"Esperava um debate mais democrático, mais aberto. Essa votação a toque de caixa tira o sentido democrático da coisa", diz o advogado Adílson Vieira de Araújo
"Esperava um debate mais democrático, mais aberto. Essa votação a toque de caixa tira o sentido democrático da coisa", diz o advogado Adílson Vieira de Araújo | Foto: Saulo Ohara



O projeto de reforma trabalhista pode entrar na pauta de votação na Câmara de Deputados na semana que vem. O parecer sobre o projeto de lei (PL), que modifica a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi lido na quarta-feira (12), pelo relator deputado Rogério Marinho (PSDB-RN). O relatório incluiu, além das propostas do governo, itens como a retirada da contribuição sindical obrigatória e medidas de salvaguarda para os empregados terceirizados. O texto revoga 18 pontos da CLT e a alteração de 100.

Um dos principais objetivos da reforma é que, em alguns casos, o que foi negociado entre trabalhadores e empresas possa se sobrepor à legislação trabalhista, o chamado "acordado sobre o legislado". No caso de jornada de trabalho, redução de salário, parcelamento de férias e o banco de horas, entre outros, poderá haver prevalência do que foi negociado entre sindicatos e empresas sobre a CLT.

"Inserir na CLT a possibilidade de negociação destes pontos é positivo, principalmente porque Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), direito a férias, e valor do salário-mínimo não serão mexidos. O caminho parece sensato estabelecer algumas coisas que se pode negociar e outras não", afirmou o advogado Adílson Vieira de Araújo, professor de direito do trabalho, processo trabalhista e processo civil, da UniFil.

Por outro lado, de acordo com o professor, essa possibilidade de negociação pode deixar o trabalhador em uma posição vulnerável. "Esse negociar pode levar a uma renúncia do trabalhador, pois numa situação de crise, o poder de negociação do empregado é mínima", afirmou.

Para Araújo, o ideal seria que a reforma sindical precedesse a trabalhista. "No nosso atual sistema sindical, a representação é um tanto distorcida. Não temos sindicatos com poder de negociação", comentou. Ele também considera ponto positivo da reforma a contribuição sindical opcional.

Na avaliação do jurista o tópico que define danos extrapatrimoniais é nocivo. O texto inclui na legislação trabalhista a previsão do dano extrapatrimonial, quando há ofensa contra o empregado ou contra a empresa. São consideradas passíveis de reparação quando, no caso da pessoa física, por exemplo, houver ofensa à honra, imagem, intimidade, liberdade de ação ou saúde.

No caso da pessoa jurídica, quando houver ofensa à imagem, marca, nome, segredo empresarial e sigilo da correspondência. Caberá ao juiz fixar a indenização a ser paga. Segundo o relator, o objeto é disciplinar os procedimentos para evitar "decisões díspares" da Justiça para situações parecidas. Ele fixa critérios objetivos que deverão ser seguidos pelos juízes para definir o valor da indenização. "Estabelecer critérios por lei é meio perigoso", avaliou Araújo.

O professor também alerta para o perigo que a proposta da jornada de trabalho intermitente pode trazer. A modalidade permitirá que o trabalhador seja pago somente pelas horas de serviço. Segundo a versão final do relatório, a empresa terá que avisar o trabalhador que precisará dos seus serviços com cinco dias de antecedência. O advogado considera medida uma forma de precarização do trabalho.

O presidente da comissão especial que analisa o projeto de lei, deputado Daniel Vilela (PMDB-GO), disse que se for votada a urgência, a primeira reunião deliberativa sobre o relatório deve ser na próxima terça-feira e o texto já poderia ser votado na comissão neste mesmo dia ou na quarta-feira (19). Sem a urgência, a comissão deve esperar o prazo de cinco sessões para se reunir, o que deve acontecer em, pelo menos, duas semanas.

AÇÕES TRABALHISTAS
A possibilidade do "acordado sobre o legislado" prevalecer, assim como a terceirização aprovada e sancionada pelo presidente Michel Temer, no começo do mês, na opinião do professor, poderão reduzir, em médio prazo, em até 30% o volume de ações trabalhistas. Só em Londrina, em 2016, tramitaram 11.722 processos, segundo mostrou reportagem da FOLHA nesta quinta-feira (13).

"A maioria das ações estão ligadas à jornada. Se você facilita a negociação de jornada de compensação e cumpre aquilo que se compactuou, a empresa não gera um passivo trabalhista e isso reduz o volume de reclamatórias", disse Araújo.

O professor enfatizou que é importante haver uma reforma na CLT, que foi criada em 1943, e adequá-la a realidade atual, mas demonstra preocupação com a agilidade do processo. "É preciso votar com tanta urgência uma proposta que mexe com a vida de tanta gente? Será que essa urgência toda não é porque o momento que empregado está fragilizado?", questionou.

Ele afirmou que "esperava um debate mais democrático, mais aberto. Essa votação a toque de caixa tira o sentido democrático da coisa". (Com Folhapress e Agência Câmara)