Deflação do preços dos alimentos, causada por supersafras, é um dos fatores que explica inflação menor que a esperada
Deflação do preços dos alimentos, causada por supersafras, é um dos fatores que explica inflação menor que a esperada | Foto: Marcos Zanutto/13-09-2017



A inflação pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de janeiro a setembro ficou em 1,78% e há poucos fatores que apontem que o indicador chegará ao piso da meta estabelecida pelo BC (Banco Central) para 2017. A meta deste ano é 4,5% ao ano, podendo variar até um e meio ponto porcentual para baixo ou para cima, ou seja, de 3% a 6%. Para representantes de entidades do setor produtivo e que representam trabalhadores, houve conservadorismo e demora nas reduções na taxa básica de juros, a Selic, o que indica que o órgão subestimou a baixa da demanda causada pela recessão e contribuiu para atrasar a recuperação econômica.

Para chegar ao piso de 3%, o IPCA do último trimestre precisa somar 1,22%, muito quando comparado aos 1,78% dos outros nove meses do ano. Fatores como a deflação do preços dos alimentos, causada por supersafras, a própria crise econômica e a instabilidade política ajudam a explicar o índice baixo, mas também precisam estar no radar do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC, que define a Selic, conforme analistas.

Um dos motivos para a inflação cair é a baixa demanda, algo considerável em um País com 13,1 milhões de desempregados, conforme dados sobre agosto do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). As famílias seguem com poder de compra reduzido e somente nos últimos meses o consumo deu leves sinais de recuperação.

Para o economista Roberto Zurcher, da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), o avanço da economia poderia ser maior hoje se o Copom tivesse antecipado a redução da Selic. "Não sei se somente o BC subestimou a crise, porque ninguém esperava um cenário tão grave", diz. "Não é que os juros poderiam ter caído mais, mas houve demora em começar a baixar as taxas, cujo reflexo no mercado aparece depois de nove meses", completa.

Zurcher faz a ressalva de que o País vem de dois anos de inflação alta, com 10,67% em 2015 e 6,28% em 2016, o que pode explicar o conservadorismo. "Não é a taxa de juros que vai corrigir os problemas, porque a ociosidade do setor produtivo continua alta, mas se tivesse sido antes, teríamos outra situação. Agora é preciso que o mercado reaja, porque não vamos vender mais carros somente porque houve redução na taxa, por exemplo."

O presidente do Sindicato dos Economistas de Londrina, Ronaldo Antunes, considera que o BC subestimou a recessão. "Ocorreram erros na hora de dosar a mão na política de juros, não só porque a inflação baixa indica menor atividade econômica, mas porque estamos pagando juros reais médios de 8% ao ano", diz. Ele se refere à diferença entre a média da Selic de janeiro a agosto, de 9,15%, e o IPCA de 1,78% do mesmo período. "Isso mostra que a velocidade da queda de juros não foi tão rápida quanto a da inflação e que continua a valer mais a pena deixar o dinheiro no mercado financeiro do que investir em produção, porque é difícil conseguir retorno de 8%."

Tanto se fica acima quanto abaixo do intervalo estipulado para a meta, o BC precisa explicar os motivos para o Ministério da Fazenda, o que Antunes diz que é uma formalidade. "Acredito que a justificativa dada será pelos cenários fiscal e político mais desafiadores do que o esperado", cita. Para o economista, os reflexos são ruins assim como quando o IPCA estoura o teto da meta. "Para cima, pode comprometer toda a política fiscal e o planejamento a longo prazo do governo e do mercado. Para baixo, há demora em recuperar investimentos."

Imagem ilustrativa da imagem Inflação baixa demais mostra que BC subestimou recessão



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Economista do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Fabiano Camargo da Silva diz que a inflação não é fator único para a política de juros, mas o BC sempre age de forma conservadora. "É uma questão histórica, a política de subir os juros não atende a lógica que o governo tem de barrar a inflação de demanda, porque muitas vezes, como nos anos anteriores, o motivo foram preços monitorados ou quebra de safra. Dessa vez foi a recessão e a supersafra", diz.

O fato de a economia estar praticamente parada, com recuperação em apenas alguns setores, também precisa ser levado em consideração, diz o economista do Dieese. "Pode ter baixado, mas o nível de juros no Brasil continua entre os mais altos do mundo, com o rendimento dos títulos públicos acima de 6%. O empresário pensa duas vezes antes de investir", afirma Silva.