Imagem ilustrativa da imagem Ex-presidentes da Sercomtel dizem que saída é privatizar



A salvação da Sercomtel depende de investimentos para garantir a viabilidade do serviço, mas os dois acionistas, Prefeitura de Londrina e Copel, não parecem ter capacidade de alocar recursos na estatal de telecomunicações. Com o processo de caducidade da concessão de telefonia fixa que pode inviabilizar a empresa, a saída mais simples é buscar privatizar, conforme afirmam quatro de seis ex-presidentes que comandaram a empresa neste milênio e foram ouvidos pela FOLHA.
Única telefônica pública e municipal do País, a Sercomtel é a menina dos olhos de boa parte dos londrinenses. No entanto, dificuldades financeiras fizeram com que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) abrisse um processo para averiguar a capacidade da concessionária de continuar a prestar serviços aos assinantes, com qualidade, até o fim da licença, em 2025.
A dívida consolidada da companhia em dezembro de 2016 era de R$ 238,9 milhões, conforme balanço, e é de R$ 293 milhões, dizem diretores. Já o faturamento no ano passado foi de R$ 251 milhões, o que não inviabiliza a prestação do serviço. No entanto, a gestão atual da empresa apontou que as dívidas de longo prazo poderiam chegar ao controverso valor de R$ 800 milhões, o que acendeu o sinal de perigo no órgão regulador federal do setor. Para o prefeito Marcelo Belinati (PP), somente um investimento de R$ 100 milhões por parte da Copel daria à estatal a garantia de sobrevivência.
Ex-presidente da Anatel (2011 a 2016) e da Sercomtel (2003 a abril de 2006), João Batista Rezende afirma que entende que a estatal é importante para a economia regional, mas perdeu capacidade de investimentos. "A Sercomtel vem perdendo receita ao longo do tempo e já chegou a ter 70% do mercado móvel local, mas hoje tem 2%."
Sem recursos próprios, Rezende considera difícil que uma prefeitura com problemas para fechar o orçamento invista na empresa. O outro acionista, a Copel, tem ações na Bolsa de Valores e depende de aval de um conselho de investidores para aplicar recursos e até para que algum diretor fale sobre o tema. Ele vê como legítima a preocupação sobre a perda da maior arrecadadora de ICMS da cidade, que gera mil empregos diretos e mais três mil indiretos, o que poderia ser negociado em contrato para manter parte das vantagens na cidade por alguns anos. "Londrina não superou esse debate ainda, de se vender ou não a empresa e de como lidar com esse processo de privatização."
Também ex-presidente, Christian Schneider (2013 a abril de 2016) lembra que todas as concessionárias enfrentam a dificuldade de ter de oferecer serviços em locais que nem sempre dão lucro. "As autorizatárias escolhem onde atuar e isso gerou distorções", diz. Ele afirma que, na Anatel, a percepção é que é um milagre a Sercomtel seguir no mercado. "Se fosse privada, hoje se colocaria a empresa em recuperação judicial, negociaria com credores para pagar em 20 anos, capitalizaria a empresa no mercado e em dois anos estaria com lucro. Mas empresa pública não pode nem pegar empréstimo porque o município não pode ser avalista."
Segundo Schneider, a Sercomtel tem uma condição muito melhor do que a Oi, na relação dívida consolidada e receita. A diferença é que a Oi é privada. "A solução ideal é ter alguém do setor que quisesse manter emprego em Londrina, mas a questão é que os acionistas perderam o prazo para isso e o protagonismo da decisão ficou com a Anatel."

OPORTUNIDADE PERDIDA
O ex-presidente da Sercomtel Gabriel Ribeiro de Campos (abril de 2006 a dezembro 2008) diz que Londrina perdeu a oportunidade de vender a empresa no início deste milênio, porque a decisão parecia acertada na ocasião. "Éramos a empresa com os melhores indicadores de qualidade do Brasil, pioneiros em lançamento de novas tecnologias e fomos a terceira cidade do País a disponibilizar a telefonia celular. Se o passado era belíssimo, era óbvio crer que o futuro também seria e foi durante os primeiros anos", conta.
No entanto, Campos considera que as dificuldades de uma gestão pública e de recursos bilionários de concorrentes privados toraram a empresa inviável. "A privatização ainda é possível e não deve em nenhuma hipótese ser descartada sem avaliar com muito critério os seus prós e contras", completa.
Funcionário de carreira por 35 anos da Sercomtel e aposentado em 2006, Mário Jorge de Oliveira Tavares teve uma passagem de quatro meses como presidente da companhia (janeiro a abril de 2009) e lembra que defendeu que a empresa fosse mantida como estatal. "Hoje não tenho mais ilusões nem dúvidas de que é difícil uma empresa pública, face a rigidez da lei das licitações, dentre outras, e mesmo por interesses políticos, fazer frente à competição agilidade e gigantismo das empresas privadas."

