Se empreender é o caminho em um cenário de economia fragilizada, compartilhar então, é a palavra de ordem. Seguindo uma tendência mundial, muitos pequenos e médios empreendedores brasileiros estão ocupando espaços coletivamente em busca do desenvolvimento de seus negócios.

E esse modelo de comércio tem fixado endereço também em Londrina. O que antes era apenas uma antiga casa, está agora ganhando um caráter de ateliê e loja com produtos exclusivos criados por designers, arquitetos, artesãos e criativos locais.

"O mercado ainda causa muita insegurança nos pequenos empresários, mas a gente quis bancar isso, ou seja, buscar formas de profissionalizar nosso negócio e valorizar nosso produto", comenta Adriana Mattoso Rodrigues, proprietária da marca Papotage Papelaria Artesanal.

Adriana se juntou a outras cinco microempreendedoras individuais, que deram vida à A Casa, um espaço coletivo inaugurado na semana passada. Ao todo, são cinco marcas residentes e outras seis convidadas.

A Casa, espaço inaugurado na semana passada, possui cinco marcas residentes e outras seis convidadas
A Casa, espaço inaugurado na semana passada, possui cinco marcas residentes e outras seis convidadas | Foto: Saulo Ohara



Naiara Castro, da Santa Mania, conta que a ideia surgiu da necessidade de um grupo de amigas empreendedoras das áreas de arte e moda, de impulsionar suas marcas.

"Todas trabalhavam em casa, o que é um complicador para atender clientes e formalizar a produção. Então aos poucos fomos alimentando a vontade de crescer juntas, fazer a roda girar", diz.

Antes desse espaço, o grupo atuava nas redes sociais e organizava bazares para vender seus produtos. "Atuando em conjunto, todo mundo vai se ajudando nesse início. Além disso, os custos e riscos são mais baixos, pois tudo é dividido, inclusive as responsabilidades dentro do espaço", acrescenta a arquiteta e artista plástica, Mariana Galera.

O consultor do Sebrae em Londrina, Rubens Negrão observa que o modelo de negócios compartilhado tem tido inclusive, uma melhor aceitação do público consumidor.

"Antes, muitas pessoas tinham o pé atrás em relação por exemplo, à procedência, qualidade dos produtos, mas tudo isso sofreu uma transformação e comprar produtos exclusivos, de produtores locais passou a ser até um estilo de vida", comenta.

"Queremos ser multicultural, ou seja, aproveitar os espaços também para oficinas, exposições, leilões e workshops", diz o artista visual Hígor Mejïa da Casa Madá
"Queremos ser multicultural, ou seja, aproveitar os espaços também para oficinas, exposições, leilões e workshops", diz o artista visual Hígor Mejïa da Casa Madá | Foto: Gina Mardones



Negrão ressalta ainda que esse modelo compartilhado pode ser uma boa opção de testar o mercado e a aceitação do produto sem ter que investir muito, isto é, sem montar uma estrutura de alto custo com funcionários, aluguel, entre outros.

"Mesmo sendo um pequeno espaço, o importante é pensar na marca, atender o público-alvo e lembrar que se houver outro canal de venda, como a internet, esse espaço colaborativo pode ser uma espécie de showroom", aponta.

Sob este raciocínio, o consultor reforça a importância de se profissionalizar, pensando no modelo do negócio, como ele irá se viabilizar, qual é o diferencial, quem são os clientes, como atingi-los e qual será o preço dos produtos. "É preciso pensar na sustentabilidade do negócio. Vale lembrar que se posicionar pela exclusividade é uma proposta de valor", diz.

VISIBILIDADE
O artista visual Hígor Mejïa e a designer de moda Lubia Domingos Flor comemoram a visibilidade do ateliê coletivo Casa Madá, lançado há dois anos na cidade. A ideia deu tão certo que agora eles dão mais um passo em um novo espaço.

Em um imóvel maior, outros seis empreendedores locais poderão participar, totalizando 10 marcas abrigadas no coletivo. Segundo Hígor, além da estrutura, uma nova proposta será colocada em prática.

"Queremos ser multicultural, ou seja, aproveitar os espaços também para oficinas, exposições, leilões e workshops", diz Hígor, ao revelar que a ideia do ateliê surgiu do projeto Feira Madá, que no próximo mês chega na 13ª edição. "A gente se reunia para promover a feira até que uma hora decidimos fixar isso", conta.

Pela experiência, Hígor afirma que trabalhar coletivamente é viável do ponto do vista econômico, mas o maior ganho é a troca entre os criativos, o que reflete até em uma melhor execução do trabalho. "Esse movimento está em uma crescente, o que dá mais visibilidade para todos os envolvidos", completa.

Imagem ilustrativa da imagem ATELIÊS COLETIVOS - Dividir para multiplicar
| Foto: Anderson Coelho
"Somos um grupo de amigos que se uniram para um negócio, trocando experiências e recebendo quem vem nos visitar, seja para conhecer os produtos ou tomar um café", disse a arquiteta Gabriella Martins, idealizadora do Estudio Cosmo junto com Guilherme Andrade



Experiência de consumo diferenciado é um atrativo
Pensando na economia colaborativa, isto é, em ter uma divisão de custos, redução de riscos e compartilhamento de expertises, o professor em Governança e Sustentabilidade do Isae/FGV Escola de Negócios, Ricardo Pimentel, diz que essa prática não é nova, mas ressalta que vem crescendo nos últimos anos. "É uma forte tendência", pontua.

Ele avalia que o modelo colaborativo está mudando a forma das pessoas olharem para os negócios e com isso, a experiência do consumidor merece destaque, justamente pelo resgate daquilo que é mais significativo na vida das pessoas.

"Isso vai se revelando à medida que essa ideia do compartilhamento vai ganhando mais legitimidade na sociedade. Há cerca de uma década, passamos a valorizar mais essa busca da simplicidade, da satisfação e bem-estar. Esse modelo vai justamente a esse encontro, porque ele possibilita essa experiência de consumo diferenciada e ao empreendedor, de realizar coisas em que acredita", reflete.

Ainda de acordo com Pimentel, entre os mais jovens, o trabalhar coletivamente já está incorporado na forma de pensar. "Eles estão se juntando não simplesmente porque é legal, como se estivessem na onda de um movimento, mas porque essa é a forma que eles enxergam o mundo, e que de fato, está fazendo toda a diferença", conclui.

"Estamos vivendo uma era do novo consumo, com valorização daquilo que se produz aqui. E nós temos também uma parcela de responsabilidade em fazer a economia da cidade girar. Por exemplo, nossos fornecedores são todos de Londrina e região", afirma Guilherme Andrade, diretor criativo da Madre Cortes.

Andrade comenta ainda que o público ganha mais com um atendimento personalizado. "Como somos nós que produzimos, podemos desenvolver um produto de acordo com a necessidade do cliente. É a exclusividade", completa.

Andrade é idealizador do Estudio Cosmo, um ateliê coletivo, juntamente com a arquiteta Gabriella Martins, da Magnolia Arquitetura Floral. O espaço foi aberto em junho do ano passado, para elaboração, criação, produção e comércio de sete marcas locais.

"Ter um espaço físico formaliza o negócio, mas o Estudio tem a proposta de ser uma ‘loja viva’, com os ambientes em constante transformação e um convívio de um lar mesmo. Somos um grupo de amigos que se uniram para um negócio, trocando experiências e recebendo quem vem nos visitar, seja para conhecer os produtos ou bater um papo, tomar um café", conclui Gabriella. (M.O.)