Os recentes sinais de crescimento acelerado da inflação - que nos últimos 12 meses já acumula alta de 6,59%, acima do teto da meta, segundo o IBGE - não tem afetado apenas o bolso dos brasileiros, como também preocupado economistas, que criticam a forma como o governo vem lidando com o aumento generalizado dos preços.

Para especialistas ouvidos pela BBC Brasil, o país vive, atualmente, o "pior dos mundos", com crescimento baixo e inflação em alta.

Eles avaliam que, para eliminar os dois problemas, o Brasil precisará de um "forte ajuste".

Para explicar por que a inflação voltou a ser o centro das atenções na agenda econômica brasileira, a BBC Brasil preparou uma lista de perguntas e respostas.

Por que a inflação voltou a preocupar?

A inflação é um velho inimigo da economia brasileira. Depois de anos de hiperinflação, após a adoção do Plano Real, em 1994, a taxa anual caiu de forma significativa.

Em junho daquele ano, quando a nova moeda foi lançada, a taxa mensal foi de 47,43%. No mês seguinte, caiu para 6,84%, posteriormente, em setembro, para 1,53%.

Hoje em dia, o Brasil trabalha com um sistema de metas de inflação anual. O centro da meta para 2013, estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional, é de 4,5% , mas o BC admite, ainda dentro da meta, uma variação de dois pontos percentuais para cima e para baixo.

Nos últimos 12 meses encerrados em março, segundo os dados divulgados pelo IBGE nesta quarta-feira, a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou alta de 6,59%, estourando o teto da meta.

Foi a primeira vez que isso ocorreu desde novembro de 2011, quando o aumento em igual período foi de 6,64%.

A alta do índice em março já era prevista por analistas, mas contribuiu para aumentar os temores de que a estratégia adotada pelo governo para combater a inflação esteja sendo ineficiente e as autoridades estejam evitando tomar medidas "mais duras" nesse sentido, como uma eventual subida dos juros.

O aumento também torna mais distante o objetivo de manter a inflação em 2013 mais próxima do centro da meta.

Em 2010, a taxa foi de 6,5% e, no ano passado, de 5,84%.

O BC prevê, no entanto, segundo seu último relatório trimestral, que a inflação deva encerrar este ano em 5,7%.

"A alta da inflação é extremamente prejudicial ao país. O aumento dos preços mina o poder de compra da população, especialmente das classes mais baixas que, com menos dinheiro no bolso, corre mais riscos de ficar endividada e inadimplente", afirma à BBC Brasil Samy Dana, professor de economia da FGV-SP.

"Além disso, cria um cenário de incertezas para o investidor, que, desconfiado dos rumos da economia do país, tende a suspender ou adiar investimentos, prejudicando o crescimento", acrescenta.

O que explica a alta da inflação?


Preço do tomate subiu 151,39% nos últimos 12 meses

Inúmeros fatores explicam a escalada inflacionária no Brasil. De maneira geral, a origem está no desequilíbrio entre a oferta e a demanda.

Segundo o governo, foi o que aconteceu com os alimentos, já considerados os principais vilões para o aumento da inflação.

O tomate, por exemplo, dobrou de preço nos últimos doze meses, com alta de 122,13%. No mesmo período, a farinha de mandioca registrou alta de 151,39%, segundo dados do IBGE.

Existe um consenso de que parte da culpa é das condições climáticas. Nos Estados Unidos, a seca elevou o preços dos grãos, ao passo que, no Brasil, a seca no Nordeste e as chuvas na Região Sul também afetaram o valor cobrado pelos alimentos no mercado doméstico.

Porém, para especialistas, o aumento dos preços também é explicado pelos rumos mais recentes da economia brasileira, bem como problemas estruturais do passado.

"Nos últimos anos, o mercado de trabalho passou por uma melhora importante, e a taxa de desemprego vem caindo. Paralelamente, devido ao déficit de mão de obra, os salários subiram, e esse aumento de renda também contribuiu para acelerar o consumo", explica a economista Alessandra Ribeiro, da consultoria Tendências, especialista em inflação.

"O problema é que, ao passo que a demanda cresceu, a produção vem caindo e o nível de investimento (para ampliar a capacidade produtiva), também. Com mais pessoas consumindo e menos produtos disponíveis, o desequilíbrio é inevitável e se reflete nos preços", acrescenta.

"A pressão por maiores salários também elevou, por sua vez, o repasse de custos", conclui.

Por fim, o Banco Central diminuiu os juros, incentivando a expansão do crédito e, consequentemente, o consumo das famílias.

Como o mercado tem reagido?

Para especialistas, os rumos recentes da economia brasileira vêm criando um cenário de incertezas que afasta o investidor.

"Há um aumento do nível de desconfiança em relação ao Brasil, tanto do ponto de vista macroeconômico quanto microeconômico. De um lado, existe uma sensação de que o BC tem perdido autonomia sobre a condução da política monetária. De outro, há um crescente enfrentamento por parte do governo com o setor privado", afirma Ribeiro.

"Prova disso é que o nível de investimentos no Brasil tem caído na comparação com outros países emergentes. O problema é que, sem novos aportes financeiros, nossa produção fica comprometida, o que trava o crescimento e gera desemprego", acrescenta ela.

O que o governo tem feito?


Governo tem adotado política de desonerações tributárias para conter inflação

A principal aposta do governo para a redução dos preços tem ocorrido por meio de desonerações tributárias.

Recentemente, por exemplo, o governo prorrogou a alíquota reduzida do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre carros até dezembro deste ano.

Além disso, desonerou a cesta básica, a energia elétrica e a folha de pagamento de inúmeros setores, entre outras medidas.

A mais recente foi a decisão de zerar o PIS/Cofins de smartphones de até R$ 1,5 mil fabricados no Brasil.

Por essa lógica, o governo espera que as empresas repassem ao consumidor a redução do custo com os tributos.

A medida, entretanto, é criticada por especialistas.

Para Dana, da FGV-SP, a política é "arbitrária" ao privilegiar determinados setores da economia.

Já para Ribeiro, da Tendências, o efeito das desonerações não passa de um "alívio temporário", porque "o preço, ainda que caia a curto prazo, se desenvolve de acordo com as condições de mercado".

Além de fazer reduções de impostos, a equipe econômica já negociou com os governos estaduais o adiamento dos reajustes em transportes coletivos. Já o Banco Central não descarta um possível aumento dos juros.


Quais medidas deveriam ser tomadas?

Para Dana, da FGV-SP, o governo deveria estimular a concorrência, o que puxaria os preços para baixo.

"As margens de lucro praticadas no Brasil ainda são bem maiores do que as de outros países, como os Estados Unidos, onde o próprio mercado elimina os ineficientes", afirma.

Segundo Ribeiro, da Tendências, já passou da hora de o Banco Central subir a taxa de juros.

"Na minha avaliação, o BC cometeu um erro grave em 2011, quando decidiu reduzir os juros na marra apesar de os primeiros sinais do aumento da inflação. Agora, precisa recuperar o tempo perdido."

Há um consenso, entretanto, de que o governo deveria corrigir os gargalos estruturais da economia brasileira, o chamado "Custo Brasil", o que contribuiria para aliviar a pressão sobre os preços.