Vender celular e investir em banda larga
Vender a operação de telefonia celular e investir em banda larga. Essa seria um "hipótese de saída" para a Sercomtel na opinião de seu ex-presidente, o empresário londrinense Fernando Kireeff (fevereiro de 2009 a agosto de 2011). Ele faz questão de chamar de "hipótese" porque não conhece com profundidade a situação da operadora. "Tem de olhar os números. Mas por que não estudar essa possibilidade?"
Segundo o empresário, ainda há uma "oportunidade muito grande" para exploração de banda larga no mercado de telecom. Para ele, devido a limitações de banda e do território onde tem autorização para atuar, a Sercomtel deveria se desfazer da carteira de telefonia celular. Com o dinheiro obtido neste negócio e mais a venda de ativos, como o terreno que a empresa tem na Avenida Higienópolis, seria possível, na opinião de Kireeff, ampliar a oferta de banda larga.
O ex-presidente diz que ainda há muitas famílias sem banda larga e que o serviço tornou-se "necessidade básica". "As famílias precisam ter água, luz e internet. Aquela pessoa que acessa a internet só pelo celular aspira ter banda larga fixa com wifi para poder navegar pela rede de forma mais econômica e com mais qualidade", ressalta.
Atualmente, devido à crescente necessidade de acesso a conteúdos "pesados" como os vídeos, a banda larga vai se tornando cada vez mais importante. E, segundo Kireeff, muitos pequenos e médios provedores estão crescendo pelo País ofertando somente esse serviço. (N.B.)

Transformar a empresa em estatal dependente
Transformar a Sercomtel numa estatal dependente é a proposta que o ex-presidente Guilherme Casado (maio a dezembro de 2016). "Seria como a Embrapa, que pode receber recursos privados e públicos", compara. Além de prestar serviços de telecomunicações, a operadora poderia, na opinião dele, desenvolver softwares para a Prefeitura. "Poderia também abrigar uma escola de tecnologia onde estaria capacitando e qualificando mão de obra local", complementa.
Com recursos do tesouro municipal, a Sercomtel teria condições de quitar suas dívidas e investir. Questionado se não é utopia esperar que a Prefeitura tenha recursos para investir na estatal, ele afirma: "O Município tem orçamento substancial para aquisição e manutenção de sistemas. Então você está fazendo uma troca. Em vez de contratar um privado, a Prefeitura contrata a Sercomtel", exemplifica.
De acordo com Casado, a operadora precisa de R$ 100 milhões para modernizar sua rede e continuar competitiva. "Eu tenho dificuldade de enxergar a Sercomtel a longo prazo se ela não tiver o braço do Estado amparando-a." O ex-presidente se diz contrário à privatização. "Sou contra porque privatizar precariza a relação de trabalho e os serviços", justifica. (N.B.)

Medo é União deixar acionistas só com dívida
Entre os vários desfechos possíveis para o processo que a Sercomtel enfrenta na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), o que mais assusta os ex-presidentes da estatal londrinense é que a União assuma e leiloe a companhia, fique com o valor da compra e deixe as dívidas para os acionistas. Neste caso, sim, eles acreditam que o valor consolidado poderia chegar a R$ 800 milhões, divididos em 55% para a Prefeitura de Londrina e 45% para a Copel.
Por mais injusto que pareça, não se trata de um cenário com poucas chances de ocorrer, diz João Rezende, ex-presidente da companhia e da Anatel. "A intervenção tradicional é aquela em que a União assume todas as dívidas, inclusive dos acionistas, mas que acho difícil que vá se repetir perante a crise fiscal que governo federal tem", diz.
Se não assumir a dívida, a União poderia intervir nas operações, contratar uma empresa para administrar a concessão de telefonia fixa e afastar acionistas e executivos da empresa. "O problema é o Tesouro levar essa dívida e, por isso, Oi e Sercomtel terão de rever modelo", completa Rezende.
Para Christian Schneider, não bastará fazer pressão política sobre governo estadual e federal para salvar a Sercomtel, sem que se proponha ações concretas. "Tínhamos de juntar forças, chegar na Anatel e dizer que vamos colocar R$ 15 milhões na Sercomtel para suspender o processo de caducidade, até que a própria Anatel estude a melhor solução. Se for para vender, vamos vender."
A alternativa de vender a empresa à Copel, para estadualizar os serviços da Sercomtel ou mesmo receber investimentos parece distante. "A Copel nunca quis ser sócia da Sercomtel. Pessoalmente, fui portador de um oficio emitido pelo então prefeito Nedson Micheletti à Copel, para manifestar a concordância na venda de 5% do capital da Sercomtel para a Copel, que lhes daria o controle acionário, e não houve resposta até o dia 31 de dezembro de 2008", diz o gestor da empresa na época, Gabriel Ribeiro de Campos.