Feito para não empreender
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segunda-feira, 22 de maio de 2017
Magaléa Mazziotti<br>Reportagem Local
Tão crônica quanto a pífia e, por vezes, negativa taxa de crescimento da economia brasileira é a elevada taxa de juros praticada no País. A correlação entre as duas questões responde internamente pela destruição das oportunidades de negócios e foi mensurada por uma pesquisa de Políticas de Acesso ao Crédito realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), que confirma várias obviedades como o fato dos juros altos afugentarem quatro em cada 10 empreendedores (38%) interessados em obter crédito para expandir suas atividades no Brasil.
Na esteira dessa constatação, o estudo mostra que seis em cada 10 varejistas (58%) e pouco mais de quatro em cada dez empresários (44%) de organizações de todos os portes, ouvidos nas 27 capitais brasileiras, afirmaram nunca terem recorrido às instituições financeiras para manter a operação. Foram entrevistadas 822 pessoas. "O uso de recursos próprios para investir limita a expansão, porque via de regra qualquer empreendimento dentro de um cenário favorável usa 30% de recursos próprios e 70% oriundos de terceiros. Não havendo isso, não se investe por se dispor de pouco e para ficar menos vulnerável a quebrar. E assim não se gera emprego e o ciclo vicioso da fraca atividade econômica permanece", alerta o superintendente da CNDL e doutor em Economia, Éverton Correia.
Custo
A pesquisa ainda mostra que em um recorte de curto prazo, os últimos 12 meses, apenas 9% dos comerciantes e empresários do ramo de serviços buscaram com sucesso recursos via terceiros. Outros 5% dos consultados não conseguiram, sendo que 3% desistiram pela alta burocratização do processo, problema citado por 44% dos participantes consultados pela pesquisa. Outros 2% tiveram o crédito negado.
"Em países com juros civilizados, o tomador de empréstimo paga praticamente o capital emprestado. Aqui parece que temos um sistema feito para não se empreender. Porque na hora de qualquer investimento, o custo do projeto é acrescido do elevado preço do dinheiro pago pelo crédito neste País. Somando esse risco a toda a série de incertezas políticas e econômica, trava qualquer decisão", lamenta o diretor de planejamento e gestão da Federação do Comércio do Paraná (Fecomércio-PR), Rodrigo Rosalem.
Prova disso que ao apoiar as reformas trabalhista e previdenciária, o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná, Edson Campagnolo, chama atenção para a urgência da reforma tributária. "Ela quem vai garantir a retomada do crescimento econômico e estimular os empresários a ampliar sua atividade", defende. "Com a reforma, a expectativa é que os juros cobrados no País sejam calculados de uma forma mais transparente, o que dará mais confiança ao tomador", esclarece Rosalem.
Nesse aspecto, ele observa que mesmo diante da redução da taxa de juros básica (Selic) e de uma inflação com projeção para ficar abaixo dos 4%, os juros de mercado seguem elevados. "Há escassas linhas de financiamento e com juros de três a quatro vezes superiores a Selic, em partes, por conta do risco do país", observa Rosalem.
Nesse sentido, outro dado que mostra o fraco fomento ao crédito é que os bancos públicos são identificados pelos empresários como o melhor tipo de instituição financeira para se buscar crédito, citado por 28% dos entrevistados. Os bancos privados foram mencionados por 17%. Outros 55% são indiferentes.
A preferência pelos bancos públicos é justificada, sobretudo, pela percepção de que eles praticam juros mais acessíveis (59%). "Essa preferência, no entanto, não é o ideal, primeiro porque está na atividade fim do banco público estimular o desenvolvimento econômico. E, segundo, porque em um ambiente favorável aos negócios as instituições financeiras privadas estariam interessadas em ampliar seus produtos financeiros disponibilizando linhas de crédito interessantes para os empresários e comerciantes", assegura o superintendente da CNDL.