correta, suculentas, estão na moda essas plantas de grossas folhas que parece Deus criou para posarem juntas em vasos e jardins. Dalva faz vasos delas como na foto, para presentear amigos, e convivemos também com nossos antigos vasos de gorduchas, opa, suculentas veteranas, algumas com galhos a se derramar, como querendo abraçar quem lhes dá a água da vida. Nas varandas, elas só conhecem respingos ou rajadas de chuva de vento, o regador é seu pai semanal.

Se viajamos, alguém tem de vir regar, sim, assim são vasos e jardins, né, é preciso cuidar. Mas é como com gente, não? Quem não cuida, acaba sozinho. Vó Tiana dizia que as samambaias davam uma murchadinha se ela viajava, e, quando voltava, elas dançavam com qualquer ventinho. Aqui tivemos a moda das avencas e samambaias, dos cactos, das orquídeas, das bromélias, paixões que não passaram, ao contrário; como no poema de Bandeira, foram ficando em nossa casa "cada vez mais cheia de flores, de frutos, de folhas"...